BOTAFOGO, O GLORIOSO

A FAMÍLIA BOTAFOGUENSE

Nelson Marzullo Tangerini

José Pinto da Costa, natural de Valença do Minho, Portugal, veio para o Brasil com 6 anos de idade.

Veio para trabalhar com os tios, donos da Casa Pinto, na Rua Buenos Aires, no centro do Rio de Janeiro. Estes prometeram a sua mãe que lhe dariam trabalho e estudo. José, primo do ator português Jaime Costa, porém, não passou de um simples vendedor de móveis. Seus tios jamais se preocuparam em lhe dar instrução.

Para nossa família, José, o lusitano que torcia ardorosamente pelo Botafogo, e que todos nós chamávamos de Dindinho, foi um santo, aquele cidadão sem diplomas, humilde e sábio que nos converteu a todos, Maurício Marzullo e Maurício Jorge saturno Marzullo, Dinorah Marzullo, Nestor Tangerini [que um dia torceu pelo América do Rio por causa de seu amigo Lamartine Babo], Nirton, Nirson e Nelson Tangerini em botafoguenses.

Posteriormente, vieram Alexandre, Leonardo e Leandro Marzullo Barcelos, convertidos pelo pai, Amadeu José Ferreira Barcelos, marido de Marisa, pelo avô Maurício e pelo tio Maurício Jorge.

Falava-me da história do Elektra Football Club, fundado em 1904, dos dois Botafogos [futebol e regatas] que se uniram, dos grandes mitos Heleno de Freitas e Mimi Sodré, dos grande jogos, das grandes jogadas, do campeão desde 1910 e do tetracampeonato histórico.

Casado em segundas núpcias com a atriz Antônia de Oliveira Soares Marzullo, minha avó, mãe de três gloriosos filhos, Maurício, Dinah [minha mãe] e Dinorah, José não deixou descendentes biológicos, mais foi um verdadeiro pai e avô para todos nós, que formamos uma família botafoguense.

O primeiro a ser convertido em botafoguense foi Maurício Marzullo, advogado e poeta. Maurício me contou que foi com José que assistiu pela primeira vez a um jogo do Alvinegro de General Severiano. O glorioso, que não pode perder para ninguém, como diz seu hino, composto por Lamartine babo, foi goleado pelo América por 11 x 1. Maurício ficou meio frustrado e atormentado com a chuva de gols do Diabo; e José, que tinha em mente converter o garoto em mais um torcedor do Clube da Estrela Solitária, imagino, deve ter pensado que pela cabeça do enteado tivesse passado a idéia de mudar de clube. O tempo foi passando, vitórias e grandes estrelas foram vindo e Maurício foi se apaixonando definitivamente pelo clube, que, um dia, projetou grandes estrelas como Mimi Sodré, Heleno de freitas, lenda viva do futebol carioca, aquele que morreu delirando e pensando no clube, o Demônio das Pernas Tortas ou Alegria do povo Garrincha, a Enciclopédia do Futebol Nilton Santos, o seguro goleiro Manga, o Folha Seca Didi, Amarildo, Zagallo, João Saldanha, O Imperador Jairzinho, O Canhotinha de Ouro Gérson etc. tanto que o poeta Marzullo dedicou ao clube um iluminado soneto:

“BOTAFOGO F. R.

A família botafoguense

Nas desportivas lides aclamado

por altos feitos de valor e glória,

o Botafogo é tido e consagrado

como o que luta mais pela vitória.

Rememorando os triunfos do passado

nas páginas sem par da sua História,

veremos quanto esforço denodado

para manter sem mancha a trajetória!

Irmãos botafoguenses, reprimidos

os ódios, desavenças e paixões,

juremos com fervor que, sempre unidos,

honrando o nosso clube e as tradições,

bem alto o elevaremos, destemidos,

alicerçado em nossos corações!!!”

José, que, vindo para o Brasil, aos 6 anos, deixava para trás a sua mãezinha, pedia que minha mãe lesse as cartas que sua mãe querida lhe enviara de Portugal. Tinha-as todas guardadas, numa caixa. Um dia, José juntou dinheiro para visitar a mãe, já muito idosa. Talvez se vissem pela última vez. Mas José foi roubado e seu sonho não pôde ser concretizado. Nunca mais se viram. Sua mãe veio a falecer. Dinah era uma voz feminina a ler e reler as cartas de sua mãe. Sentado em sua cama, o Zequinha fechava os olhos e chorava copiosamente. A saudade lusitana o torturava.

- Como me arrependo de deixar meus filhos irem para o Brasil! – lamentava ela.

Quando estive em Portugal, em 2002, acompanhando o escritor Edgar Rodrigues, fiz questão de ir ao Minho. Queria fazer a viagem que meu avô não fez. De lá, telefonei para minha mãe e lhe disse:

- Olá, mãe, sou eu, Nelson, seu filho. Estou na terra do Zé, no Minho. Daqui vejo a Espanha.

[O Botafogo teve os maiores jogadores do mundo; é o clube que mais cedeu jogadores à Seleção Brasil. Invejado por muitos, O Glorioso é, por isto, o time mais roubado da história do futebol brasileiro]

Nelson Marzullo Tangerini, 52 anos, é escritor, jornalista, compositor, poeta, fotógrafo e professor de Língua Portuguesa. É membro do Clube dos Escritores Piracicaba [ clube.escritores@uol.com.br ], onde ocupa a Cadeira 073 – Nestor Tangerini.

n.tangerini@uol.com.br, tangerini@oi.com.br, nmtangerini@yahoo.com.br

Nelson Marzullo Tangerini
Enviado por Nelson Marzullo Tangerini em 25/02/2008
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