O FÊNIX CHURRASQUEIRO

Vida boa é a do seu Barriga. Homem calmo, empresário “subterrâneo”, do tipo de pessoa que não tem boca para nada. O seu Barriga, e não é preciso justificar o seu apelido, gosta mesmo é de fazer todas as quartas e sextas-feiras um bom churrasco na churrasqueira de sua garagem, aí ele está no seu habitat natural, e isso regado com algumas cervejas bem geladas compradas na Bodega da Niélia e, sempre no carderno, é claro.

Pois o seu Barriga, que justifica seu apelido alisando sua protuberância abdominal na porta da garagem, é um homem de temperamento dócil, ao menos aos olhos da vizinhança, mas para compensar, é casado com uma mulher que parece ter fogo na cola e na língua. A mulher de seu barriga, a dona Leisir, é daquelas mulheres que adotam o homem como se fosse um filho. Super-protegem, lavam, passam, cozinham, vão ao armazém, dirigem para ele, só ficam em casa matraqueando com as vizinhas que não acham o que fazer, e ainda, determinam aos maridos quando e aonde vão almoçar fora, ...e por aí vai. Só há uma coisa que dona Leisir abre mão: é que o seu Barriga faça o seu churrasquinho todas as quartas e sextas-feiras, pois ela também o acompanha na enxugada de algumas cevas por conta da “Fifa” comandado, sempre discretamente, pelo seu Barriga.

Tendo estabelecido a sua empresa de atividades “subterrâneas” numa casa alugada, ao lado da sua, por precisar de mais espaço para crescer, a “coisa” começou a prosperar. Certo dia, quem vejo em frente a dita empresa: uma unidade móvel da Secretaria da Fazenda, com os dizeres Receita Estadual. Uma daquelas viaturas que assombra qualquer um que carrega carga comercial em seu veículo sem nota fiscal. Desceu três agentes de planilha na mão e mais um brigadiano, daqueles com cara de cão farejador que descobriu a caça. Entraram depressa na empresa do seu Barriga. Enquanto um lavrava uma notificação em plena calçada, em frente à vizinhança atônita, os outros carregavam todos os computadores e uma dúzia de caixas, com a documentação da empresa. Fiquei sabendo depois que o seu Barriga havia atravessado umas bugigangas do Paraguai e a Receita estava de olho nele havia algum tempo. Aqueles acontecimentos desabaram o pobre homem que acabou encerrando as atividades na casa alugada, tendo voltado com seus tarecos que restaram para a sua residência ao lado. Passou algum tempo de portas fechadas, para alvejar a alma do pecado cometido, talvez.

Como a sua casa é de esquina, alguns daqueles moleques pichadores da madrugada transformaram a parede lateral da casa em um painel para demarcar território, como cachorro fugido, solto nas ruas, assim como também, para mandar mensagens as suas “namoradinhas”, por conta da depredação do patrimônio alheio e a impotência da polícia.

A Dona Leisir, que sempre falava alto da porta de sua garagem e cantava de galo a tudo e a todos que invadissem seu espaço visual com coisas que não gostava, não suportou tanta humilhação. Contratou um grafiteiro para cobrir a parede com tinta vermelha, cor de sangue, daquelas tintas que não saem nem com reza braba. Por cima daquela tinta que bem representava a raiva de dona Leisir, mandou grafitar tudo. Mas como era muito mandona, logo a vizinhança já ouvia a dona mandona reclamar que não era aquilo que deveria ser grafitado. Estava insatisfeita com a inspiração do pobre artista contratado. Para agradar a dona Leisir, o rapaz logo desenhou o rosto dela na parede, mas ainda não conseguira aplacar os nervos da patroa. Passado alguns dias, e com a porta da garagem já aberta, seu Barriga ressurgia das cinzas, no meio da porta, sem camisa, a alisar a sua protuberância abdominal, sorrindo amarelo para os vizinhos parecia feliz. Foi neste momento que pude entender o que realmente dona Leisir queria. Num canto, na parte de baixo da grafitagem da parede de sua casa, dona Leisir mandou pintar em letras grandes e com tinta bem visível - JUSTIÇA. A partir daí, retornaram os churrascos e as cervejadas semanais por conta de seu Barriga, o qual, sempre pilotando com grande maestria a sua velha, mas, bem pintada churrasqueira.

Camponez Frota
Enviado por Camponez Frota em 13/04/2008
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