Graves equívocos sobre Religião: basta crer em Deus?

GRAVES EQUÍVOCOS SOBRE RELIGIÃO 2: BASTA CRER EM DEUS?
Miguel Carqueija

Há muitos anos atrás eu me encontrava no Mosteiro de São Bento do Rio de Janeiro (local extraordinário por sua história, arquitetura e espiritualidade) e travei conversa com uma senhora que ali fôra visitar a igreja barroca e secular. Ela estava acompanhada de seu jovem filho. E comentou que, infelizmente, ele não se interessava pela religião. O rapaz então pronunciou aquela frase que não deixa de ser um clichê:
“Basta crer em Deus.”
Ao longo da vida, diante de diversas questões, nem sempre eu tive presença de espírito mas, naquela ocasião, eu tive. E respondi:
“Não basta, não. O diabo também crê em Deus.”
Ele não gostou muito da minha observação, mas a sua mãe concordou comigo. Bem, talvez esse moço tenha mais tarde refletido, nunca se sabe.
Hoje em dia muita gente anda espalhando essa esdrúxula ideia de que a religião organizada é desnecessária e até nociva, que cada um pode ter a sua religião (na verdade, é apenas religiosidade). Corre mesmo pela rede um texto estúpido que, fazendo pouco das igrejas (que seriam apenas lugares frios e escuros) aconselha simplesmente a passear no mato, em meio à natureza, pensando em Deus.
Onde irão parar então a comunidade, os ritos, os sacramentos, as orações em comum, a liturgia da Palavra, os livros doutrinais e devocionais, as procissões, toda a riqueza que a Religião revelada traz?
Não é muita pretensão que cada um de nós possa inventar sua própria religião?
Tais pessoas são muitas vezes deístas inconscientes, nem sabem que estão seguindo ideias do Deísmo que é apenas, a meu ver, uma moderna gnose, ou seja, a Revelação do Homem.
Vejamos a propósito o que nos diz Pascal (os textos a seguir encontram-se no livro “O pensamento vivo de Pascal”, editado no Brasil pela Marins Editora, uma compilação organizada por François Mauriac):
“E, com esse fundamento (refere-se à luz natural) encontram ocasião para blasfemar da religião cristã, porque a conhecem mal. Imaginam que consiste simplesmente na adoração de um Deus considerado grande, poderoso, eterno: o que é propriamente o deísmo, quase tão afastado da religião cristã quanto o ateísmo (sic), que lhe é totalmente contrário.” (...) “Mesmo quando um homem estivesse persuadido de que as proporções dos números são verdades imateriais, eternas, e dependentes de uma primeira verdade em que subsistem, e que se chama Deus, não o acharia ainda muito avançado em sua salvação. O Deus dos cristãos não consiste num Deus simplesmente autor de verdades geométricas e da ordem dos elementos: essa é a parte dos pagãos e dos epicuristas.” (...) “Todos os que procuram Deus fora de Jesus Cristo, e que se detêm na natureza, ou não encontram luzes que os iluminem, ou acabam por encontrar um meio de conhecer Deus e de servi-lo sem mediador, e por aí caem no ateísmo ou no deísmo, que são duas coisas que a religião cristã abomina quase que igualmente. Sem Jesus Cristo o mundo não subsistiria; pois precisaria, ou que fosse destruído, ou que fosse como um inferno.”
Algumas palavras de Blaise Pascal, filósofo e pensador francês do século 17, podem parecer muito fortes; todavia entendamos que não se trata de abominar pessoas e sim ideias; e que os adversários da Igreja Católica fazem exatamente isso (e não deixam dúvidas em suas declarações) em relação à nossa Fé e muitas vezes, desprezando a virtude da Caridade, abominam também as pessoas.

Rio de Janeiro, 18 de março de 2019.


(imagem: fachada do Mosteiro de São Bento do Rio de Janeiro)