Quem tem vergonha...

Cresci ouvindo a minha mãe dizer: quem tem vergonha, não mete vergonha a ninguém. São várias as situações em que, querendo ou não querendo, me envolvo e lembro desse ensinamento. Algumas delas passam quase despercebidas, em que as pessoas envolvidas são em pequeno número e só alguém mais atento observa. Já outras acontecem em público, e não há como passar em branco o ato descortês.

Desde que o celular se incorporou à vida das pessoas, o seu uso tem protagonizado várias situações delicadas (ou indelicadas). Em eventos públicos é comum os mestres de cerimônia recomendarem que os desliguem ou, pelo menos, os coloquem no modo silencioso. O que não quer dizer que todos atendam à solicitação, ocorrendo vez por outra, um toque num desavisado celular. Trata-se de uma descortesia com os demais presentes? Claro que sim! Isso incomoda, já que desvia a atenção das pessoas, que acabam se desconcentrando. É, portanto, um gesto de má educação. A questão é: o fato da pessoa ter sido deselegante, não desligando o seu aparelho, autoriza o palestrante a ser também descortês com ela, chamando a sua atenção em público? Ou seja, expondo a sua má educação perante todos?

Exemplificando: participava de uma palestra com um desses nomes nacionais, e de repente tocou o celular de uma pessoa. Na verdade não se ouviu o toque, pois o aparelho estava no modo de vibração. Mas ela atendeu e começou a falar. Por estar bem próximo ao expositor, a sua fala começou a incomodá-lo, ao ponto dele se dirigir a ela e dizer, rispidamente: - “A senhora está me atrapalhando, pare com isso”! É claro que ela não estava certa agindo assim, todos reconheciam. Mas o fato de ter sido tratada daquela maneira colocou a platéia do seu lado, tomando as suas dores. E o que estava previsto para ser uma grande palestra acabou perdendo o brilho por um gesto, também mal educado, em resposta a quem não estava agindo com boas maneiras. Custava nada ele, numa tirada de humor, ter resolvido aquela situação? Ou mesmo parado por um instante enquanto ela concluía a sua conversa, e aí perceber a sua desatenção com todos? Formas várias poderiam ser sugeridas, em vez daquela em que um comportamento inadequado se transformou em outro, na mesma direção.

Mas há também a situação em que a pessoa nem se dá conta do que está fazendo. No embarque de um voo observei uma pessoa dirigir-se à comissária de bordo com o seu cartão de embarque na mão pedindo orientação sobre o lugar em que deveria sentar-se. A aeromoça olha, lê, e informa: – “É na 14 B”. A senhora, falando bem baixinho, revela a sua ignorância dizendo: - “Mas eu não sei ler”. Ao que a bonita jovem, “gentilmente”, lhe devolve: - “Nem número a senhora sabe ler?” Com a cabeça baixa ela assente, reconhecendo mais uma vez a sua deficiência, e só então a comissária dispõe-se a levá-la à sua cadeira.

Em ambas as situações foi instantâneo lembrar-me do ensinamento materno: quem tem vergonha, não envergonha os outros. E pouco importa se a descortesia é feita em público, ou mesmo de maneira reservada, que quase ninguém perceba. Não deixa de ser o que apelidamos de falta de educação.

Fleal
Enviado por Fleal em 06/04/2021
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