Cuide bem do seu velhinho

O título acima é referenciado em música do paraibano Herbert Viana que canta a importância de se “cuidar bem do seu amor, seja quem for”. A alusão é clara: ou se cuida ou se perde. E depois, como acontece muitas vezes, se lamenta a perda.

A música me veio à lembrança por conta da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio feita em 2019 com o registro de que os maiores de 60 anos já passam de 34 milhões, representando 16,2% da população brasileira.

A análise da pesquisa revela um dado bastante significativo: os idosos estão assumindo cada vez mais a responsabilidade pelo provimento dos lares. De acordo com os dados da Pnad, 24,9% dos domicílios no Brasil têm pessoas de 60 anos e mais que contribuem com mais de 50% da renda domiciliar com aposentadorias, pensões, rendimento do trabalho ou de outro tipo.

Com essa carga é comum ouvir relatos de idosos que reclamam da situação em que se encontram, pelo fato de, ao chegarem a essa fase da vida, quando deveriam ter o merecido descanso após muitos anos de trabalho, assumem ainda o encargo de terem que cuidar da criação dos netos. Isso por desemprego de filhos, separação ou outras razões que os trazem de volta ao lar, dados esses que, com grande probabilidade, devem ter sido agravados pela pandemia.

Você leitor, deve estar se perguntando a essa altura: por que o título e por que a referência à música do compositor do grupo Paralamas do Sucesso? É que apesar dos números revelados pela pesquisa e do valor das pessoas idosas na manutenção das famílias, o tratamento a elas dispensado nem de longe é condizente com a importância, digamos, econômica, que elas têm.

A queixa que um pai ou uma mãe fazem, certamente não é pelo fato de estarem contribuindo para a manutenção de um filho ou de um neto. Em geral é pela forma como são tratados por essa parentela. Como observador do que acontece à minha volta, posso atestar isso.

Tive a oportunidade de conhecer um abrigo de idosos com cerca de trinta velhinhas, muitas delas com filhos e filhas, que nem no Natal passam para lhes fazerem uma visita. Posso até errar, mas com grande probabilidade de acerto, afirmo que dificilmente um pai, e principalmente uma mãe, abandonariam um filho naquelas condições. São esses velhinhos, que agora passam a ser “aturados” pelos filhos, como mantenedores que se tornam das obrigações domésticas, mas que a eles não é dedicado o devido carinho e respeito que são merecedores.

Não cuidam os filhos, por extensão e aprendizado do que veem, não cuidam os netos, e assim eles vão se encaminhando mais rápido para o final de suas vidas, levando consigo a galinha dos ovos de ouro das suas aposentadorias. E só aí é que essas pessoas verão que esqueceram de dar “as flores em vida, o carinho, a mão amiga”, como dizia o poeta, muito mais até pela falta dos bens que elas proporcionavam adquirir. Paulo, em uma de suas cartas, já dizia que “aquele que não cuida dos seus parentes, especialmente dos da sua própria família, negou a fé e é pior do que os que não creem”. Certamente o choro tardio nada resolverá.

Fleal
Enviado por Fleal em 03/11/2020
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