Bendita Peneira

Eu acordei sem saber o que iria escrever hoje. Eu não sei, talvez todas as coisas que eu já tenha pensado até agora, eu já tenha escrito em algum lugar. Nos meus cadernos na escola, na parede do meu quarto, em guardanapos depois do almoço, na agenda do telefone enquanto falava e quando eu parecia estar ali, mas não estava.

Quando penso no que dizer, penso logo no que não sei e digo. Não diria se não fosse obstinado em rabiscar. Acaba sendo muito mais intuição e pressentimento do que conhecimento. Mas isso não importa muito. O resultado é um balde de água quente!

Quando paro pra deixar que qualquer pensamento me invada e me impulsione a escrever alguma coisa, preparo um balde vazio e uma peneira e vou peneirando.

E o que passar pela sua fina malha eu conto pra meia dúzia de pessoas e o que não passar eu guardo numa pasta de confinados e inacabados. Quem sabe um dia de tanto uso e luta, a malha de tão estreita não afrouxa?

O que eu me propus a revelar eu nem sempre consegui. Nem eram segredos, nem negócios da China, nem enigmas e mistérios, era mesmo a malha da peneira.

Tem hora que é melhor nem ter peneira, só balde, mas o cuidado e esmero com a palavra é uma relação louca e desmedida. Ou se ama ou se torna indiferente. Eu fico com a primeira. Fico tanto que nunca sequer brigamos, nos desentendemos, nem houve confusão. Minto, confusão sempre tem, porque ela diz muita coisa que na hora eu não entendo e logo depois vem a explicação. Um pouco de paciência e a gente vai vivendo e se entendendo...

Mas quem nunca deixou de dizer alguma coisa por causa da bendita da peneira, que atire... A primeira palavra!

Tiago Alves
Enviado por Tiago Alves em 28/10/2005
Código do texto: T64673