PICADINHOS HISTÓRICOS - PARTE II

1---Mais um SÍTIO ARQUEOLÓGICO. De volta ao 'ultra' passado, digamos assim... Perto da antiga Estação Leopoldina, desativada, Rio de Janeiro,pequena casa branca de portas azuis virou "museu", ou seja, em sala única, mesa também única, exposição de objetos achados numa obra de escavação da Linha 4 do metrô: conchas, pontas de lanças e de flechas, pedras, material já analisado e registrado por arqueólogos do museu Nacional da UFRJ (aquele incendiado...) como dos anos 2.000 a. C. a 1.000 a. C., pertencentes a 'paleoíndios', super ancestrais de Araribóia. Eram povos pescadores-coletores que honravam os mortos enterrando-os em meio a conchas (o cal preserva esqueletos), sambaquis à beira de mares, rios e terrenos alagados (caso daquela região) - vestígios semelhantes em toda a costa brasileira. E em meio a isso, uma aliança, pequenos pedaços de ouro e uma 'contemporânea' escova de dentes de Dom Pedro II. ---------- Outro SÍTIO ARQUEOLÓGICO descoberto em meio a obras de modernização da Santa Casa da Misericórdia, na rua Santa Luzia, centro do Rio. Pesquisadores encontraram, em escavações no pátio interno do hospital, carvão, cerâmicas indígenas, faianças portuguesas (louças de barro ou pedra), ossadas e outros indícios de sepultamentos. Como o local fica ao lado de uma das mais antigas igrejas do Rio, a de Nossa senhora de Bonsucesso, é grande a possibilidade de se tratar de cemitério ligado a ela; a área próxima ao Morro do Castelo foi das primeiras ocupadas pelos portugueses e um dos pontos iniciais da formação da cidade. IPHAN considerando importante este material e aprofundando estudos.

2---Os TUPIS não eram os mansinhos do território: eram guerreiros. Antropófagos, sim, mas não bárbaros, no conceito deles. O ritual cabalístico, um tanto raro, era uma forma de "ingerir" possíveis qualidades existentes no outro, como por exemplo a valentia dos capturados em batalha. Jamais comiam o bicho-preguiça. O futuro cardápio era mantido algum tempo vivo, meses, cercado de mulheres, comida farta e boa casa. Cerimônia longa no dia do sacrifício, muitos convidados das tribos vizinhas amigas; muita cantoria, corpo coberto com mel e penas; o algoz jovem, rosto pintado de azul, penas enfeitando a cabeça, violenta pancada no crânio da vítima e pronto! Carne assada - matador recebia a cabeça, cérebro virava patê, as entranhas eram para as mulheres, os dedos para as crianças - cauim para todos... Não ainda existindo freezer, defumavam pedaços para comerem tempos depois. Muitos portugueses e franceses testemunharam e (d-)escreveram tal "horror". HANS STADEN escapou, resgatado por um navio corsário francês - se deixou muitos descendentes mestiços, indiozinhos lourinhos (qual a cor dos olhos?), não sei...

3---Houve no Brasil a chamada "Literatura informativa", onde viajantes e navegadores contavam ao mundo as novidades-mídia neste novo mundo pós-idade Média. Verdades ou fakes, viessem aqui confirmar, ora bolas! Foi o nosso Quinhentismo. Início com a famosa Carta de PERO VAZ DE CAMINHA a El-Rei, em 1500: a grande extensão da terra recém-descoberta e o que ela poderia oferecer à Coroa portuguesa com a opulência de fauna e flora; ao longos dos anos, séculos XVI e XVII, diários e tratados bastante descritivos - valor literário pouco, publicidade muita. (Em Caminha, não exatamente o primeiro caso de nepotismo, emprego para parente, e sim a libertação do genro que sofrera pena de banimento para uma ilha africana.) A "História do Brasil" foi escrita em 1630 por Frei Vicente do Salvador, franciscano de idade avançada, mas grande observador da causa pública nativista (portanto, contrária ao colonialismo português), onde ninguém zelava (já naquele tempo!) pelo bem comum, somente pelo particular; em paralelo, narrativa plena de religiosidade, a tentativa de expandir a fé católica na conversão dos índios, o "gentio". muitos ainda antropófagos... e ele descreve esta matança e comilança... Se ainda oculto o caminho das pedras preciosas foi porque "Deus ainda não quis mostrar". O tal livro manuscrito foi armazenado na Torre do Tombo até o século XIX, veio para o Brasil com uma missão do nosso IBGE acabou no espólio particular do Marquês de Olinda, ministro durante o Segundo Império. e por sua morte, em 1870, por fim (que viagem!) vendido a um livreiro e repassado à Biblioteca Nacional, edição tipografada anos depois.

4---A cidade do Rio de Janeiro ainda conserva certos traços de antiguidade colonial, além da memória histórica de locais urbanos já extintos. TIRADENTES, Cristo brasileiro em eternizada via crúcis (embora desta vez sem carregar a cruz de seu próprio sacrifício), num 21 de abril /hoje feriado federal/, no ano ido de 1792, caminhou por muitas ruas do centro da cidade, desde a cadeia velha pública (hoje local do Palácio Tiradentes /assembleia legislativa de constantes guerras partidárias/, erguido em 1926, na praça XV, com enorme estátua do patriarca alferes-dentista diante do pórtico e à esquerda, no alto do prédio, Dom Pedro I, neto de Dona Maria, a rainha de Portugal que ordenou a morte do cidadão incomodativo...) até o largo de são Domingos, extinto, em algum ponto da atual avenida Presidente Vargas, entre rua Uruguaiana e a Igreja da Candelária. Nesta região do centro, ainda construções seculares, acreditem... No caminho do calvário, no Largo da Carioca, o conjunto do Morro de Santo Antônio: convento dos franciscanos "capuchinhos' e igreja da Ordem Terceira de São Francisco da Penitência, do início do século XVII, uma das construções coloniais mais antigas do Rio. Na Rua da Carioca, lugar ímpar, um restaurante ainda conserva igualzinha uma parede lateral, dá para ver a escada, tijolos à mostra, forma original do século XVIII, e uma loja de instrumentos tem nos fundos um muro de arrimo, de pedras, encostado ao morro citado, idos de 1700. Ainda no possível caminho de Tiradentes (sem fotos!), a praça que hoje leva seu nome a partir da República, era um campo de servidão (arrendatários mediante aluguel), o popular Campo dos Ciganos, que ali acampavam. Na Avenida Passos, a igreja de Nossa Senhora da Lampadosa (reforma da fachada no início do século XX, cuidadosamente conservada a mesma estátua da santa que por certo abençoou o sonhador), onde, da porta, impedido de entrar no local sagrado, JOAQUIM JOSÉ, sempre escoltado por soldados da Corte portuguesa, assistiu uma última missa (para quê, pergunto EU?), tadinho!

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LEIAM meus trabalhos "Estórias cariocas acronológicas", "Estórias cariocas sem cronologia" - Partes XXVII e XXXV e "Tiradentes humanizado".

NOTAS DO AUTOR:

ARARIBOIA - Um dos chefes das tribos dos termiminós. grupo indígena tupi, que habitava o território brasileiro no século XIV, e ajudou os portugueses na conquista da Baía de Guanabara frente ao invasores franceses aliados aos índios tamoios, em 1567. Como recompensa, recebeu uma região do outro lado destas águas, origem da atual cidade de Niterói, de que é considerado fundador. // HAN STADEN - Aventureiro mercenário e cronista-desenhista alemão do século XVI - nas duas viagens ao Brasil, combateu franceses e seus índios aliados nas capitanias de Pernambuco e São Vicente; por 9 meses foi refém dos tupinambás. Adorou o tatu, como bicho exótico. // CAUIM - Bebida à base de mandioca fermentada com saliva.

FONTES:

"Peregrinação pela história", de Isabel Kopschitaz - "Uma nação sob a ótica religiosa", de Leonardo Vieira - "Entre 1500 e 1600: Sim, nossos tupis eram canibais", de Pedro Dória - "Joia arqueológica no centro do Rio" - Rio, 20/4/08, 31/1 e 31/5/15, 21/7/18 --- "Programa de paleoíndio" - Rio, revista O GLOBO,26/7/15.

F I M

Rubemar Alves
Enviado por Rubemar Alves em 25/05/2019
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