A independência do Brasil e o surgimento da ideia de raça

Por. Alessandro Barreta Garcia

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Apesar de veladas, eram muito comuns ideias de manifestações liberais nas mentes dos habitantes da colônia, fato que se acentuou após 1776 com a independência dos Estados Unidos, acompanhada pela revolução industrial inglesa e com a luta contra o tráfico de escravos, resultando numa série de revoltas na colônia portuguesa. Com a inconfidência mineira em 1789, a revolta dos alfaiates em salvador em 1798 e a revolução pernambucana em 1817, além de outros movimentos, o cenário em terras portuguesas era a cada dia mais problemático.

Conforme as revoltas anteriormente citadas, como a inconfidência mineira, a independência do Brasil era inevitável. Com apoio das elites regionais e a independência instaurada, D. Pedro I se fortaleceu, e contrário aos seus próprios seguidores instituiu o poder semelhante ao absolutista (o poder moderador). Na prática estava acima dos poderes; legislativo, executivo e judiciário.

Com essa situação, D. Pedro I só angariou oposicionistas e separatistas. As rebeliões levaram a falência do banco do Brasil já fragilizado pelo processo de independência. Forçado a renunciar D. Pedro I abdica o trono em 1831 (PRIORE e VENANCIO, 2010).

Para Paim (2000):

O Brasil viu-se então ameaçado de subdividir-se. Sucessivas e prolongadas insurreições afetavam diversas partes do território. Entre os alvitres, experimentou-se uma espécie de republicanismo, através da eleição direta do Regente, sem que os ânimos arrefecessem (PAIM, 2000, p. 110).

No período de regência é possível perceber um maior empenho dos movimentos separatistas. O descontentamento era geral como observado pelos farroupilhas da época. Sob o ponto de vista da identidade nacional Priore e Venancio (2010) apontam que o período do império é bem fértil. O brasileiro é formado por três “raças”: branca, negra e indígena. Toda essa discussão servia também para conter os pensamentos separatistas o que naturalmente fortalecia o espírito de unidade nacional.

Para Priore e Venancio (2010) é por influência do conde Cobineau ou Gobineau que o termo raça atinge seu nível mais aparente, ou seja, somente no século XIX que se pode discutir racismo no Brasil. Conforme esses autores, medir crânios, avaliar cor de pele e definir as raças era a nova forma de separar as pessoas já que o tráfico de escravos tinha sido interrompido em 1850. A lei do ventre livre em 1871 e a abolição dos escravos em 1888 garantia uma nova ordem de direitos iguais entre os homens. Nesse sentido, o conceito de raças serviu para legitimar a desigualdade existente após a abolição da escravidão.

É importante ressaltar que conforme Santos, Palomares, Normando et al (2010), a classificação de raça foi utilizada pela primeira vez por François Bernier em 1684, sendo que o criador da taxionomia dessas classificações foi Carolus Linnaeus (1758) dividindo o homo sapiens em: Americano, Europeu, Asiático e Africano. Blumenbach reconheceria posteriormente quatro variantes: 1. Europeu, Asiático do Leste e parte da America do Norte, 2. Autralianos, 3. Africano e 4. Restante do novo mundo.

Hoje em dia segundo Santos, Palomares, Normando et al (2010) existe um consenso entre os antropólogos que raças não existem, pois, 0.005% são as diferenças entre um negro e um nórdico. Ademais, cor de pele, cabelos, e formato do nariz são determinadas por um número muito insignificante de genes.

Ao mesmo tempo em que se proliferava um pensamento em defesa do abolicionismo, de outro lado formava-se no Brasil um espírito racista de base essencialmente biológica. Ademais, para aumentar ainda mais a problemática, a opção da Corte frente a possível abolição era trazer imigrantes europeus.

A discussão sobre raça e racismo no Brasil parece alheia às fontes que a tratam de forma mais abrangente e imparcial. Boa parte do cidadão comum não sabe que não é possível discutir racismo antes do período imperial e que o tráfico de escravos para o Brasil não foi uma invenção dos europeus (RISÉRIO, 2004; GIORDANI, 2010; PRIORE e VENANCIO, 2010).

Conforme Carvalho: “A escravidão era norma geral na África muito antes da chegada deles, e hoje sabe-se que a maior parte dos escravos capturados eram vendidos no mercado interno, só uma parcela menor sendo levada ao exterior” (CARVALHO, 2009). Muita gente se beneficiou com o tráfico transatlântico de escravos africanos como os proprietários de terras nas colônias bem como os proprietários de terras na África. Este processo tornou muitos africanos e europeus milionários (DÖPCKE, 2001).

Para simples reprodução, as mulheres africanas eram escravizadas e vendidas para o mundo árabe e quanto mais bonitas as escravas, mais caras elas se tornavam. Como as novas gerações provenientes da reprodução não gerariam novos escravos (a segunda geração seria livre), novas remessas sempre eram importantes, o que de fato alimentaria o mercado interno (SOUZA, 2003). Nesse caso, os árabes incentivaram uma grandiosa comercialização de escravos dentro da África.

No Brasil tal problema de interpretação histórica parece causar uma confusão, e muitas vezes algumas interpretações históricas parciais são utilizadas como pretexto para a legitimação de direitos. Na realidade, as cotas raciais ou mesmo sociais apenas servem como tapa buraco ou como medida paliativa. O que importaria na verdade seria a melhora substancial da qualidade do ensino como um todo, assim como reza a Constituição Federal do Brasil.

Enquanto isso se presencia e contenta-se com uma das piores educações básicas do mundo, bem como um ensino superior que não coloca sua melhor universidade nem entre as principais e melhores do mundo. É muito deprimente discutir por tão pouco, quando na realidade não nos damos conta que é o todo que precisa ser remediado e não as partes.

Referências

CARVALHO, O. A África às avessas. Diário do Comércio, 14 de setembro de 2009 http://www.olavodecarvalho.org/semana/090914dc.html

DÖPCKE, W. O Ocidente deveria indenizar as vítimas do tráfico transatlântico de escravos? Reflexões sobre a Conferência das Nações Unidas contra o Racismo, a Intolerância Racial, a Xenofobia e a Intolerância Correlata. Rev. Bras. Polít. Int. v. 44, n.2, p. 26-45, 2001.

GIORDANI, M, C. História da Antiguidade oriental. 14ª edição Petrópolis, RJ: Vozes, 2008.

PAIM. A. Momentos decisivos da História do Brasil. São Paulo, Martins Fontes, 2000a, 319 p.

PRIORE, M, VENANCIO, R. Uma breve história do Brasil. São Paulo: Editora Palneta do Brasil, 2010.

RISÉRIO, A. Escravos de escravos. Revista Nossa História. Biblioteca Nacional. Ano, 1, nº 4. 2004

SANTOS, D. J. S, PALOMARES, N. B, NORMANDO, D, et al. Raça versus etnia: diferenciar para melhor aplicar. Dental Press J Orthod, v. 15, n. 3, p. 121-124, 2010.

SOUZA, T. T. B. A. Escravidão interna na África, antes do tráfico negreiro. Vértices, Ano 5. n. 2 mai / ago, 2003.

Publicado pelo MAC

http://aliancacidada.wordpress.com/2012/09/03/a-independencia-do-brasil-e-o-surgimento-da-ideia-de-raca/

Alessandro Barreta Garcia
Enviado por Alessandro Barreta Garcia em 07/09/2012
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