VISITA AO DENTISTA
Entro naquela sala branca e fria. Há nela três cadeiras odontológicas separadas por divisórias de PVC. Sento-me na do meio, bastante incomodada. Algumas lâmpadas da sala oscilam. Meu medo é visível e quase materializado. A dentista, percebendo a minha inquietação, tenta me acalmar. “Vai ser rápido, Aline. Já já acaba.” A minha única reação é esboçar um sorriso amarelo.
Hora da anestesia. Fecho os olhos e tento imaginar um jardim florido. A lâmpada que fica acima da cadeira da esquerda queima. Esperamos alguns minutos para sentir a dormência. A broca avança com aquele barulhinho infernal. Dor, dor, dor… A dentista aplica outra anestesia e, de novo, imagino o jardim florido. A broca aproxima-se novamente, dessa vez, impiedosa.
Fecho os olhos e ponho as minhas duas mãos sobre o peito, entrelaçando os dedos e os aperto com tanta força que sinto o corpo inteiro rijo a tremer. A lâmpada acima da cadeira direita também oscila e queima.
Meus pensamentos estão concentrados, mentalizando o fim imediato da sessão tortuosa. “Não está doendo, não está doendo.” Minha mente grita! Os dedos ainda entrelaçados e suados. O ar condicionado da sala para de funcionar. E a broca continua o seu trabalho. “Está acabando, Aline. Falta pouco.” Nesta hora entra na sala uma das auxiliares da clínica relatando que o computador e o ar condicionado da recepção também pararam de funcionar. A lâmpada acima da cadeira que estou queima por fim. Ao mesmo tempo, a luz do refletor que ilumina a minha boca aberta intensifica-se inexplicavelmente.
A dentista continua calmamente o seu lavor. Agora só falta fechar o dente para terminar a restauração. Ela fala com uma voz doce que os procedimentos dolorosos chegaram ao fim. Só faltam os acabamentos.
Abro os olhos. Uma lágrima escorre. Solto os dedos e consigo perceber o sangue voltando a fluir normalmente. Acabou.
Despeço-me agradecendo e levando uma pulga atrás da orelha; Coincidência ou não, hoje me senti meio Carrie, a estranha.