O que importa

Não sei o que será. Assim, destituído de qualquer certeza, porém, sabedor que, ao contrário de dogmas, a vida se constitui num amontoado de saberes, não desprezava a mínima oportunidade da conversa. Tinha por hábito, e por, uma quase religião, a satisfação estampada nos olhos quando se deparava em roda de amigos que, também, como ele, não ignoravam esse momento como um brinde igual ao nascimento de um filho. Creditava, como se fosse um menino iniciante nas armadilhas da vida, cada momento daqueles uma saudação ao que considerava ser a definição de existir. Sabia, por intuição, porque dizia, nunca ter lido em nenhum livro, que aquele sentimento, como o ar que se respira, a água que se bebe, se lhe faltassem, certamente, morreria. Não tinha uma fé, propriamente; todavia, quando perguntavam se Deus existia, respondia, que se existisse ou não, o que importava era saber que a solução para os problemas humanos, viria por mãos humanos. Atribuir ao divino soluções que não lhe cabem, além de injustas, eram terreno fértil para os mercadores da fé. E assim levava sua vida. Sem muitas vontades, sem muitas vaidades. Somente a certeza, essa sim, costumava dizer ter, que cada amigo, cada palavra, cada risada, enfim, cada momento vivido sem pretensões, senão apenas, de estar ali, com amigos, era um brinde a vida, um brinde a amizade.