Querer é só vontade

Ela quer um exemplo de vida. Ela quer uma fórmula mágica para tudo. Ela quer um caminho certinho e previsível. Ana quer tudo isso e mais. Ana não tem nada disso.

Talvez hoje, Ana entenda porque é tão difícil para ela ser pontual ou ter compromisso com a vida. Talvez ela possa recorrer, mais uma vez, à família para depositar a culpa. Talvez, atribuir a um passado distante a culpa por não conseguir hoje pôr em prática sua vida como ela planeja seja uma forma mais confortável de encarar seus próprios problemas.

Muitas vezes, não seguir o que havia sido planejado parece já a derrota. A derrota que vem antes mesmo de tentar. Muitas vezes, as vontades se mortificam e o que fica apenas é o desejo de nada ser ou nada sentir. As vezes ela se sente bem em sentir-se solitária, as vezes não. As vezes ela culpa o mundo, outras vezes quer ganhar o mundo. As vezes pensa ter tudo sobre seu controle, a ponto de se achar perto da perfeição, tentando controlar a vida dos outros também. Em outras, é como se não fosse nem dona da própria razão. Duvida de tudo: de si, da sua capacidade, da própria vontade...

Duvida, mas em outros momentos tem certeza. Aliás, uma das coisas que mais tem certeza é que ela quer. E pronto! Mas querer não é ter. Querer não é conquistar. Querer é só expressar. Na verdade, nos momentos de mais desequilíbrio do comportamento “normal” de um indivíduo (normal no sentido de comum àquela pessoa) é quando as vontades mais tomam impulsão. Nos momentos de euforia, de vaidade, de medo, de angústia... Nesses momentos o corpo clama por algo externo para resolver seu drama. E a ideia da fórmula pronta alivia a agoniosa sensação: talvez um corte de cabelo diferente, para te deixar mais ousada para enfrentar o mundo; talvez aquela bota de salto, que vai mostrar para os outros e para você mesma como você é decidida; talvez mais uma palestra sobre motivação, para te mostrar que na verdade você não estava encarando a questão pelo melhor ângulo; talvez, talvez... E nessa brincadeira de procurar a solução mágica, Ana nunca deixa de ser expectadora da própria vida.