Educação e independência

Randolph Bourne dedica algumas páginas a prevenir a juventude a fugir dos formatos pré-concebidos nos quais o “estabelecimento” ou “establisment”espera moldar todos os cidadãos. E quem é o “establisment”? Família, mundo dos negócios, igrejas, sociedades, estado, governo. O jovem, assinala Bourne, é incentivado a imitar homens que por sua vez foram vítimas das influências que ele deveria esquivar, e doutrinas e hábitos lhe são impostos que ele deveria incessantemente questionar, e não adotar até que esteja seguro de que lhe são convenientes. Assim, a imposição sistemática dessas doutrinas e hábitos ajudam a perpetuar velhos erros e manter vivos costumes que estão morrendo, conclui ele.

Entendo que entre essas doutrinas perpetuadas pelas sociedades impõem velhos modos de pensamento e comportamento. O Frei norte-americano Murray Bodo diz que ““… Muitos sentimentos de culpa derivam de tentar fazer o que é contrário ao nosso próprio sentimento interior, nosso verdadeiro eu” e que “… a direção geral do nosso fazer deveria fluir de quem somos e não do que os outros pensam que deveríamos estar fazendo”.

Segundo Heidegger, “vivemos ao amparo dos papéis que desempenhamos, do que se espera que façamos, digamos, só excepcionalmente somos autênticos”. E Castoriadis: ... a sociedade deve educar os indivíduos para serem autônomos, à refletir por eles mesmos, à aceitar de modo crítico o que lhes dizem seus pais, padres e políticos”. Outro aspecto interessante é a angústia, sartriana, que causa essa permanente necessidade de escolher para compor a essência de sua existência. O que os outros dizem ou pensam acaba sendo o caminho mais seguro, que minimiza a angùstia. Quando seguimos a a vontade dos parentes, amigos, ou mesmo, da opinião pública, evitamos a angústia da escolha, mas renunciamos à nossa liberdade. A responsabilidade da escolha passa a ser dos outros e não mais nossa.

Na visão de Nietzsche, tratando de modo similar a questão " ... é mais cansativo pensar por si próprio do que adotar opiniões prontas."

Segundo Sartre, "em nossas relações com outros seres humanos, o que realmente somos é tudo o que conta, mas é precisamente aqui que mais frequentemente nos traimos ao tentar ser o que a outra pessoa espera que sejamos." Seria interessante desde cedo advertir os adolescentes sobre essa questão, para que encarem com naturalidade o que são e as escolhas que terão diante de si, e decidam com toda independência. Na realidade, os jovens pulam de cabeça nesse processo sem nenhum pré-aviso.

De fato, o jovem enfrenta escolhas como namorar Lidia ou Vera, estudar Direito ou Economia, ou fazer uma carreira militar, sem ter consciência de que está experimentando uma angústia provocada pela própria liberdade de escolha e que está vivendo um drama existencial do qual não há fuga possível.

A agonia da indecisao, diria Kierkgaard. Em artigo na revista "Philosophy Now", Lucian Lupescu destaca a busca pela "verdade subjetiva", que se compõe de nosso compromisso com os valores nos quais acreditamos. Uma verdade objetiva não existiria, em consequência. A busca da nossa verdade, segundo, Kierkegaard passa pelo conhecimento próprio: "conheça você mesmo", o que, segundo Lupesco, significa " seja independente". Kierkegaard, antes de Sartre, nos estimula a assumir a responsabilidade pelas nossas vidas por intermédio das escolhas que fazemos de modo independente. E essa escolha fazemos em compatibilidade com nossos valores. Assim desenhamos nossa vida, nosso mundo. Salvo, como disse John Lemon, quando " a vida é o que acontece com nós quando estamos ocupados fazendo outros planos".

Em resumo, segundo Lupescu, a filosofia não é uma diversão teórica, desenvolvida com jargão inatingível entre as paredes das faculdades, mas algo que tem muito a ver com a vida cotidiana,o nosso dia-a-dia, e a construção de uma existência com sentido.

Ugly
Enviado por Ugly em 08/08/2018
Reeditado em 07/10/2022
Código do texto: T6413175
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