Casa ou fortaleza?

Incomodam-me bastante as casas transformadas em grandes fortalezas, tão protegidas dos curiosos que só lhes faltam uma ponte levadiça e um lago com jacarés. Incomoda-me porque, além de achar esteticamente feia uma casa da qual não se vê absolutamente nada da rua, sei que essa busca por segurança, revelada no local de moradia, significa também o desmantelamento das relações cordiais.

De fato, o aparato de segurança que têm descaracterizado as casas não afasta só o ladrão, mas qualquer pessoa. Levamos a postura adotada em nossas casas para a vida, de modo que não confiamos em mais ninguém e, também por isso, apegamo-nos tanto à nossa família, único lugar onde podemos “baixar a guarda”.

Entretanto, somos cristãos, pessoas que, em tese, se querem mesmo seguir a mensagem do nazareno, precisam amar o próximo como a eles mesmos. Sendo assim, o muro que se ergue na frente da casa precisa abaixar em outro lugar que não seja apenas o seio da própria família – que, afinal, é bem fácil de amar.

Mas não me parece que essa tenha sido uma preocupação dos cristãos, que estão muito mais interessados é na punição daqueles que possam lhe causar algum tipo de dano. Parece cada vez mais obra da ficção personagens do quilate de um bispo de Digne, do Victor Hugo, um homem que não trancava a porta de casa, dizia que aquilo que o próximo faz é permitido por Deus e que, em vez de ladrões, devemos temer os preconceitos.

Não haverá, em todos esses 90% de cristãos de Brasil, praticamente ninguém – se é que, de fato, há alguém – que tema o encontro com o ladrão não por causa do mal que pode receber, mas porque não quer ser pedra de tropeço para o pecado de outro homem.

Tampouco abundam os que, como o monge Zóssima de Dostoievski, enxergam-se culpados de tudo e confessam que, se fossem eles próprios justos, talvez nem existisse um crime diante deles.

Estamos nos fechando, reduzindo e limitando o nosso amor. Uma casa fechada é causa e consequência de um coração fechado.

Frederico Milkau
Enviado por Frederico Milkau em 29/11/2018
Reeditado em 29/11/2018
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