A lagartixa

Encarcerou sua vida num quarto e sala perdido nos subúrbios da cidade.

Vizinho da miséria não poderia se considerar pobre sem ser hipócrita .....uma janela o premiava com a visão da vida ao seu redor, não era feia nem bonita era a vida, a sua vida.

Fazia refeições frugais e simples como lhe permitia a miserável aposentadoria, lia muito, pois lhe sobrara na vida livros e tempo, a noite ligava uma velha televisão assistia noticiários e se preparava para dormir.

Escovados os poucos dentes, lavado o rosto e a barba rala, não vestia encarnava, um velho surrado e inacreditável pijama listrado, sobrevivente de outra época.

Deitava-se, apagava o pequeno abajur de metal, o quarto se mantinha numa semi escuridão rompida pela luz da iluminação da rua filtrada pela veneziana.

Uma ansiedade estranha o acometia olhando o teto branco do quarto, súbito ela aparecia em pequenas e nervosas corridas como pregada ao teto ...uma pequena lagartixa que o visitava diariamente.

Sabia de cor os itinerários da visitante no pequeno retângulo do teto de seu quarto, era uma visita aguardada com curiosidade e carinho uma das poucas que recebia a única, até então diária.

Até que um dia não comparecera ao encontro marcado com seus velhos olhos e sua nova saudade a pequena lagartixa, desde então não viria mais povoar seu quarto, mesmo assim mantinha os olhos pregados no teto a sua espera até as pálpebras os fecharem de cansaço e os sonhos o levarem para dentro de si quem sabe, encontrar sua lagartixa.

Inverno de 2018

Por trás dos meus olhos

Carlos Said

Carlos Said
Enviado por Carlos Said em 02/08/2018
Reeditado em 19/08/2018
Código do texto: T6407389
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2018. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.