MUITO ALÉM DE MIM

Dia 01.12.2018

Participei, pela primeira vez, de uma Obrigação para Iansã e Iemanjá.

Dormi muito tarde na véspera e acordei ainda com vontade de dormir.

Mas, o dever necessitava ser cumprido, e lá fui eu.

Sou uma idosinha muito da atrevida... até hoje me pergunto o que estou buscando num culto religioso repleto de pessoas adultas, jovens e crianças cheias de saúde e vigor. Sou uma senhorinha de 65 anos, de saúde precária, boa de me aquietar e sair de cena?!

Hoje, percebi o quanto envelheci nesses anos todos. O sol brilhou fortemente sobre o grupo de umbandistas, na beira do rio, cantando Hinos de Louvor e Agradecimento aos seus Deuses, a quem chamamos Orixás... cantando a plenos pulmões, repletos de uma FÉ Maiúscula. Mas a sede não tardou, o estômago e a garganta começaram reclamar.

O vento rareou e ficou abafado, dificultando meu respirar. Olhei o Sumo Sacerdote Umbandista, de pé, sob a inclemência daquele sol, sem nada para lhe cobrir a cabeça, nem uma folhinha de arvore. Recebendo, um após outro, aqueles filhos que a FÉ lhe confiou.

Voltei no tempo e me vi no Orfanato. Lá, tudo era feito num templo, ao abrigo do sol, da chuva e dos ventos mais fortes. Até na época de Via Sacra ou dos Santos Reis, o Sumo Sacerdote estava resguardado por um guarda-sol/chuva. Nós também. Levávamos animas com moringas cheias de água e canecas. Levávamos pães, queijos e muitas frutas.

Antes eu achava que seguir as duas procissões, subindo a Ladeira de São Gonçalo, até o Santo Cruzeiro, e depois descendo, era muito sacrifício... nesse momento, refaço esse ponto de vista, vendo e vivendo tudo o que vi e vivi hoje. Antes eu era uma criança, depois uma adolescente e bem depois uma jovem.

Hoje não. Hoje sou uma velha senhora... louca!

Onde foi que eu vi escrito que poderia participar desse ritual? Por qual razão quis participar? Sinceramente, não sei. Apenas segui meu coração. Nem lembrei que vez por outra, esse meu coração me prega alguma peça.

Dessa vez ele exagerou. Deixou-me em dívida com várias pessoas... e como se não bastasse, com os Deuses de um dos Meus Antepassados... o Negro Manoel Bezerra!

Às pessoas ainda posso dizer Gratidão: Babá Marco Antonio, Pai Pequeno Arnaldo. Ogãs Erick, Neto e Marlon. Gratidão ao Cleverton pela carona, pela gentileza da conversa... por tudo. Gratidão aos irmãos que nos ofereceram água, num momento tão crucial. Normalmente tomo, por dia, 2,5 a 3,0 litros de água. E, naquele momento, meu corpo inteiro parecia em chamas. Gratidão mais uma vez.

Gratidão ao Babá, não só por me permitir participar da obrigação, mas também pela lição que recebi, ao ser escolhida para oferecer uma parte da oferenda de Obaluaê (o milho que não estourou) a Nanã. Chorei muito pois entendi o que a Avó me disse, naquele momento, por conta de algo que senti e comentei no dia anterior, ao seu respeito e a respeito de Obaluaê. Gratidão por me acolher não só na aldeia, mas em sua morada, me oferecendo inclusive, sua própria cama, para que eu dormisse e descansasse da exaustão que me prostrava.

Gratidão ao Pai Pequeno, Arnaldo, pelo olhar de discreto cuidado e pelas informações preciosas. Sempre amarei esse Pai Menino que conheci em outro Espaço Sagrado - O Teatro. Sinto-me bem ao seu lado.

Gratidão a Minha Filha Grace e a Minha Neta Hannah, por me aceitarem e acompanharem meu engatinhar nesse espaço, tão tranquilo para vocês, mas tão além de mim!

Gratidão ao Emerson por nos acompanhar até a Aldeia, na véspera e ontem ao regressarmos.

Gratidão pelo acolhimento carinhoso de: Paula Guedes e Sua Filha Haline; Bia e sua Mãe Eliene; Cleo e Seu Filho Ronaldo; Cleilda, Jôse, Fernanda, Solemar, Katiane, Ana Paula, Wagner, Humberto, Valéria, Luana, Laura e as duas meninas que acabei de conhecer, motivo pelo qual não memorizei seus nomes.

Gratidão, mais uma vez pela água.

Aos Deuses Africanos, posso dizer o quê? Não sei. Gratidão é pouco... mas é só o que posso dizer. Não sei se poderei participar de outras obrigações desse porte, meu organismo pode não aguentar.

Desejo sorte e boa fortuna aos jovens e aos adultos jovens, que fazem parte dessa irmandade. É muito bom estar com vocês. Sinto apenas que nesse espaço, só posso ir até o Congá, nem mais nem menos, pelo menos por enquanto.

Creio que os Deuses Africanos não me pediriam algo além das minhas forças.

Axé.

Adda nari Sussuarana
Enviado por Adda nari Sussuarana em 04/12/2018
Código do texto: T6518453
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2018. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.