Delírios Tipicamente Norte-Americanos III

COMO CAVAR OURO SEM USAR PICARETAS OU PÁS

Crimson Joe conhecia certo tipo no Alabama, que como ventríloquo fizera muito sucesso na Rússia dos czares. Mas fora deportado por influenciar a política local, e agora vivia em uma fazenda de coelhos, negociando os animais com as fábricas de enlatados da região. Seu nome: Rasputin.

“Vamos pegar o Ras, Clemens, pois ele é uma peça fundamental no plano. Não gosto muito dele, mas teremos de engoli-lo por hora.”

“Você é quem sabe, Joe. Farei de tudo para suportá-lo.”

“É um sujeito metido a besta, que aprendeu hipnotismo e usa seus poderes para conseguir tudo que deseja. Tome muito cuidado com seus olhos.”

“Tomarei, Joe. Deixe comigo.”

Rasputin estava na varanda de sua casa esfolando coelhos quando chegaram.

“Joe, que surpresa! A que devo a honra?”

“Estamos com pressa, Ras. Precisamos invadir o Forte Knox ainda esta tarde. Poderia nos ajudar?”

“Mas é claro! Esqueceu-se de que te devo uma? Jamais sairia daquele enrosco em Nova Orleans se não fosse por você. Farei qualquer coisa que pedir.”

“Certo. Então, entre na limousine.”

Rasputin entrou. Era um sujeito taciturno e seus olhos eram espiralados como alvos de artilharia. Olhou para Clemens, que imediatamente desviou o olhar.

“Que há com seu amigo, Joe?”

“Está com medo. Falei a respeito de sua capacidade para ele. Clemens, sabia que Ras hipnotizou um banqueiro em Houston, certa vez? O velho entregou-lhe a única nota de um milhão que possuía no banco.”

“E o que fez com ela?”

“Não consegui trocar em lugar nenhum, então resolvi dá-la a um mendigo cego que encontrei pela rua. Disse-lhe que era de um dólar.”

“E o que ele fez com ela?”

“Não sei. Mas não creio que a tenha gasto com algo sem álcool.”

Todos riram, e o veículo prosseguiu até Dallas. Chegando lá, Joe parou na porta de uma tabacaria. Apontou para fora, na direção de uma escultura.

“Lá está o nosso outro homem.”

“Quem?”

“Aquele, vestido de índio. É o Sam.”

“Nossa, Joe! Nem o reconheci!”

“É que ele está trabalhando disfarçado.”

Descendo da limousine, Joe caminha até onde está o Tio Sam.

“Sam, meu velho! Como vai essa força?”

(Silêncio.)

“Ei, Sam, estávamos precisando de você para um trabalho. Poderia nos dar uma mão? Os ganhos compensam os riscos.”

(Mais silêncio.)

“Devo interpretar como um sim? Ah, mas é claro que é um movimento afirmativo este seu balanço de queixo!”

(Silêncio e imobilidade.)

“Se estamos todos de acordo, vamos embora.”

Joe pega o Tio Sam pela cintura, colocando-o sobre o ombro. O proprietário da tabacaria pede ao filho que disque 911, saindo da loja com sua Winchester.

“Onde vai com meu índio, seu filho da mãe?”

Joe volta-se para o homem.

“Não é um índio. É o meu tio Sam.”

“Não me importa se é seu tio ou seu namorado. É meu. Coloque-o de volta.”

“Não. Vou levá-lo comigo.”

“Você é quem sabe.”

O homem aponta a espingarda para o peito de Joe. Rasputin desce da limousine, caminhando tranqüilamente até o homem que segura a arma.

“Mas quem é esse maluco?”

“Calma, meu bom homem. Não quer mesmo fazer isso, quer?”

“Não... Pode levar o índio, rapaz. Apenas pague pelos charutos.”

Joe paga o homem com um ingresso usado do Grateful Dead. O homem agradece mil vezes, e Joe acomoda o Tio Sam no banco de trás, junto de Rasputin, e eles partem em busca da rodovia.

“Não olhe muito nos olhos de Ras, Sam. E a propósito, Ras, obrigado pela ajuda lá atrás. Teria morrido com um tiro no peito se não fosse você.”

“Disponha, Joe. E então, Sam, que tem feito da vida?”

(Silêncio.)

“Você não é de falar muito, pelo que estou vendo.”

Continuaram na estrada, tendo antes passado em uma loja de artigos esportivos na Louisiana. Compraram um par de patins para o Tio Sam e uma luva de baseball para Clemens, que armou um tremendo teatro de manhas para obte-la.

“Ah, Joe, me compra aquela luva! Compra a luva, vai! Compra!”

Foram adiante, e próximo do anoitecer chegaram ao Forte Knox. Em uma curva, atrás de uns arbustos, pararam a limousine e desceram. Joe expôs seu plano.

“Vamos fazer o seguinte: Sam calçará os patins, pois não gosta muito de andar. Como também não é de falar, Ras usará seu talento de ventríloquo para convencer os guardas da portaria de que é o Sam quem fala. Tudo que precisará dizer está neste papel, Ras. Clemens e eu, aproveitando a momentânea ilusão causada por Sam e Ras, entraremos no perímetro do forte, encheremos os bolsos com barras de ouro e sairemos antes que os guardas possam perceber a jogada. Entendeu, Clemens?”

“Sim, Joe. Entendi tudinho.”

“Ras?”

“Claro! O plano é uma beleza!”

“Sam?”

(Silêncio.)

“Ótimo. Se está tudo acertado, podemos começar.”

Empurraram o Tio Sam sobre os patins até o portão. Os guardas viram-no.

“Alto lá! Quem é?”

Do meio do mato, Rasputin leu o papel, projetando sua voz até Sam:

“I want you for U. S. Army.”

Os guardas, percebendo de quem se tratava, largaram de seu posto e foram atrás. Clemens e Joe fizeram conforme o planejado, e logo todos saíam dali, tendo conseguido quase dez quilos de ouro. Clemens brincava com a luva espalmando uma barra amarela que lançava para o ar.

“Que bom que tudo deu certo, Joe! E agora, que faremos?”

“Antes de qualquer coisa, vamos tomar um trago.”

Pararam à margem da estrada. Joe sacou uma garrafa de Jack Daniels, entregando-a para Rasputin, que abriu e tomou um gole. Então começou a tremer, pondo as mãos na garganta e estrebuchando no chão.

“Maldito Joe, quis me envenenar! Mas não adianta, já tentaram isso!”

“Ah é? Pois então tome!”

E Joe moeu a cabeça de Rasputin com um taco de baseball, que havia comprado em segredo na Louisiana. Mas não adiantou.

“Já tentaram isso também, seu idiota! Não assistiu Die Hard? Pois foi inspirado em mim!”

“Clemens, pegue aquele galão de ácido que compramos para queimar arquivos. Quero ver se ele é bom mesmo.”

Clemens trouxe o ácido, que Joe derramou inteiro sobre o corpo de Rasputin.

“AH! AAAH!! AAAAAH!!!”

“Derreta, seu russo dos infernos! Clemens, acho que agora nos livramos dele.”

“Sim, Joe, você é demais! Mas o que faremos com Sam?”

“Sam é legal, Clemens. Ele vai nos ajudar na segunda parte do plano.”

“Que plano é esse, Joe?”

“Ora, o que você acha? Nós vamos dominar o mundo!”

Seguiram em frente. No caminho, Clemens explicava para o Tio Sam como fazer um bom arremesso. Ouvia tudo que Clemens dizia, parecendo muito interessado.

COMENTÁRIOS NECESSÁRIOS OU DESNECESSÁRIOS #3

POR ONDE É QUE TEM VOADO A ÁGUIA AMERICANA?

Os curiosos relacionamentos do animal mais famoso da História Contemporânea

A Águia Americana, que esteve um tempo desaparecida de nossas páginas, passou por maus bocados. Na Califórnia um grupo de maconheiros pensou que a ave fosse um frango assado, e como estivessem famintos ela teve de decolar para salvar a pele. Em Idaho todos os fazendeiros quakers do Estado reuniram-se em assembléia e decidiram que o pássaro era uma ameaça para a moral e os bons costumes, pois passeava nu pelos campos, sem demonstrar qualquer pudor religioso. Finalmente, em Denver envolveu-se com uma guria que apreciou seu físico esquálido e depilado. Mas o ex-namorado da garota fez-lhe um desafio de vida ou morte, e a Águia Americana tomou um Greyhound e voltou para a Flórida, onde um crocodilo quase arrancou uma lasca de seu traseiro magro. Vagando pelos pântanos, encontrou uma criatura atormentada que era composta de lodo e espírito, uma espécie de coisa lamacenta e sentimental. E a Águia Americana apaixonou-se pelo negócio, tendo vivido um tórrido romance em meio aos alligators. Mas a criatura acabou se enchendo da Águia Americana, que tendo recuperado as penas nesse meio tempo partiu para outras paragens. E é em Cabo Canaveral que nós iremos reencontrá-la, paquerando um ônibus espacial sem a menor consideração pelos códigos de boa conduta aérea. Que reservará o futuro para nossa querida ave de rapina? Somente os ventos cósmicos poderão nos dizer.

Damnus Vobiscum
Enviado por Damnus Vobiscum em 20/05/2012
Reeditado em 23/05/2012
Código do texto: T3677450
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