Dores de amor

Dor é dor, embora cada um tenha a sua e até pense que ela é sem igual. É comum, por exemplo, alguém ao se queixar de alguma algia (sim, elas têm até um radical grego para nomeá-las), ouvir do outro coisas como, “mas igual à que eu senti, eu garanto que não é...”. É tal a mania de grandeza do ser humano que não quer ser igualado ao outro, nem em suas dores...

A sua ação não se limita a uma parte específica do corpo, embora algumas dessas engrenagens pareçam receber cotações de mais doloridas que outras. Pelo menos é o que pensa o seu “proprietário” e as comparações que são feitas, seja com a dor de dente, a de coluna, a de ouvido, e por aí vai, passando por todo o esqueleto. Sem falar nas famosas dores do parto, que ficaram reservadas só para as mulheres.

Algumas delas são mais aclamadas que outras, e ganham até epiteto: “pior dor que um ser humano pode sentir”. Não é à toa que, por serem tão famosas, costumam até ganhar programas de TV, integralmente dedicados a elas. Quem não se lembra, por exemplo, de algum Globo Repórter com foco nesse tema?

Elas são tantas e de naturezas diversas, que até se tem, informalmente, uma gradação para essas dores. Essas comparações variam desde as que são relacionadas àquelas originadas no nervo trigêmeo, que parecem ser as mais cotadas na categoria das insuportáveis, até a que é nomeada como “não sinto uma dor num fio de cabelo”, simbolizando aquelas que seriam as de menor intensidade, ou mesmo a sua inexistência. Entre esses extremos é possível encontrar as que são referidas como “só dói quando respiro”. Ainda tem aquelas que não se resumem apenas a um determinado órgão. Começa a doer numa parte e “responde” em outro lugar do corpo. As dores de coluna são um bom exemplo desse enraizamento. E assim elas vão passando de pessoa a pessoa: uns com menos, outros com mais da conta. Mas tudo isso se trata de males físicos, coisas que um bom médico, com uma boa anamnese e uma série de exames, consegue, em breve tempo, encontrar a sua origem e, a partir daí, tratá-la adequadamente. Até a famigerada dor fantasma.

Mas há um tipo de dor, para a qual não há medicamento farmacêutico que consiga debelá-la: são as tais dores de amor. Essas são cantadas em prosa e em verso. O nosso cancioneiro popular, por exemplo, é cheio de músicas que tratam dessa “mazela”. Algumas até trazem explícita a palavra dor, como uma de Jota Quest que diz: “Ei dor, eu não te escuto mais, você não me leva a nada”; ou essa outra de Marisa Monte: “Se ela me deixou, a dor é minha só, não é de mais ninguém”. Já outras são tratadas pelos seus sinais mais evidentes nesse tipo de dor: o choro e as juras, assim cantados na poesia de Rosa Passos: “Jurei não mais amar outra pessoa, pra nunca mais chorar como chorei. Mas, vi que amar é coisa muito boa, e assim, mais uma vez, me apaixonei”. Até parece que, por amor, a dor vale a pena, embora, por mais que se cante e conte, ela é tão única e de quem sente, que inspirou o poeta a dizer que “a dor da gente não sai no jornal”. Saindo ou não, uma coisa é certa: “dor de amor é difícil curar”. Assim cantou o Zeca.

Fleal
Enviado por Fleal em 15/06/2021
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