"A DROGA" E A CHUVA

Confesso que bateu saudades. Lembrei-me da minha infância e passou um filme em minha cabeça hoje. Não tinha contas para me preocupar e nem a pagar. Os estudos eram o grande vilão do tempo. Eu me encontrava com ele na escola e antes de dormir, ficávamos namorando. Eu, o caderno e os livros.

Antes era momento de ser criança... jogar futebol na rua com duas sandálias em cada lado, marcando "as traves", o chão era batido na rua cheia de poeira e buracos...era divertido, principalmente quando chutávamos a bola no portão de ferro do vizinho e fazia aquele estrondo, rs.

Quando a bola caia dentro do quintal dele, era 'batata". Ficávamos triste, pois ele tinha um facão e cortava nossa bola "artilheiro ou atleta". Tudo era tão difícil e acabava o futebol. Bom, tínhamos a brincadeira de bandeirinha, pique, queimado (que se chama "carimbo' aqui no Ceará) e tantas outras coisas que nos faziam bem. Não tinha celular, conversa pelo zap ou facebook.

O contato era direto e a hora de brincar, todos já sabíamos. Brigávamos, saíamos no tapa por bobeiras, mas depois tudo era resolvido. Eram as mães que ficavam mal entre si, rsss. Dependíamos dos colegas para completar o futebol e outras brincadeiras. Não tinha maldade.

E quando chovia? Xiiiiiii, era uma loucura, mas nos sujávamos de lama e ainda sujávamos os outros. Pobres mamães que lavavam nossas roupas em tanques de pedra. Como fomos ingratos sem malícia. Inocência! A festa na rua se dava quando os malditos políticos prometiam asfaltar a mesma. A "droga" vinha e todos iam vê-la. Era ela passar na rua e vir chuva. A desculpa para não asfaltar era sempre a mesma: a chuva!

As pedras apareciam, buracos e nosso futebol ficava ainda mais animado num chão mais plano. Inocência que acreditava nesse asfalto. Passavam 20 dias, 30 dias e lá se vinha a droga da "droga" e nossos ânimos aumentavam novamente. O céu se escurecia de nuvens carregadas e cinzentas. Era sinal de muita chuva e mais lama.

Os nossos pais tinham que ir e voltar do trabalho com sacolas amarradas nos pés para não sujarem o calçado de trabalhar no dia seguinte. Tudo era tão difícil, mas tão prazeroso. Sei que cresci vendo nossas bolas sendo furadas ou rasgadas por esse vizinho. Era a vingança dele pelas boladas no portão.

O que sei é que, cresci, terminei o ensino médio, perdi minha mamãe, entrei na faculdade e a rua não foi asfaltada. Prefeitos cretinos! Políticos mentirosos! Arrecadar IPTU, pedir votos e mentir para quem não tinha consciência política! O que sei é que quando ela vinha, "a droga", já sabíamos que ia chover e acabar com nossa alegria na rua. Essa "droga" era a tão temida draga da prefeitura.

Hoje com asfalto na rua em que eu morava já não se brinca mais dessas brincadeiras de crianças. Xô "droga"! Xô, draga!

Evandro Ferreira Rodrigues

Professor, Escritor, Poeta, Cronista e Acadêmico-ALTO

Evandro Ferreira Rodrigues
Enviado por Evandro Ferreira Rodrigues em 20/03/2018
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