MEUS TRABALHOS TEMPORÁRIOS

Na semana que antecede a Páscoa só não trabalha quem não quer, pois é quando surge uma grande oferta de trabalhos temporários, e mesmo de serviços avulsos, ainda que seja apenas aparar a grama do vizinho. Mas o que mais ocorre é que há, como no Natal, aquela demanda urgente por mão de obra que atenda a freguesia nas lojas. Todo mundo quer comprar chocolate. Quem está desempregado vê aí uma oportunidade de levantar-se, ganhar um bom dinheiro para não passar mal no feriado tão importante. E pelo seu esforço pode sonhar em ser efetivado no emprego, continuar no serviço, ter novamente sua carteira assinada.

Mas é desgastante trabalhar numa semana dessas. O trabalhador temporário trabalha muito mais do que aquele que está estabelecido, pois quer mostrar que é bom, que é capaz. Levanta cedo, permanece ativo o dia inteiro, sai tarde do trabalho. Mas sua consciência lhe diz que fez o máximo que pôde.

Já fiz muitos serviços temporários, até de Papai Noel já trabalhei. Não acredito em Papai Noel, mas vesti aquela indumentária acreditando em mim mesmo. Claro que não poderia esperar ser efetivado para depois do Natal. Aquela fantasia era sufocante demais.

Tratando-se da Páscoa, meus trabalhos temporários nunca foram atrás de balcão, embrulhando ovos de chocolate e as demais iguarias que se expõem na mesa no domingo da Ressurreição.

No domingo de Páscoa todos querem comer carne, para compensar a falta de carne na sexta-feira santa, quando só se come peixe. O povo deveria comer peixe o ano inteiro. Mais peixe e menos chocolate. Mas só querem peixe na semana santa.

Daí que surge tanto trabalho na semana da Páscoa. As feiras de peixe agitam o comércio por todas as cidades. Em cidades do litoral, são os peixes que vêm do mar; nas cidades do interior, são os peixes criados em açudes. Mas é tudo peixe, e todos agradam.

Todo ano, meu trabalho temporário é em feira de peixe. Quatro dias apenas, dois deles dedicados à pura preparação do real comércio que será na quarta e quinta-feira. Como disse, é desgastante. Mas quando tudo acaba, é um grande alívio. Não sou pescador, nem criador de peixes. O que faço é o trabalho final, que é colocar o peixe na mão do freguês. E ele vai feliz por cumprir sua obrigação de comer peixe uma vez por ano.

E eu vou descansar, fazer qualquer coisa que me agrade no sábado e no domingo. Comer algum chocolate pode ser bom para aliviar-me do estresse. Mas com certeza não vou pescar.

Egon Werner
Enviado por Egon Werner em 30/03/2018
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