___________“Vamos Passear na Avenida?”



Os tempos eram outros... Os costumes também: uma estratégia pra se arranjar namorado, era ir ao footing  ou fazer avenida, como se dizia, e acontecia no fim de semana, sendo o sábado o dia mais movimentado. Depois da missa da noite, os jovens se concentravam na calçada em frente à igreja. Os rapazes formavam uma espécie de muralha humana, enquanto as moças desfilavam de uma extremidade à outra da calçada. De braços dados, em agrupamentos de cinco ou mais — quanto maior o grupo, mais poderoso e atraente aos olhares masculinos, pois aumentava o poder de escolha — elas iam e vinham para paquerar e  serem paqueradas. Aquele era o movimento do fazer avenida.

Ali, muitos namoros começavam. Os rapazes observavam atentamente as belas figuras que se exibiam diante deles. E valia tudo: a roupa bem assentada no corpo, os cabelos bem penteados, a boca pintada no melhor batom, os saltos altíssimos e as cinturas finas davam o toque da elegância. O páreo era duro, as donzelas não economizavam no charme e na vontade de ser a mais bonita. Afinal quem não queria fisgar o cavalheiro de seu coração? Casar cedo era moda, e o tempo voava, quando se via, olha os vinte anos! Depois de ficar coroa, despertar o interesse de alguém era tarefa trabalhosa. A preferência despencava e o medo de ficar pra titia era um fantasma.

As moças só namoravam depois dos quinze. Até chegar a hora de fazer avenida, iam ensaiando, no papel de auxiliares. Era comum as irmãs mais novas ficarem na ponta das alas femininas. Quando um dos rapazes se agradava de alguma moça normalmente chamava a ajudante de Cupido e mandava um recado do tipo: Fala com a de azul aí pra mim. O recado era transmitido entre segredos, risinhos e mistérios. Caso a resposta fosse favorável ao pretendente, o casal saía do circuito e se sentava num banco da praça para uma primeira conversa. Se o papo fosse frutífero, o próximo passo era levar em casa. No portão da casa da moça, eles se despediam, já deixando um encontro marcado. Pronto. Estava entabulada a promessa de sair namoro, e, muito provavelmente, noivado e casamento.

O tempo do footing durava pouco, mais ou menos das 19 às 20 horas, quando tocava Shadows no alto falante do Cine em frente, anunciando o começo da sessão. Alguns entravam para ver o filme, outros se dispersavam para os namoros, ou simplesmente iam pra casa. Rapidamente a praça se esvaziava e não restava qualquer movimento, até o próximo fim de semana, quando a avenida se tornava novamente palco de encontros e promessas de sonhos casadoiros realizados.

À parte, vale ressaltar o clima dos acontecimentos: tudo sempre muito saudável, em tom de extremo respeito. Contrária à ideia da exibição das mulheres aos homens, o que persistia era a postura de reserva. Nada de comportamentos afoitos: só tempo de flerte, de conquista, de conversa e muito conhecimento entre os casais. O levar em casa, por exemplo, era um gesto de  gentileza, e a moça confiava que jamais seria surpreendida por uma palavra grosseira ou um gesto deselegante. Era sim, um tempo de damas e cavalheiros, em que o namoro era uma aventura cercada de boas expectativas, e a um simples flerte o coração ia a mil.  Um tempo em que o Vamo passiá na avenida não representava nenhum perigo, e o  Sô Lobo, menos ainda.