Vidas - Filosofando

VIDAS - Filosofando

Às vezes dou comigo a pensar em quão frágil é a vida, mas tambem nas consequências de que por vezes a mania de que somos os “bons”, nos levarem a julgar ser não só donos supremos da razão, como em certa medida da vida dos outros.

Ao pensar na vida dos outros, não estou necessariamente a pensar só na dos animais da nossa espécie, os humanos, mas dum modo muito mais amplo na generalidade dos seres vivos, quer os pertencentes ao reino animal, como até ao vegetal.

Se a minha cadeia de vida, árvore genealógica, tivesse sido quebrada suponhamos há 1.000 anos, quantos eventos teriam sido diferentes atravez dos séculos, nem eu estaria aqui a teclar neste momento.

Não vou falar nos meus antepassados, mas pensando agora mais profundamente nisso, até alguns factos relevantes da História de Portugal teriam tido resultado bem diverso, e esta estaria nalguns deles escrita de modo diferente.

Mesmo que tivesse sido interrompida há 100 anos, algumas diferenças substanciais haveria, e muitas mais do que se possa imaginar.

Mas mesmo depois de eu estar já por este Mundo, muito seria diferente se eu, ou algum de vós meus amigos, tivessem ficado pelo caminho.

Costuma-se dizer, “que por morrer uma andorinha não acaba a Primavera”, mas será efectivamente uma verdade a 100 % esta afirmação ?

Se pensar de modo profundo acredito que algumas diferenças havia e sabe-se lá até que ponto elas seriam grandes. Se uma andorinha a que alguem, num momento irreflectido, ou tentando talvez mostrar a si próprio, num momento de auto “superioridade” na ponta dos dedos, lhe apertou as fracas cartilagens do pescoço.

Ao fazê-lo, esse suposto ser Divino pela força demonstrada alimentou o seu égo, mas destruiu vida criada para viver, por seres vivos, com o mesmo carinho e amor com que nós criamos os nossos filhos.

Todos nós inadvertidamente destruimos vida, mas quando o fazemos para demonstrar a nossa “fraca” superioridade, podemos estar a alterar cadeias de vida, de modo nefasto quiça até para a manutenção da vida terrestre.

Ao falar na andorinha, podia ter falado num outro animal qualquer, talvez dum pequeno arbusto destruido com uma verdascada no meio dum prado.

Essa andorinha podia ter-se vindo a alimentar dum insecto, que por sua vez ao deixar de existir, teria quebrado a cadeia da evolução de um outro, que por qualquer razão evolutiva, ou natural, poderia vir a ser portador duma doença que, ao não ser destruido, ponha em risco a vida do tal senhor, ou de alguem a si ligado, um filho, um Pai, uma esposa.

Mas vamos a outros factos possíveis, ao destruir a vida de um aparentemente insignificante cão ou gato, pode trazer alterações nefastas á evolução da nossa espécie.

Outro dia vi um gato com um rato nas suas presas; quem me diz a mim que se esse pequeno tigre o não tivesse caçado, (se por exemplo ele não tivesse nascido, por alguem ter quebrado a sua cadeia de vida, ou tivesse antes sido morto por alguem inadvertidamente ou tal como a andorinha de modo menos pensado), esse rato, que ele não caçaria, não seria o causador duma epidemia que todos sabemos, esses animais podem espalhar.

Quantos grandes homens não teriam nascido para bem da nossa espécie, se os seus Pais tivessem vivido e não tivessem perecido nas guerras, e quantos outros, que as vieram a causar, não as teriam causado, se os seus antepassados tivessem ficado pelo caminho.

Voltando atraz, quem sabe se aquele paqueno arbusto que uma varascada destruiu á nascença, não viria a ser uma frutuosa árvore, que a alguns serviria de abrigo e sombra, e até a outros, com os seus frutos mitigaria a fome.

Amigos, ao começar a escrever estas linhas, jamais me passaria pela cabeça até onde chegaria... mas acho melhor deixar à imaginação de qualquer de vós, ao lerdes esta pequena prosa, que penseis como pequenos actos irreflectidos ou não, podem vir a alterar a vida de todos os que nos rodeiam.

A Vida dos outros seres sejam eles grandes ou pequenos, doces ou ferozes, vivam numa floresta ou nas nossas casas, quer sejam pequenos arbustos ou frondosas árvores, merecem o nosso respeito e são parte integrante da nossa evolução, pois fazem parte duma cadeia que não devemos quebrar, e ao fazê-lo, podemos correr o risco de sofrer graves e imprevisíveis consequências.

É por isso que eu não concordo com o ditado que diz, “Que por morrer uma andorinha não acaba a Primavera”, pois essa andorinha, por ser vida, merece o mesmo respeito que todos os outros seres vivos, que connosco se cruzam no dia a dia connosco.

Hoje, penso tambem que por “gozo”, mais que por necessidade, tambem já eu tive esses desvarios, e deles apenas posso penitênciar-me, pois não posso voltar atraz e corriji-los.

Vou agora dizer-vos porque comecei a escrever estas linhas, e a razão que me levou a fazê-lo.

Tenho por habito dar umas voltas de bicicleta por esses campos fora.

A meio da tarde parei numa ponte sobre a linha de caminho de ferro, tal como doutras vezes tenho feito, gosto de ver passar os comboios, e viajar dentro deles em pensamento sabe-se lá até onde...

Como disse uma vez mais o fiz hoje, e encostei a “máquina” ao parapeito da ponte até para descansar um pouco tambem.

Olhei para o meu lado, e vi-a... coitada estava a bater levemente as asas, sem forças, tolhida pelo frio.

Era mais uma abelha que não tinha forças para voltar à colmeia.

Desde bem novo habituei-me a respeitar este pequeno insecto, pois na quinta onde passei parte da infância, nas faldas da Serra da Estrela, ali bem junto ao maravilhoso Zêzere, tinhamos colmeias, e eu adorava tratar delas, para em troca elas me darem o seu doce mel.

Com geito, e tal como tenho feito outras vezes antes, sem a ferir, meti-a no meio das minhas mãos em concha, aquecendo-a com o meu bafo.

Tenho feito isso inumeras vezes e jamais alguma me espetou o seu ferrão, pois sentem que não as estou a querer ferir.

Em poucos minutos, começou a recuperar o seu vigor, pois as suas asas zuniam agora com um ritmo muito maior, vendo eu que ela estava a recuperar.

Abi um pouco as mãos embora continuasse a aquece-la com o meu bafo, até que, resolveu levantar voo e desaparecer...

Espero que tenha encontrado o caminho de casa como eu encontrei o meu.

Foi uma espécie de boa acção de escuteiro, e senti-me bem comigo próprio,... pelo menos a cadeia de vida daquele ser, não foi quebrado naquele momento, e quem sabe se alguem não vai ainda comer um pouco do mel que ela ainda poderá produzir...

Se a minha vida tivesse terminado ontem, por alguem me ter por exemplo apertado o pescoço, certamente essa abelha de mel, jamais voltaria a casa como voltou.

Antonio Freire

01 / 2005