E daí...
Angélica T. Almstadter
E daí se na soleira do dia o jorro das palavras
não produzem afetos...cada dia é uma nova oportunidade
de semear e de colher...a ilusão que veste as horas
tem seu fascínio preso no coração que é capaz de produzir
muito mais do que é capaz de entregar, seja pela covardia,
seja pela ambição... porque só se doa o que se tem...
só se derrama o que transborda da nossa taça...
E daí se o dia se veste de guerra e escolhe as armas...
E daí se de golpes fatais se faz a luta que abrevia as palavras...sepulta sonhos...amputa vôos e mata verdades...
e daí se assim é que se conduz os passos...se assim é que se registra os fatos...
e daí se as cicatrizes nunca se fecham...se lanhos novos
imprimem novos passos...
Espicho o corpo na tarde como se buscasse
no divã do imaginário as soluções...que nunca acho...
no altar dos meus segredos...escondo meus medos...
e quando encolho minhas falas...é quando beijo meus
silêncios...
abençôo minhas parcas horas de solidão...
quando posso encontrar comigo...na profundidade do meu ser...e me confessar as minhas incertezas...
afrouxar as minhas palavras e lavar a alma que
insiste em se manter sob a poeira dos velhos
pensamentos...retendo e abraçando sofrimentos
que só abrem fendas doloridas...
Debruço sobre as horas inertes...quando
nada se move...para ouvir o tambor do meu coração
explodindo alto em ecos por todo meu peito...
e quando ele bate mais alto que tudo ao meu derredor
de certezas me cerco...
estou viva...há mais o que fazer...