Voz que não cala com mordaça

As portas dos museus foram fechadas.

Milhares de artistas estão na calçada, colocando suas obras no lugar em frente as portas que fecharam, e pintando o museu diferente.

O cantor fala de música para o bêbado na rua, que o acompanha na cantoria.

O poeta declama e provoca o moço engravatado com a bíblia debaixo do braço.

O pintor imprime nas telas o olhar inconformado do jornalheiro.

O dançarino protesta usando seu corpo.

E a dor do mundo é compartilhada.

Fecharam mais um teatro no centro da cidade. A concha acústica servirá para o discurso inflamado dos donos da vez.

Os palhaços saem no meio do trânsito e gesticulam para arrancar um sorriso dos motoristas. Os palhaços de risos forçados, resistem. O riso se esconde no meio do que sentem fome.

O escultor para em praça pública e destrói suas obras usando um martelo. Junta os cacos e cola cada um sem critério. Inconformado, tentando explicar o mistério da cegueira nacional.

O escritor amontoa seus livros nas escadas e constrói uma ponte e se equilibra em pé por cima dela.

Os músicos usam os instrumentos e gritam. Gritam por cada pessoa que passa na rua com o olho voltado para o celular ou para o relógio. Gritam pelas pessoas que correm apressadas e que por pouco não se atropelam. Gritam de desespero porque as portas estão fechando.

#carolescrevendocoisas