Até que um dia......

Até que um dia....

Branca de olhos verdes e apaixonada por um rapaz branco e trabalhador. Sonhava com o casamento e o casamento seria com ele e o coração de quinze anos, "coração de quinze anos sabe ser feliz", já fazia lindos planos e dentre eles estava o tal casamento e a saída do jugo da irmã tísica e tirana. Enquanto ela bordava o enxoval de sonhos..a irmã já tinha planos reais para aquela boca linda e demais. Sem ter a coragem de enfrentar a algóz mor, se viu "dada" a um negro o qual ela sequer sabia ele existir. Não lamentou..não chorou..fez as trouxas e acompanhou seu dono e senhor. A primeira noite um horror, mas ela suportou. Vida na roça, só ela e o dono pois como tal ele se comportava. Logo se viu prenhe..deixou a natureza agir..entre surras e muita cachaça nasceu o primeiro naturalmente..ela não deu um grito. Pariu e foi socar arroz..cuidar da lida. Amamentou por instinto. E assim foram chegando os filhos todos gerados na fome e no estupro consentido e calado. Resolveu ele ir para a cidade de mudança..depois de anos..ei-la na cidade com a prole. Todos devidamente entalados num ranchinho mas o bom era que estavam na cidade. Ele por completo dela se esqueceu o que a fez sentir o gosto da felicidade. Logo lavadeira e os maiores na labuta da vida..vendiam verduras..entregavam as malas de roupas..viviam. Ele se enrabixou com a vizinha que ela não conhecia por pura falta de tempo. Trabalho desde o amanhecer até o anoitecer. Se ela não sabia e nem queria saber da vizinha..o contrário se dava com a dita. Não só a conheceu como também deu de implicar. Na verdade a vizinha era senhora de casa de luz vermelha assim como as filhas. Prestou não. Vizinha colocava as filhas para atirar torrões de terra na roupa limpa e alva estendida no varal. Calada e já prenhe de mais um filho da bebedeira..ela sempre calada lavava novamente a roupa..sem nunca brigar ou contar à ele. Como ela não reagia..virou rotina e a vizinha resolveu sair da tal rotina. Começou por incentivar as filhas a surrar os meninos..só choros vindos da rua e ela na calmaria da salmora. Ele nem sabia distinguir um filho do outro..mas sabia a arte de espancá-los. Um dia..já em adiantado estado de graça..lá pelo oitavo mês..eis que surge uma das filhas gritando socorro pois estavam matando o irmão..ela foi e viu a cena e viu o filho ensanguentado e tentando se livrar. Os irmãos todos em desespero tentando ajudar. Ela pediu..ela tentou levou alguns chutes no barrigão e viu que não teria socorro..voltou prá casa pegou a espingarda..engatilhou e pediu "solta meu filho" vem buscar, foi a resposta já agora da mulher da casa da luz vermelha. Ela chegou perto perto o suficiente para acionar o gatilho e atirar certeiro..no meio da testa. Ele..fugiu..ela foi presa..e junto à ela os filhos ficaram. No dia 12 de julho de 1961 ela pariu seu último filho com ele. Cinco quilos e mais muitos gramas de um baby faminto..não dava trégua o gurí. Ela se habituou com a nova vida e idem os filhos e a cidade que tinham por ela enorme respeito. Lavava as roupas dos policiais e acabou foi lavando roupas de quase toda a cidade eis que já contava com as filhas no labor. No dia do julgamento Tribunal do Júri..ela se ajeitou e se sentou calmamente. Ocorre que o gurí deu pela falta do peito..pois a vida era aquela coisa morna e branca que o deixava satisfeito e sonolento. Baby berrou e não teve jeito..só se calou quando levado ao dela peito e dele não se separou até o momento em que absolvida ela saiu com Baby atracado ao seio.

Ela hoje está uma senhora manhosa que só. Ela me chama de Peixão. Eu a tenho como mãe. À ela eu dedico este esboço de crônica e com imenso amor! Fim! Dorothy - Goiânia, 15 de dezembro de 2007.

***E antes que se fale em racismo, deixo explicado que ela amava um branco que poderia ser azul ou verde, portanto ela não amava ao negro que lhe foi *imposto*. Ama-se por vários motivos que independem de cor dentre outras variantes.

QUEM SABE

(Carlos Gomes)

"Tão longe de mim distante,

Onde irá, onde irá teu pensamento?

Tão longe de mim distante,

Onde irá, onde irá teu pensamento?

Quisera saber agora

Quisera saber agora

Se esqueceste,

Se esqueceste,

Se esqueceste o juramento

Quem sabe se és constante?!

S'inda é meu teu pensamento

Minh'alma toda devora

Da saudade, da saudade agro tormento.

Vivendo de ti ausente,

Ai meu Deus,

Ai meu Deus, que amargo pranto!

Suspiros, angústia e dores

São as vozes, são as vozes do meu canto

Quem sabe Pomba inocente

Se também te corre o pranto

Minh'alma cheia d'amores

Te

Dorothy Carvalho
Enviado por Dorothy Carvalho em 15/12/2007
Reeditado em 13/05/2022
Código do texto: T779108
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