Um Completo Estranho
Desde muito garoto, fui fisgado pela voz rouca e pela gaita presa ao pescoço de um certo trovador americano. Bob Dylan apareceu na minha vida como um raio – desses que, em vez de assustar, iluminam caminhos. Não tínhamos internet, redes sociais ou playlists infinitas. O pouco que eu sabia sobre ele vinha da TV ou de alguma revista que, por sorte, chegava até mim. Mas bastou uma fagulha para o incêndio se alastrar: tornei-me fã de carteirinha e, na ânsia de me aproximar do meu ídolo, aprendi a tocar gaita.
Os anos passaram, mas minha admiração permaneceu intacta. Suas letras profundas e provocativas sempre me acompanharam, como trilha sonora de uma vida cheia de perguntas. Então, veio Sofia. Minha filha. Pequena, curiosa, crescendo em um mundo tão diferente do meu. Eu nunca forcei nada, nunca impus meu gosto musical. Mas, de alguma forma que até hoje desconheço, ela se encantou por Dylan. Passou a ouvir suas músicas, a pesquisar sua biografia, a tentar entender o homem por trás da poesia.
Um dia, há cerca de um ano, ela me deu uma notícia que fez meu coração acelerar: estavam produzindo um novo filme sobre Dylan, Um Completo Estranho. Fizemos um trato ali mesmo – quando estreasse, iríamos juntos.
E finalmente chegou o dia. Sentamos lado a lado no cinema, cercados por estranhos que, como nós, tinham algo em comum: uma ligação invisível com aquele cantor que atravessou décadas sem perder a relevância. As luzes se apagaram. Logo na primeira cena, um arrepio tomou conta de mim. O ator não era apenas parecido com Dylan; ele era Dylan. A história se desenrolava diante dos meus olhos como um filme dentro do filme – porque eu já conhecia cada detalhe, cada reviravolta, cada verso escrito por aquele gênio.
Mas o que realmente me emocionou não foi só reviver a trajetória do meu ídolo. Foi olhar para o lado e ver Sofia, tão jovem, tão entregue, tão tocada quanto eu. Seus olhos brilhavam, e os meus também. Para nós dois, BD não era Um Completo Estranho.
Saímos do cinema sem precisar dizer muita coisa. Às vezes, a música tem esse poder: conecta almas sem necessidade de explicações. E ali, sob as luzes da cidade, percebi que Bob Dylan nos deu mais do que versos e melodias. Nos deu um laço, um momento, uma história para guardar.
E, no fim das contas, talvez seja essa a verdadeira magia da música.