Secura

As portas de entrada, todas escancaradas, e nenhuma fresta de saída. Como armazenar tantas informações, e segurar tantas incertezas? Entre um amanhecer e um começo de madrugada quanta vida correndo ansiosa, tanta prosa sem conversa e tanta conversa sem pressa.

Bastaria um dia de diques abertos, pra vida escoar livre e esgotar em si só, bastaria um estalar de dedos e as comportas fariam gerar energia capaz de iluminar a cidade, mas a vida continua apagada atrás da chama que oscila, entre um sonho e uma promessa.

Quando fechado em si estão os sentidos todos e nem uma oração, por mais bela que seja, parece surtir efeito, morre um pouco a canção que livre rola pelas quatro paredes, a mesma que ganha os ares da noite e vai ao infinito trocar confidências mudas com a pureza dos astros e a ternura dos acasos.

Há muito o que plantar ainda nas estradas sem prumo, e muito pouco pra se esperar pra colher, medidos como sempre foram em mãos generosas; que pena, não se soube contar em anos aproveitáveis o exercício da experiência.

Escondida atrás dos rabiscos tolos e das horas desgraçadamente caiadas nas mesma portas e paredes, lá se foi a inútil juventude. Diante do espelho a vida pode sorrir sem constrangimento, mas diante da secular secura de palavras;

só a clareza do silêncio pode provar a crueldade, como se fosse ela a única verdade.

Atrás da vidraça não se pode sentir o calor do sol...

Angélica Teresa Faiz Almstadter
Enviado por Angélica Teresa Faiz Almstadter em 17/06/2005
Reeditado em 09/11/2014
Código do texto: T25131
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