Ontem no trem: Salve as "Antônias"!

E hoje conheci Antônia.

Embarquei as 11 horas, vindo do trabalho. Na próxima estação uma mulher com uma criança no colo embarcou também. Alguém cedeu o lugar para esta mãe e seu filho. O trem começou a encher. Interessei-me pelo que vi a minha frente. Mulher, estrutura pequena, mulata, magra, testa alta e iluminada, cabelo crespo e curto puxado pra trás por uma tiara. No seu colo estava uma criança aparentando 3 anos. Ela com todo cuidado ao sentar, puxou uma toalhinha passou álcool nas mãos do menino. Em seguida, pegou uma garrafinha impecável, com nome de José gravado, de dentro de uma mochila organizada e extremamente limpa. Vi o zelo e o carinho que tratava o menino em seu colo.

O menino, que pelo nome gravado na garrafinha, se chamava José estava um pouco agitado. Segurava um carrinho em suas pequenas mãos. Ora fazia carinho na mãe, ora deixava o carrinho cair. Alguém por perto pacientemente pegava e ele dizia com voz doce e infantil "0brigada moço" e tornava a mexer no cabelo da mãe de forma contínua. Ela pacientemente o ninava. Ele foi se acalmando. E eu divagando, olhando estes gestos de carinho embalados pelo balanço do trem e cercado pela multidão que se acotuvelavam.

Certa hora vagou um lugar próximo a ela. No entanto ela se transferiu de lugar, devido ao sol.

Fiquei inquieta, algo naquela jovem mãe me chamou atenção, precisava trocar algumas palavras com ela, pelo menos saber seu nome ...Ela era iluminada!

Não a perdi de vista. O trem chegou em seu destino final, Central do Brasil. Caminhei para porta, próximo dela e quando descia do vagão puxei assunto.

Enquanto saía da estação descobri que ela se chamava Antônia e o nome de seu filho José.

Ele sonolento estava em seu colo. Suas perninhas compridas cobria quase todo o corpo franzino da mãe.

Ela caminhando me disse que levava José todos os dias na creche em Marechal Hermes. Pasmem ! Embarcava na central até Marechal Hermes. São 17 estações que esta mãe percorre todo dia para levar José pra creche!

Fiquei assustada e indaguei o motivo dele estudar tão longe.

Ela deu uma paradinha, olhou para mim e me contou o motivo. Falou que morava próximo a Marechal, mas José, apresentou problemas respiratórios graves e foi internado vários dias. Depois de vários médicos e várias internações, ela descobriu que sua casa estava com mofo e infiltração e isso estava afetando muito a saúde de José.

Ela não pensou duas vezes, saiu de casa e foi morar com uns parentes no centro até conseguir arrumar sua casa.

Daí esta distância que ela percorria todos os dias era para não perder a vaga na creche.

Ainda caminhando, aquela mulher de corpo franzino, segurando José que estava adormecido em seu colo, dizia:

" Agora mesmo estou muito preocupada...José não consegue comer, reclama que tem algo na garganta, pede toda hora água . Já levei em vários médicos e ninguém descobre o que ele tem. Dizem que ele não tem nada. Mas ele não consegue comer direito. Fico desesperada sem saber o que fazer. A última médica disse que ele parece ser autista. Mas claro que não é, dona. Ele é muito esperto. Não entendo porque ela falou isto. Ele tem 3 anos e 9 meses, é agitado mas normal para uma criança...Não é não, moça...?" Virou pra mim com aquele rosto iluminado, com sotaque nordestino e perguntou: " a senhora acha ele normal, né?"

Calei-me por um segundo, toda esperança do mundo contida naquela pergunta. O que responder para Antônia?

Respirei, observei todo aquela preocupação e sacrifício em formato de uma mãe e respondi que José era um menino muito bonito, esperto e aparentava está muito bem, mas que seria interessante ouvir outras opiniões médicas e ser avaliado por um especialista. Pois ainda estava bem novo e qualquer que fosse o diagnóstico, o tratamento teria mais sucesso se começasse cedo.

Ela me olhou com aqueles olhos castanhos, vivos e falou:" É muito para uma mãe, meu Deus! Mas José é meu bebê e tudo vai dar certo. Vou cuidar dele sempre. Ele é muito esperto."

Aquele breve momento de papo chegou ao fim. Ela foi para o lado esquerdo e eu segui em frente para pegar o metrô.

Segui com uma admiração enorme por aquele ser chamado Antônia.

Percebi que ela em momento algum do nosso papo citou o pai ou qualquer figura masculina...Realmente não sei se tinha um em sua vida ou algum tipo de ajuda.

Só posso testemunhar e relatar o que ouvi e presenciei. Atitudes, coragem e relato de uma mãe extremamente zelosa e carinhosa. Sorte de José em ter uma Antônia em sua vida. Se for contar pela impressão que tive, ele não será desamparado, seja qual for o problema que apresentar. Mas tudo está nas mãos de Deus.

Coragem eu sei que aquela pequena mãe tem de sobra!

Penso no papel da "Antônias", casadas, solteiras, sozinhas, mãe dos filhos ditos " normais" ou "deficientes", para as " Antônias" todo filho é ESPECIAL. Realmente este ser chamado Mãe é iluminado.

Ainda estamos no mês de maio, mês de homenagens.

Penso na minha mãe que ainda tenho o privilégio de ter ao meu lado. Na sua força, coragem, dedicação e abnegação.

Penso no dia em que me tornei mãe... Sabia de tamanha responsabilidade que chorei sem parar...Não me sentia preparada...O medo invadiu impedindo-me de celebrar nos primeiros momentos. .. Como vou conseguir carregar por 9 meses dentro do ventre? Como carregar pela vida toda no coração? Para sempre dentro de mim...

Pois bem...Hoje percebo a dádiva que recebi de Deus para toda vida: SER MÃE.

Mas , não obstante, sinto a agonia , a responsabilidade, o medo e a apreensão desta função. Ser mãe é embarcar em uma responsabilidade enorme, sem data para acabar e motivada pelo amor incondicional.

Realmente as "Antônias" merecem todo nossos aplausos.

Mãe no sentido amplo! A que gera no ventre ou no coração...

Não importa...

Ser mãe transcende o corpo é papo de alma.

Salve as Antônias!

Beijo em todas as mães!