Imagem: Girl at a Window - Artist: Rembrandt Harmensz van Rijn

Tem lugares que mesmo fora do nosso corpo, ficam na memória da gente como tatuagem debaixo da roupa. Achei de novo, um agora. Foi bem ali onde  eu te encontrei que parei para olhar e lembrar de tudo de novo. Nas lembranças risos e lágrimas, juntos e separados. Foram dias assim de tudo um pouco.
Aqui de pé, ninguém sequer suspeita porque olho tanto aquele lugar. Memórias vem e vão. Não consigo esconder no rosto a reação das imagens que saltam das gavetas do inconsciente. São como crianças tateando uma folha de caderno rodeada de lápis de cor espalhados no chão.
Se quer me julgar, por favor, peço a você que antes de prosseguir, se coloque no meu lugar.
Vista-se de mim. Viva um pouco do que foi a minha vida até aqui. Veja tudo o que eu vi, o que fiz e o que deixei de fazer. Sinta minhas quedas acidentais e causadas, veja como me levantei. Ande pelos meus passos, engula minhas palavras e veja quantas eu botei pra fora, e como as botei.
Use minhas roupas, questione minhas idéias como eu bem faço. Olhe como eu olhei até aqui para a tristeza, para a alegria, para as dúvidas e logicamente para as certezas. Veja e sinta minhas expressões de descrença da vida e de certeza dela também, dos desgostos e gostos que bateram e acariciaram meu peito.
Sinta como foram minha noites até aqui.
Sinta as minhas insônias, os silêncios, os gritos abafados, as juras sussurradas, as conversas necessárias e tolas, os risos, os riscos...
Vista-se de mim. Depois de me viver, mas viver de verdade, seriamente falando, me julgue, fique a vontade.
Se não for assim, passa por mim e não diz nada. Me deixa olhar para aquele lugar e lembrar tudo o que quero e o que não quero também. 
Vista-se de mim se quiser me julgar. Te empresto-me...
 
Interação
Por: Lena Lustosa

Belíssima crônica. Era tudo que queria dizer hoje:
Vista-se de mim e me julgue. Te empresto meu corpo, minha mente e meus pensamentos. Experimente cada beijo que não dei, sinta os afagos que ganhei, sonhe os sonhos que sonhei, sofra as decepções que sofri. Vá! Pegue meu corpo, eu te empresto, limpe o suor do rosto do prazer que restou, enxugue as lágrimas que não secaram. Entre no labirinto de minha alma e sinta com a pele que me cobre as sensações que vivi; no olhar, carrego as marcas do tempo. Quando tiveres se saciado de mim e do meu viver, me julgue por insistir em olhar além do horizonte.

(Nem sei como falo, como faço para agradecer...Lena me lendo, deixa-me pleno...)