Sobre fala, escrita e letramento

Que a escrita acompanha a evolução do homem por ser a exteriorização do pensar deste, isto não mais é mistério. Juntamente — e principalmente — com a fala, a escrita oferece a identidade de um povo.

Muitos questionamentos antigos ainda perduram, fazendo-nos perguntar qual teria maior valência ou significância: a fala ou a escrita.

Minha definição de escrita é a seguinte: escrita é a representação gráfica dos sons emitidos pelo aparelho fonador humano, e também serve como registro de atos. Entendo por fala o conjunto de códigos que um falante tem e utiliza para comunicar-se em sua língua. Então, como equiparar ambos? Como fazer um valer em detrimento ao outro?

O fato é que nossa sociedade vê-se presa a isso; como sempre foi, agora também não deixaria de especular. Ainda hoje, muitos acreditam apenas na validade do texto escrito, somente pelo seu caráter de segurança ao mostrar-se ali, crível e verificável, escrito. Já o texto oral é maldito por ser momentâneo, passageiro, sem concreticidade que perdure.

Tal coisa ocorre também com a definição de letramento: muitas pessoas não o vêem como o aprendizado sofrido em sociedade, apenas acham que o vocábulo “letramento” está voltado somente a quem lê, estuda ou compreende a essência da língua. A maioria sequer admite que o letramento é “dado” em níveis, como se pudesse existir um não-letramento. Obviamente, sabemos que isso não existe, pois seria o mesmo equívoco em dizer que há pessoas sem cultura, vivendo simplesmente alheias no mundo — não, isso não acontece.

Achei muito interessante as formulações de Marcuschi (2001) acerca de oralidade e letramento. Ele classificou estes dois como práticas sociais, sendo que a fala e a escrita seriam os resultados de como tais práticas estavam sendo usadas. Ou seja, estabeleceu uma relação de atividades-meio e atividades-fins concernentes à língua, claro.

Apóio também Tfouni (1995), quando a mesma enfatizou que o letramento não precisa ter uma relação diretamente proporcional com alfabetização ou escolarização formal. Afinal, tudo isso depende da competência, da capacidade de cada indivíduo perante sua língua.

Pelo menos, a meu ver, uma pessoa não tem a necessidade de chegar ao último patamar da escolarização formal para conseguir viver num mundo de letras e textos. Quem disse que uma pessoa com baixo grau de letramento não consegue desenvolver unidades lógicas está muito errado. Isso é só mais um dos muitos mitos que enfraquecem o que nossa língua nos propõe.

Se um status elevado fosse garantido pela recepção de saber e conhecimento, os mestres e os docentes em geral estariam no topo da pirâmide de estratificação da sociedade.

Referência bibliográfica

MARCUSCHI, L. A.. Da fala para a escrita: atividades de retextualização. 2ª edição. São Paulo: Cortez, 2001;

TFOUNI, L. V.. Letramento e alfabetização. São Paulo: Cortez, 1995.