A LUTA PELA POESIA

Na verdade, a Poesia é o Belo, a beleza de todo o sempre, mas a cada lapso de tempo, no decorrer dos séculos, a Beleza tem uma cara nova, não é um rosto imutável.

A Beleza, no canto poético dos gregos, tem a iluminura das máscaras da persona alçada ao Partenon, a grandeza dos grandes templos e a ilusão de um mundo inesgotável.

Nos haicais de Bashô, ela tem o toque das estações do ano, da visão lírica na observação do Monte Fuji, o gelo que recobre o seu cimo, escorrendo sobre as encostas permanentemente. Neles, a transcendência lírica funde a regra da leveza. São originais para o seu tempo e para o tipo de pensamento do mundo oriental.

Em Shakespeare, é a de uma Grã-Bretanha que discute a realeza, relações entre ricos e pobres, os seus amores, e a autenticidade do homem frente a si próprio e ao mundo que o rodeia.

O trovador medieval acostou ao verso o alaúde, o primitivo violão, e o plebeu, que já cantava suas agruras, deu-se ao desplante de cantar as intrigas amorosas da corte.

Luiz Vaz de Camões, o português do mundo, arrosta o seu Portugal para a história e registra o antes e o depois.

Com o iluminismo francês e suas seqüelas intelectuais, ocorre a democratização do pensamento e graças ao conseqüente registro dele em letra de imprensa, emoção e razão alçaram suas asas no soneto clássico.

Depois, é o que sabemos, tudo está mais próximo e registrado nos alfarrábios.

Quando Fernando Pessoa, outro português do Universo, no início do século XX, discute a si mesmo e a criatura, cria seus heterônimos, racionaliza e os destrói pela emoção contida no Bem e no Mal, é o mesmo homem e suas circunstâncias. Enfim, a animação humana do drama de viver.

Nada mais do que os gregos registraram para a vida e os apóstolos de Cristo fizeram para a escritura nas parábolas bíblicas.

É o mesmo homem, na sua vertente do pensar, amealhando e tentando reter pelos versos, pelas expressões carregadas de amor e sentimento, tecendo a teia com o fio de linha entre o nascer e o morrer.

É assim que vejo o gênero literário Poesia, sua materialidade no poema, que pode ser apenas o dito verso, se for obra de poeta-menor, ou pejado de Poesia (com “P” maiúsculo!), acaso bafejado pela intensidade da criação de um Poeta. Nesta concepção crítica, poderemos ter apenas o verso, que é o comum, o usual, ou, por vezes, o verso que contenha poesia!

A Poesia nunca é coisa simples, porque o Poeta não é um simples homem. Ao contrário, é uma das criaturas mais complexas da face da terra!

E todo o ser complexo não vai produzir coisas triviais, singelas, porque isto não é da natureza do homem condenado a pensar, que é o verdadeiro poeta.

No entanto, este veraz poeta pode vir a construir o seu pensamento complexo com palavras simples, quase usuais, mas nunca corriqueiras, porque em seu universo não há coisas comuns.

Uma mesa nunca será somente mesa, um cão nunca será o cão que late somente por ladrar. Este latir terá mensagem. E a mesa será sempre crística, humana, onde a fome será saciada pela multiplicação dos pães e do vinho.

Assim, pela metáfora, a palavra estará sempre trajada no seu vestido de festa!

O homem comum nunca será Poeta, porque ele é o do lugar comum da vida e este não faz Poesia. Pode, no máximo, fazer da linguagem poética o seu confessionário, que nunca chega a ser Poesia, porque não pertence à Humanidade, não chega a ter a visão do Homem, da criatura humana e de sua trilha no decorrer dos tempos.

O depoimento pessoal, a que chamo confessionário íntimo é, sim, o viés, um pequeno detalhe do universo de seu autor, e só a ele interessa!

Mas, por ser humano, ele precisa de aplausos e loas!

E quantas vezes este viés poético, sensível, pleno de doçura, é visto como fosse Poesia pelos que anseiam pelo Belo...

– Do livro DICAS SOBRE POESIA, 2005.

http://www.recantodasletras.com.br/ensaios/37688