PADRE ANTÓNIO VIEIRA

Homenagem ao PADRE ANTÓNIO VIEIRA

HONRAR as grandes figuras da História que se opuseram à crueldade e à opressão existentes nas suas épocas, é um imperativo de consciência.

NA nossa actualidade, há um foco sobre a figura ímpar do Padre António Vieira, que viveu ao longo do século XVII, entre 1608 e 1697.

O Padre António Vieira é conhecido como defensor dos Índios do Brasil. Mas esse facto é actualmente referido por alto, como se tivesse sido coisa fácil...

Hoje em dia, devido ao fraco valor que o Ensino neoliberal dá ao estudo da História, desconhece-se em que moldes funcionaram as sociedades do Passado, sujeitas aos dois intransigentes Poderes Absolutos dos “antigos regimes”: o Poder Real, e o Poder da Inquisição.

Hoje em dia, é difícil fazer entender ao grande público por que razão certas figuras do Passado deixaram uma marca incontornável na História, pois os grandes obstáculos que lhes apresentava a sociedade da sua época já não são conhecidos, e acabamos por nos contentar com alguns lugares comuns sobre elas.

Hoje, proponho-me recordar o Padre António Vieira.

Porquê, o Padre António Vieira?

Na nossa actualidade, em que a QUESTÃO RACIAL está em grande foco nas sociedades ditas “ocidentais”, algumas vozes atentaram contra essa figura maior não só da nossa História, mas podemos mesmo dizer, da História em geral. O Padre António Vieira foi alguém que ousou afrontar os PODERES ABSOLUTOS da sua época, o século XVII, defendendo sectores da população inferiorizados pelos “conceitos” que sustentavam a rentabilidade dos processos produtivos de então.

O Padre António Vieira é dessas figuras incontornáveis que sempre merecerão o nosso respeito, pois denunciar – actualmente – a opressão, não é de modo algum problemático como o foi há séculos atrás, com a Inquisição e seus carrascos sempre em sádica gula e interesseiro alerta por mais vítimas.

Como referimos atrás, o Padre António Vieira nasceu no início do século XVII, em 1608.

Era ele muito criança, seus pais emigraram para o Brasil, então colónia do Reino de Portugal. Aí, com 6 anos de idade, ingressou no Colégio dos Jesuítas de Salvador, que tinha sido fundado cerca de 60 anos antes, pelo padre Manuel da Nóbrega.

Ainda apenas com 18 anos, reconhecendo-lhe o seu talento como escritor, foi encarregado de escrever, e traduzir para Latim, o relatório anual das actividades da Província da Companhia de Jesus, o relatório que seria enviado para Roma.

Igualmente muito jovem ainda, com apenas 27 anos, já os seus sermões se evidenciavam.

Ocorre em Lisboa, a Revolução de 1640. Ele é encarregado de vir à sede do Reino, apresentar ao rei, D. João IV, a fidelidade da colónia do Brasil. O rei ficou de tal modo bem impressionado pela sua vivacidade de espírito que, além de o nomear “pregador régio”, ainda o nomeou embaixador, para que junto das cortes europeias fosse defender a causa da independência de Portugal em relação ao reino de Espanha!

Os reis morrem, e outros se lhes seguem. Não foi sempre protegido pelos reis portugueses. No entanto, nunca desistiu de denunciar as cruéis injustiças da sua época – a crueldade para com os Escravos Africanos nos Engenhos de Açúcar, a sujeição contra os Índios, as arbitrárias perseguições aos Cristãos-Novos.

O Padre António Vieira usava o púlpito para defender as causas que abraçava. Ousava opor-se à Inquisição. O que finalmente lhe acarretou a prisão, entre 1665 e 1667 (entre os seus 57 e 59 anos), com os respectivos interrogatórios, sempre insidiosos, a ver se o apanhavam em “heresia” para poderem condená-lo e eliminá-lo.

Ficaram famosos os seus sermões.

Um dos seus sermões ainda hoje mais conhecidos, será o “Sermão de Santo António aos Peixes”, pregado em São Luís do Maranhão, no dia de Santo António de 1654. Como ele próprio diz: “Este sermão (que todo é alegórico) pregou o Autor três dias antes de se embarcar ocultamente para o Reino, a procurar o remédio da salvação dos Índios”. Ele propunha-se obter leis que protegessem os Índios da ganância dos colonos. Ele cita St. Agostinho: «Os homens com suas más e perversas cobiças, vêm a ser como os peixes, que se comem uns aos outros.»

No “Sermão da Sexagésima”, de 31 de Janeiro de 1655, ele pergunta-se como é que sendo a palavra de Deus tão eficaz e poderosa, é possível que dela se veja tão pouco fruto...

No "Sermão do Bom Ladrão” proferido nesse mesmo ano, tinha ele 47 anos, ele compara o pequeno ladrão que rouba para comer, ao grande ladrão que rouba impérios. Com esse sermão, ele pretendia mostrar, em Portugal, como funcionava a colónia do Brasil.

A grande luta do Padre António Vieira foi a favor da dignidade e liberdade dos Índios. No entanto, admitia a sua condição de escravos caso fossem prisioneiros de guerra.

Também defendeu os Cristãos-Novos, bom motor da economia e conhecedores dos negócios, mas arbitrariamente perseguidos e condenados aos autos-de-fé.

Ao contrário do que apressadamente se diz, o Padre António Vieira não se bateu contra o regime esclavagista. O Padre António Vieira foi um homem do seu tempo. A Escravatura era justificada na própria Bíblia, e pela autoridade que tanto peso teve no pensamento da Igreja, expressa na palavra de Santo Agostinho.

Mas, ousando guiar-se pela sua própria análise fria e pessoal dos factos que presenciava – uma insuportável temeridade aos olhos das autoridades de então –, ele defendia que os Africanos que forçadamente tinham atravessado os mares para irem servir nos engenhos do açúcar, deviam ser tratados com caridade!

Digamos que ele não partia do fundamento bíblico para, de dedução em dedução, nortear a vida que o rodeava; muito pelo contrário, ele induzia a partir da sua observação objectiva e lúcida, e depois apoiava-se nas Escrituras segundo a sua leitura muito pessoal, extremamente lógica, baseada na sua apurada observação humana, sensível ao sofrimento alheio, e impiedosa para com a injustiça e a crueldade.

Já a sua vida ia bem avançada, na sua estadia em Roma, durante os seis anos que vão de 1669 até 1674, o Padre António Vieira conseguiu denunciar perante o Papa os abusos de poder da Inquisição, conseguindo a suspensão das actividades dessa instituição durante sete anos, e a suspensão das penas a que a mesma o tinha condenado.

Enfim, uma vida de grande actividade, sempre em permanente luta pela Justiça Social!

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Referências:

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* Para a elaboração desta nota biográfica, apoiei-me na obra:

“Padre António Vieira, O Tempo e os seus Hemisférios”, com coordenação de Maria do Rosário Monteiro e Maria do Rosário Pimentel; publicada pelas Edições Colibri, em 2011.

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* Querendo alguns leitores colher mais alguma informação na Internet, aconselhamos este programa de RTP ensina :

https://ensina.rtp.pt/artigo/padre-antonio-vieira-defensor-dos-indios-e-dos-escravos-negros/

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Myriam Jubilot de Carvalho

20 de Junho de 2020

Myriam Jubilot de Carvalho
Enviado por Myriam Jubilot de Carvalho em 21/06/2020
Reeditado em 21/06/2020
Código do texto: T6983528
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