FELIZES E ENGANADOS SEM SABER

Quando ocorreu a intervenção militar no Brasil em 1964, eu estava com 14 anos. Não entendia nada de política, mas sabia que Jânio Quadros havia renunciado em 1963 e que João Goulart era o atual presidente da República. No dia em que foi anunciada a intervenção, estávamos em casa ouvindo a antiga Rádio Eldorado AM (ainda não existia a FM) e foi através dela que ficamos sabendo o que havia acontecido. O locutor estava eufórico e naquela época o rádio era o veículo de comunicação mais rápido e confiável, pois praticava um jornalismo sério. O período dos governos militares durou de 1 de abril de 1964 até 15 de março de 1985. Entre 1967 e 1970, tive participação ativa nos protestos contra os militares, mesmo que por vezes sem saber o motivo, ou seja, seguia com a boiada. Em 12 de outubro de 1968 (o ano que não terminou, segundo Zuenir Ventura) fui ao famoso congresso da UNE, em Ibiúna/SP, que iria escolher o seu novo presidente, que tinha José Dirceu – aquele – como um dos candidatos e o engenheiro químico Jean Marc Von der Weid, como seu opositor. Não houve o tal congresso, pois todos que lá estavam – sem exceção – foram presos pelos militares. E, entre altos e baixos, se passaram os 21 anos, quando o presidente em exercício, João Figueiredo, devolveu o poder aos civis, que teria Tancredo Neves como o primeiro presidente pós-intervenção. Aí começaram os nossos problemas. Tancredo ficou doente, morreu e assumiu o seu vice e dono do Maranhão, José Sarney. Um verdadeiro desastre, época em que a inflação atingiu picos exorbitantes que acabou por levar à troca da moeda para o cruzado. Depois veio o “caçador de marajás” Fernando Collor que não terminou o mandato, sucedido pelo honesto Itamar Franco, o homem do pão de queijo. Depois de Itamar começaram as tragédias maiores: oito anos com o socialista Fernando Henrique e oito anos com o sindicalista Luís Inácio, sucedido por Dilma e Temer. Não tinha como o país resistir a tanta energia negativa. Mas, em todos esses 34 anos (1985 a 2019) nós fomos felizes e enganados, mas não sabíamos. Vou tentar explicar o meu ponto de vista: todos esses governos pós-intervenção foram mancomunados com a corrupção, as benesses, os desvios financeiros, os furtos, as trocas de favores, as obras inacabadas, etc. Tudo acontecia de forma escancarada, pois a imprensa, o Congresso Nacional e o STF nunca estiveram ao lado da população e todos se entendiam entre si (tal como hoje). O dinheiro rolava fácil, era a época do toma lá, dá cá. O Brasil com uma dívida imensa junto ao FMI, a população carente crescendo de forma exponencial, mas para nós – os normais – estava tudo em ordem, tudo correndo bem, pois a imprensa divulgava apenas o que era conveniente para todas as gangues. Nós nunca sabíamos a verdade completa e também não nos interessávamos. Então, éramos felizes, despreocupados e otimistas, mesmo depois da chegada da internet que propiciou alternativas de fontes de consulta, diminuindo em muito a soberania da grande imprensa. Nos dias de hoje, principalmente depois que esse governo assumiu, não há mais sossego. É uma encheção de saco que não tem fim, briga pra lá e briga pra cá, acusações, discussões idiotas entre aqueles que deveriam se preocupar com quem os colocou lá (nós, é claro), uma imprensa servil a toda essa bandalheira, uma trairagem sem limites, egos espalhafatosos e por aí segue a vida. E tudo isso com a imprensa tendenciosa ainda massacrando de desgraças nossos pobres cérebros já tão saturados pela vida difícil do dia a dia, trazendo-nos o baixo astral e, por vezes, a depressão, uma doença bem pior do que muitas por aí. É isso, não sei se consegui me fazer entender, mas o resumo é o seguinte: se você for meio alienado (no bom sentido) e não sabe das coisas tem grandes chances de ser muito mais feliz do que aquele sujeito super antenado que sabe de tudo, mas que não sabe para onde ir. Sei lá, entende?

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Arnaldo Agria Huss
Enviado por Arnaldo Agria Huss em 28/04/2020
Código do texto: T6931505
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