O RADINHO CIGARRA (BVIW)

Amo cigarras! Tenho paixão por seu canto anunciando dias de calor. É no verão que elas saem debaixo da terra para o acasalamento, por isso os machos cantam alto. Recordo-me, papai sabia do quanto gostava das cigarras, e das vezes que tentei pegar uma, e assim poder ouvir de perto o som que produziam sempre ao amanhecer ou ao entardecer. Certa manhã quando me preparava para sair com mamãe e minha irmã caçula, papai conseguiu pegar uma cigarra, e a deu para mim. Saí feliz pela rua com a pobre entre os dedos. Ao contrário do imaginado, ela não cantou alto. Reproduziu um pequeno som, talvez pelo desconforto de se sentir aprisionada entre o meu polegar e o indicador. E lá fui eu entrar no ônibus com a cigarra, que na minha mente ingênua, era um radinho de pilhas. A alegria durou poucas paradas de ônibus. Num descuido, a cigarra escapuliu dos meus dedos indo se emaranhar nos cabelos de uma senhora no banco à frente ao que eu estava com minha irmãzinha. A mulher fez um escândalo, e eu bem de bico calado! Fiz de conta que nem era comigo. E me senti desconfortável e assustada igual a cigarrinha entre meus dedos. Nunca mais quis segurar outra. Depois desse episódio me contentava ouvir seu canto apaixonado no alto de alguma planta. Esse som do passado, da manhã dourada da minha pouca idade, nunca me esquecerei.

Tema BVIW: "Som do Passado"