Toda fila de banco é igual: ou você reclama com alguém da demora ou vice-versa. E como o celular é artigo proibido (em tese) a espera vira tortura. Não fosse, é claro, a sorte de encontrar uma figura que tinha acabado de engolir um papagaio e parecia vir de uma “festa estranha com gente esquisita”. Veio com uma estória de um filme cujo nome não se lembrava, mas que era similar aos 50 tons de cinza. Uma espécie de romance sadomasoquista. Não que sua roupa fosse um cartão de visitas, mas cinta liga branca e sapato de salto dourado as 11 da manhã era, no mínimo, diferente. Ela era bem eclética. Citou “O Mito” como sendo seu desejo de consumo (um dos filhos já valia); falou da impossibilidade de estudar quando era menina e das escolhas que a levaram a viver na Casa Norte. Costurou um bordado de luxo sobre suas aventuras e ficou muda quando viu o subgerente, meio que disfarçou o olhar. Até que entra na fila a D. Jandira, do Apostolado da Oração. Já chegou com um terço na mão! No meio estava eu, entre as cidadãs. Dona Jandira sempre afetuosa tentou um contato com a moça perguntando se já tinha encontrado Jesus. A moça meio sem jeito perguntou o por quê. Ela disse que Ele seria o único capaz de ajudá-la. Olhou pros lados e baixinho perguntou: - Mas quem contou pra senhora? Ela respondeu: - Foi inspiração de Deus! A moça pediu pra não contar pra ninguém porque ela era mulher de vida fácil. E o Jesus tinha uma família! A Jandira engoliu seco e começou a se benzer olhando pro filho que era o subgerente e cujo nome era Jesus. E eu pensando que eram conversas superficiais aleatórias da fila de banco.
Mônica Cordeiro
Enviado por Mônica Cordeiro em 07/07/2020
Reeditado em 07/07/2020
Código do texto: T6998811
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