MULHER

As discussões sobre a presença da mulher na vida pública remontam há séculos. Platão já questionava esse problema no seu livro “A República”, escrito entre 380 e 370 AC, quando entendia que as mulheres poderiam e tinham capacidade para cooperar criadoramente na vida da comunidade. O filósofo grego não partilha a opinião dominante no seu país, segundo a qual a mulher é destinada pela natureza exclusivamente a conceber, criar os filhos e cuidar da casa. Com isso, demonstra nos seus tratados que não existem profissões só acessíveis ao homem ou à mulher. Se a mulher é capaz de fazer grandes coisas em matéria de medicina, de arte ou música, por que não as faria também em ginástica ou no manejo das armas? Por que não poderiam exercer um cargo político, uma função pública?
Essas indagações inquietaram a consciência das pessoas daquela época e permaneceram por muito tempo fazendo as suas cabeças. Percorreram séculos, atravessaram fronteiras e até bem pouco tempo perturbavam a mente de muitas pessoas que não se conformavam com essa situação.
A deliberada obscuridade em que viveu a mulher durante séculos a fez subalterna ao homem em determinados períodos da história. Faltou a ela, durante muito tempo, o sentimento pessoal e a vontade própria para intervir na sua realidade. Mas, à medida que a sociedade se desenvolveu e houve a necessidade de mais cabeças e braços para executarem determinadas tarefas, a mulher, aos poucos, saiu do seu ostracismo e despontou para o mundo do trabalho, fora do lar, como uma alternativa viável para as grandes demandas nas fábricas, indústrias têxteis, agricultura... Isso não aconteceu sem luta e muita determinação, porque o cotidiano da mulher foi sempre marcado por um paradigma machista, presente ainda nos séculos XIX, XX e XXI.
A luta pela libertação do sexo feminino só tomou forma organizada, coletiva e política nos movimentos feministas que surgiram no século XIX.
Na sociedade de hoje ainda é muito marcante o papel da mulher no mundo do trabalho com visível configuração social atrelada à questão de gênero. As mudanças que continuaram acontecendo a partir do século XX nas relações profissionais com os homens que sempre quiseram gerir suas vidas serviram para repensar direitos e deveres nas relações afetivas e familiares. E a mulher mais livre nessas relações seguiu em frente e despontou para o mundo da educação, das artes e da política. Foi uma caminhada difícil, árdua, mas vitoriosa, por isso digna de se comentar.
Hoje, em todos os segmentos sociais encontra-se a mulher: em cargos públicos com desempenho de funções importantes, nas empresas públicas e privadas. Pode-se afirmar que 70% de novas vagas que surgem no mercado de trabalho aqui no Brasil são ocupadas por mulheres. A maioria tem escolaridade média superior à dos homens. Em quase todas as atividades profissionais baseadas no conhecimento, a mulher aparece subindo mais rápido: costuma ser promovida três anos antes que o homem, graças a sua determinação e senso crítico, aliado à sensibilidade feminina que lhe ajuda a vencer preconceitos, a transpor barreiras... Diz-se que, em cada mulher, há o rosto materno de Deus! Daí seu jeito amoroso, sensível para aprofundar na alma humana e procurar entendê-la.
Nas últimas décadas, a mulher conquistou novos espaços, rompeu paradigmas, quebrou as regras da hierarquização, inverteu papéis estabelecidos pela cultura patriarcal. E foi assim que, numa escala de progressão, alçou vôos mais altos nas várias esferas do governo e adentrou o mundo da política, sem perder sua graça e feminilidade, sentando ao lado do homem para resolver os grandes problemas que afligem a sociedade. Vê-se hoje a mulher em altos postos dos Poderes Judiciário, Legislativo e Executivo, tomando decisões, caminhando “pari passu” com o sexo oposto.
Aqui no Brasil, assistimos a garra, a luta de uma mulher que se fez presidente do país, escrevendo com sua vitória mais uma página da história política da nação, mostrando ao mundo, como ela mesma disse que a “mulher pode”. E pode tanto que, após séculos, décadas, chamada de “sexo frágil”, a mulher não recuou. Lutou contra a discriminação de gênero, de raça, para ter um tratamento igual, para desfazer mitos sobre sua fragilidade, para afirmar sua identidade de mulher diante de todos.
Além dessa garra de procurar desnudar-se de temor diante dos preconceitos da sociedade, a mulher busca um sentido na vida. É um casamento bem sucedido, uma maternidade planejada e responsável, um trabalho que lhe dê segurança e prazer. É dessa forma que ela ensina ao mundo que vale a pena todos os desafios na busca da felicidade. É a sociedade que se convencionou chamar de pós-moderna que exige isso: liberdade, compromisso, identidade, felicidade...
Mas por que tanta autonomia nos tempos atuais? É que a mulher quer ser livre para pensar, agir, contribuir para a construção de uma sociedade melhor. Ela quer ser feliz e sentir-se feliz é uma demanda recorrente no discurso de toda mulher, na contemporaneidade. Ser feliz no trabalho, ser feliz ao cuidar dos filhos e do lar, é uma questão de fé e amor. E a mulher soube encarar todas essas questões com relativa facilidade, porque aprendeu ao longo da vida que nada é estável, que o mundo gira e que tudo evolui numa velocidade que assusta. Chegou, pois, a uma consciência social ímpar, colocando-se como agente transformadora da sociedade. Entende que a grande questão para ela é balancear vida afetiva e carreira.
O mundo mostrou à mulher a sua importância e a possibilidade de externar seus sentimentos e suas emoções, ao lado de sua criatividade e inteligência. E, nessa relação com o mundo, ela ganhou espaço e confiabilidade. Mas tudo isso foi o fim da sua submissão? Essa é uma reflexão que se faz e que cada mulher faz a si mesma, nesses tempos de mudanças...
Mena Azevedo