S.O.S PATRIMÔNIO HISTÓRICO DE TORRES

Tempos turbulentos, dias agitados, tragédia com o avião do time da Chapecoense, aprovação da PEC 55 e o congelamento de investimentos nos setores públicos por duas décadas ritmada pela repressão desvairada aos manifestantes e em Torres mais um capítulo de uma novela que se repete: a destruição do patrimônio histórico. Cai avião, cai o povo e cai a casa velha testemunha da história e da memória! Velhas práticas para justificar os danos para a população com pretexto de renovação. O Brasil é um dos países que tem ampla tutela do patrimônio cultural, porém negligenciada pelos poderes públicos e destruída por interesses privados. A preservação do Patrimônio Cultural é um direito constitucional e transcende a dualidade público x privado pois confere identidade as cidades. A cidade é um artefato vivo e dinâmico onde o tempo deixa suas marcas e o navegar entre o passado e presente. Centros históricos e casas antigas bem preservadas e respeitado na sua integralidade com tutela e gestão dos seus bens fornecem qualidade de vida aos habitantes e tornam-se verdadeiros tesouros que atraem milhares de visitantes e turistas.

Quando viajamos o que buscar em primeiro lugar? A história daquele lugar que o faz ser especial dentre tantos outros, sua arquitetura e suas antigas edificações, monumentos, museus, modos de ser e fazer, expressões e manifestações culturais. Verdadeiras cápsulas de diversidades de compreensão e visões de mundo, coisas que só vivenciamos no encontro histórico perpassado pela manifestação e apropriação cultural. Do Pelourinho na Bahia ao centro histórico de Laguna quanto aprendizado! A exuberante Muralha da China às Grandes Pirâmides do Egito, nos marca profundamente uma visita ao Museu do Louvre ou conhecer as belezas naturais e as riquezas históricas de Torres! São atrativos para o desenvolvimento do Turismo Cultural e nosso município tem tesouros escondidos e muitos destruídos. No caso dos chalés da Prainha que remontam a ressignificação balnear do território são verdadeiras relíquias arquitetônicas das origens do veraneio e do turismo no Rio Grande do Sul. São imóveis encantadores pelos seus jardins, sua localização e ambiência como todos os aspectos paisagísticos e simbólicos. O princípio da preservação do entorno é tão importante quanto à conservação material do patrimônio edificado. Nesse momento estão destruindo uma edificação da década de 1920: conhecido popularmente como o charmoso e encantador Chalé dos Gerdau. O processo de demolição do Chalé dos Gerdau está em andamento e lembra-me da fatídica e desastrosa destruição do Chalé dos Chaves Barcellos próximo da Praia Grande. Uma comoção da sociedade torrense que ao testemunhar tal destruição soube que enterrava a sua própria história, sua razão de existir e ser. Nessas terras abençoadas entre as Torres, jaz muitos casarios centenários que só servem de adereço a triste iconografia histórica. Assim, percebemos que naturalizamos a perda do patrimônio com passividade e esquecemos que temos vasto aparato legislativo que nos impele a pensar que a cidade é de todos e não de apenas uma parcela. Não podemos deixar isso se repetir com outros remanescentes históricos de nossa cidade. A demolição do Chalé dos Gerdau está irregular pois não houve consulta aos órgãos competentes e fiscalizadores como o Conselho do Patrimônio Histórico, Artístico e Cultural (COMPHAC/TORRES) e o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado (IPHAE) onde o poder executivo estabelece a realocação do bem para um terreno da prefeitura por um Decreto 219/16, justificando a já existente “Casa da Terra” (uma edificação centenária de “pedra e cal” na Rua Júlio de Castilhos próximo da Escola Sagrado Coração e por isso casa da “terra” e não de madeira como o chalé) como um espaço cultural que seria uma imposição dos proprietários na tratativa. Sob responsabilidade do poder público temos espaços culturais, museus e edificações históricas que estão abandonados e querem mais um espaço para gerir? Não damos conta do que temos e queremos mais (e podemos questionar: porque, para quê e para quem?). Ainda temos o subsídio que o imóvel histórico se encontra na delimitação do centro histórico e a poligonal de proteção do nosso único bem tombado em 1983, a Igreja São Domingos. Está comprovado que é uma ação arbitrária e por isso os órgãos competentes não foram acionados. Durante as últimas décadas já foram destruídos os casarios do século XIX que compunham a gênese da Vila de Torres e na atualidade as edificações dos primórdios e meados do século XX sucumbem de maneira criminosa.

Quem não cuida do passado não pode pensar no futuro. Não vou desprezar os idosos de minha família porque eles são minha ancestralidade, um poço de sabedoria e a memória que dá significado a quem sou. Não rasgo o álbum de família, pelo contrário, guardo como um tesouro, pois ali está a história de minha vida. Esse texto é um pedido de socorro, um apelo em defesa do que nós temos de melhor: o Patrimônio Histórico e Cultural, a alma de um povo!

Publicado em Jornal Litoral Norte RS e Jornal A Folha/Torres.

Leonardo Gedeon
Enviado por Leonardo Gedeon em 01/12/2016
Reeditado em 01/12/2016
Código do texto: T5840776
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2016. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.