A CRÔNICA DO PUDOR

Glorinha, a loira, retornou da sala do chefe pisando duro e com cara de poucos amigos. Esbarrou no canto da mesa e sentou-se, cuspindo fogo pelas ventas.

— Nossa, menina, o que foi? — Inquiriu a amiga Fabiana.

— Tarado!

— Hã? Quem? O Dr. Kleber?

— Aquele bode velho safado! UGHH! Que ódio!

— Eu falei para você não vir com essa saia curta, Fabiana, não falei?

— Ele me olhou com aqueles olhares e disse: Baixe o meu ZIP!!

— AH! AH! AH! Era um arquivo ZIP, sua tonta!!! Você achou que fosse o zíper da calça dele? AH! AH! AH!

— Chutei o pau da barraca. Falei um monte e o safado me demitiu!

— E mais, eu disse que o processaria por… Assédio sexual!

Êita ferro! Este pequeno e hilário relato parece coisa de maluco, mas não é. Provavelmente, Glorinha deu com os burros n’água ante o erro cometido. O que tinha de dotes físicos faltava-lhe em neurônios.

Há cerca de 400 anos atrás, as mulheres eram bem mais discretas, vestiam-se com roupas longas e com armações. Via-se, quando muito, detalhes sutis de braços, pescoço e ombros, e não partes polpudas e reveladoras como as de dona Glorinha.

Surgiram então os vestidos armados com volumes imensos de tecidos caros, como os montados em “Panniers” (semelhantes a largas gaiolas), e utilizados pela rainha da França, Maria Antonieta, no século 18. Elaborados com engenharia de ponta, seduzia homens do povo e muitos nobres, que arriscavam suas cabeças à guilhotina. Por ironia, a própria rainha dos Panniers acabou perdendo a sua em 1793, numa bandeja dourada, bem ao estilo rococó da época.

Com o tempo, as mulheres abandonaram as armações mais complexas, que dificultavam a higiene e seus movimentos em festas e passeios. Optaram por “Crinolinas”, verdadeiras gaiolas em formato de sino, que moldavam com mais discrição suas silhuetas. Muitas iludiam seus pares apertando suas cinturas com espartilhos ou ampliando seus traseiros com enchimentos, conhecidos como “Polissons”. Apesar do moralismo, muitas já usavam e ousavam até nos decotes.

O volume de roupas e tecidos encolheu muito, a partir do início do século 20. Surgiram os trajes de banho longos que cobriam todo o corpo, nas praias européias e ocidentais. Ainda assim, moças recatadas e de boa família jamais se expunham em trajes menores. Os homens também sabiam de seus limites e tampouco ousavam. Havia ainda muito pano para ser eliminado, ao longo do tempo.

Em meados dos anos 40, 50 e 60, o “clima” esquentou entre os jovens que sacudiam seus traseiros, levados por Franks & Elvis da vida, nos bailes e salões ao ritmo de rock’n roll, twist e Hally Gally. No Brasil, a Jovem Guarda nos brindou com muitos, especificamente a Ana Maria, escandalizando com seu “biquini de bolinha amarelinha tão pequinininho”, que cabia na palma da mão. Celly Campello trazia na simples e bela música isso e insinuava algo que futuramente, pouco ou nada assustaria.

O tempo passou. Eis que surge então, ele… o “Fio Dental”, um minúsculo tapa-sexo utilizado na maioria das praias por boa parte das moças de todas as classes sociais, e que atualmente frequenta o guarda-roupa de milhares de jovens cotidianamente. Sem susto, tampouco traumas.

Fica a dúvida quanto ao que é imoral ou não. Com base no vestuário, “qual o padrão aceitável de comportamento entre homens e mulheres”, num contexto civilizado como o descrito, e como conter ousadias e extremismos? Repito o que já disse. Há lei para tudo, inclusive para balizar comportamentos. “DE TODOS!”

Nunca é tarde para se aprender o que é certo ou errado. A nudez não é imoral, caso fosse, o que dizer dos índios? Somos civilizados e dotados de inteligência. Podemos começar a análise por aí.