REMINISCÊNCIAS AFETIVAS

Como já narrei muitas e muitas vezes, mas não custa repetir, aos vinte anos, cursando o segundo ano da Faculdade de Direito da URGS, resolvi que tinha de ir morar um tempo em Paris e conhecer a Europa. Era o ano de 1967. Sonho acalentado há algum tempo e que se fortalecia com o correr dos dias. Cogitava, inclusive, da hipótese de por lá permanecer e fazer a vida. Casualmente, cerca de dois meses antes de concretizar a viagem, comecei a envolver-me com uma menina muito bonitinha e inteligente para quem até compus poesias. O namoro aconteceu, ainda que breve, mas já freqüentava sua casa, de gente muito amiga, aliás. Quando peguei o ônibus para São Paulo/Santos, de manhã cedo, recém voltara da festa de casamento de seu irmão mais velho. Posso dizer, usando a classificação clássica, que estava apaixonado. Durante a viagem de dez dias no navio Enrico C, anotava constantemente pensamentos e sentimentos num diário em que transformei um grosso caderno escolar. E fui assim registrando emoções, dentre outras coisas interessantes. Creio que dela cheguei a receber cartas em Lisboa ou Madri e talvez uma já em Paris, sempre nas agências da VARIG, que era endereço postal dos viajantes. Mas a troca de mensagens parou e uns dois meses após minha partida, minha Mãe, numa de suas constantes missivas, contou-me que minha Musa havia reatado com antigo namorado e, mais, que havia sofrido acidente de carro com pequenas conseqüências. Fiquei bastante impactado, mas engoli em seco. Não era para ser. O que hoje mais lamento é que abandonei o alentado diário sobre um armário alto, em Roma, já numa das escalas de regresso ao país. Coisa de guri.