A PAZ QUE EU QUERO

A PAZ QUE EU QUERO

Quero a paz. Ela é possível e todos a precisam para uma vida digna e sem sobressaltos. Na sua ausência aparecem símbolos como a pomba e a bandeira branca. Em seu nome realizam-se conferências, criam-se organizações, promovem-se os mais diferentes eventos. É o maior anseio da humanidade, mas difícil é cultivá-la e mantê-la.

A paz que eu quero deve ter a cara de um mundo sem ódios. Precisa possuir o rosto inocente da criança. É o tempo inteiro sem armas. Exige a crença na verdadeira justiça que presume, acima de tudo, o perdão incondicional de qualquer falta ou erro, que alguém possa cometer.

Na paz aceito a derrota como passível a toda e qualquer competição, sempre a mais honesta possível. Pela paz abdico de direitos que julgo ter. Em seu nome não tenho adversários, somente, parceiros com direitos iguais. Assumo os compromissos, ciente de minhas limitações, e reconheço as capacidades de todos os meus semelhantes como iguais, ou mesmo, superiores. Por ter a paz na consciência, consigo falar dela a todos os homens, vendo, neles, a boa vontade, sem qualquer tipo de preconceito.

Somente a paz trará o progresso ao mundo inteiro. Para seu reinado ser efetivo, urge acabar com toda e qualquer ganância. É impossível que ela exista nas monumentais desigualdades sociais; nos gritantes desperdícios, por poucos privilegiados, de tantos recursos, que serviriam a muitíssimos outros, deles, necessitados.

Um mundo pacífico bane a fome da face da terra. Adota a criança para alimentá-la e educá-la. Saciada e educada, a infância será saudável e um ser conciso habitará a Terra; preservará e melhorará o ambiente, que poderá delegar íntegro a seus sucessores.

A paz jamais pode existir no trânsito alucinado; no fanatismo ensandecido das torcidas; na disputa fraudulenta do poder em eleições manipuladas; na existência dos monopólios industriais e comerciais; no tráfico e consumo de drogas de qualquer espécie e na separação forçada pelo seqüestro, exílio ou migração involuntária.

Para garantir a paz, os governantes unirão esforços em torno do desenvolvimento pleno das nações e pela convivência fraterna dos povos com todas as suas diferenças culturais e religiosas. Libertarão os cidadãos de qualquer prepotência e respeitarão as leis, como primeiro exemplo a ser seguido pelos governados. Evitarão instigar o ódio racial. Respeitarão a liberdade. Auxiliarão os desprovidos. Garantirão a livre locomoção e manifestação. Aceitarão as críticas a eventuais erros cometidos e agirão de forma a corrigi-los com a brevidade desejada.

O anseio da paz perpassa o tempo. Ao longo dos séculos apareceram grandes defensores propondo fórmulas para sua perpetuação. Um dos maiores, São Francisco de Assis, associa a paz à natureza. Amigo dos animais, torna-se o primeiro ecologista conhecido. Nas suas orações pede ao Senhor para ser um instrumento da paz. O pacífico vive em harmonia e solidariedade com a natureza sem agredi-la pela poluição e/ou pela destruição dos ecossistemas, mantenedores da vida integrada e manifestada pelas múltiplas formas de seres existentes.

Betinho, Chico Mendes e José Lutzemberger foram eficientes no lançar de sementes cujos frutos a humanidade toda colherá, se souber compreendê-los. São ícones insubstituíveis, presentes na memória de quem cultua a paz como o bem de valor máximo a ser alcançado.

Outra figura ímpar para testemunhar a paz em nossa era foi Chico Xavier. Seu maior anseio, ao longo da vida, foi a paz de espírito e a felicidade de seus irmãos.

Quero ver um mundo sem dominadores e sem dominados. Quero crer que a violência do terrorismo, do roubo, do assalto, do seqüestro e da corrupção não existe. Quero ter a certeza que cessar fogo, trégua e bandeira branca apenas constem nos textos históricos, teimosos em contar as proezas humanas do passado enfocando as guerras, inglórias lutas da bestialidade humana. Quero ver ressaltados os feitos de Ghandi, Martin Luther King, Teresa de Calcutá e Irmã Dulce. Quero que a pomba branca possa voar livre o tempo todo, sem a necessidade de seu aprisionamento a fim de soltá-la em ocasiões especiais de simbólicos cultos à paz. Quero a permissão de sonhar, que somente haverá lágrimas de alegria e, se alguém chorar, seja pela dor da despedida de um ente querido rumo à busca da paz derradeira.

Quero oferecer uma flor a cada pessoa solidária. Quero ser uma companhia para o ser humano solitário. Quero levar um abraço a cada vítima de alguma violência. Quero pedir perdão a Deus por cada bomba que os homens explodiram para ferir e matar. Quero acariciar a toda criança órfã por causa da guerra. Quero ser uma luz na escuridão da ignorância onde tantos ainda não podem vislumbrar o horizonte do saber. Quero conter os insatisfeitos em seus protestos violentos e aconselhá-los a procurar o diálogo sereno e fraterno. Quero rogar aos mais bem aquinhoados que compartilhem a fartura com os menos favorecidos. Quero sugerir aos investidos no poder que sejam clementes na justiça com os subordinados. Quero que o “mais” diminua e anule a distância com o “menos”. Quero que mudem todas as filosofias para a única verdadeira, a do Amor.

Quero que a Paz esteja contigo, comigo, conosco e com todos.

Obs.: Este texto foi vencedor do Concurso de Crônicas CIPEL-CORREIO DO POVO – 2002 e publicado nesse jornal em dezembro daquele ano.