Trabalhar no sábado

Estive assistindo a um programa de televisão adventista, um interessante programa em que um pastor promovia uma espécie de debate com pessoas comuns a respeito dos ensinamentos daquela religião. É uma iniciativa rara, porque as pessoas podem apresentar questionamentos ao pastor, até divergindo da opinião dele, e tudo isso é apresentado ao grande público, inclusive ao público que não é adventista - como é o meu caso.

No programa a que assisti, o tema era justamente um dos que mais distingue os adventistas das outras igrejas evangélicas, isto é, o “guardar o sábado”. De início, pensei comigo mesmo que era estranho que o tema estivesse sendo discutido em um programa apresentada no sábado, o que fatalmente significa que havia algumas pessoas trabalhando na emissora para garantir a transmissão.

Apareceu justamente esse questionamento por parte de uma pessoa, e o pastor deu uma explicação que, em resumo, queria dizer que as poucas pessoas que ali trabalhavam no sábado desempenhavam uma função sacerdotal, como a que ele próprio desempenhava ao pregar a palavra de Jesus no sábado, de tal maneira que aquilo não poderia ser considerado como trabalho e, portanto, tampouco como pecado. Bem, não é uma explicação perfeita, mas pode ser aceitável.

O problema veio depois, quando falou sobre as pessoas que precisam pegar ônibus no sábado para ir à igreja (ou seja, aquelas que, mesmo não trabalhando, usam o trabalho dos outros no sábado). Para justificar essa prática o pastor usou um argumento que, apesar da minha boa vontade, não me pareceu outra coisa senão um cinismo dos mais deslavados.

Disse ele que o ônibus seguiria o seu caminho e continuaria trabalhando no sábado mesmo que o crente não fizesse uso dele, e que por isso também não haveria mal em aproveitar a oportunidade que lhe aparecia de ir à igreja. Ora, considerando a maneira como os adventistas encaram a questão do sábado, o que esse pastor disse foi mais ou menos o seguinte: “Não há problema em se servir do pecado dos outros desde que tenhamos um bom motivo”. Ou então: “Já que eles são ímpios mesmo, tanto faz se a gente usar o serviço deles a nosso favor ou não”.

É um argumento tão desaforado que, em seguida, outra pessoa perguntou ao pastor se não era melhor que, no fim das contas, não se usasse ônibus nenhum no sábado, e que se desse um outro jeito de ir à igreja. O pastor negou, na cabeça dele o adventista que anda de ônibus no sábado não está contribuindo para a manutenção do serviço de ônibus no sábado.

A ordem é aproveitar o serviço dos ímpios, sem nem cogitar que se está levando motorista e cobrador para longe de Deus – para o inferno.

Frederico Milkau
Enviado por Frederico Milkau em 03/03/2018
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