MAARTEEN VAN SLUYS - PARENTE DE VÍTIMA DO VOO DA AIR FRANCE

Irmão de vítima do voo da Air France fala sobre a tragédia, e como a fé pode superar momentos de adversidade

Quem a encontrasse pelo sobrenome na lista de passageiros do voo AF 447 da Air France de 31 de maio, não teria dúvidas em afirmar que se tratava de uma passageira estrangeira. Mas não; a jornalista Adriana Francisca van Sluys – evangélica que estava a bordo do avião na noite do fatídico acidente – é brasileira de registro e coração, e trabalhava na área de comunicação corporativa internacional da Petrobrás, trabalho que exigia sua presença num evento de apenas dois dias na Coréia do Sul, de onde retornaria em seguida para o Brasil.

Apesar de ter nascido na cidade de Zeist, Holanda, por ocasião de uma viagem de seus pais, a presbiteriana tinha dupla nacionalidade e, segundo parentes, era a mais brasileira da família. “Apesar da Adriana também ter, como eu e minhas outras irmãs, dupla nacionalidade (brasileira e holandesa), ressalto que ela era a mais brasileira de todos nós, tanto que recebeu diversas propostas para atuar no exterior ao longo da carreira e nunca aceitou”, enfatiza o irmão Maarten.

Assim como outras 228 pessoas, entre passageiros e tripulantes, Adriana, que confessava ter medo de avião, não chegou ao seu destino, mas terá seu nome sempre lembrado, não somente pela comunidade evangélica, mas por todos que acompanharam por dias a fio a incessante busca por informações sobre um dos mais trágicos acidentes da aviação comercial dos últimos tempos.

Solteira por opção, ela se formou em jornalismo pela UFRJ e, apesar de sempre residir no Rio de Janeiro, era membro da 1ª Igreja Presbiteriana em Belo Horizonte desde a adolescência. Excelente emprego e motivadoras perspectivas profissionais para o futuro, a jornalista estava colhendo os frutos do que havia semeado com grande dedicação, até sua vida ser interrompida, aos 40 anos, sobre ás águas do oceano Atlântico. Num dos últimos contatos com familiares antes do embarque, a mãe, Vazli Esther, de 70 anos, que não conseguiu comparecer ao Aeroporto Internacional Tom Jobim para se despedir da filha, teria dito: “Viaje nas asas de Deus”. Pela fé professada pela família e inúmeros de seus amigos, é exatamente com ele que Adriana se encontra nesse momento. Manifestações de pesar e apoio à família, além de homenagens à presbiteriana não faltaram após a tragédia. “Adri, o mundo ficará mais triste sem você”, postou o amigo de infância Eduardo Pereira no site de relacionamentos Orkut. No Rio, mais de 200 pessoas compareceram a um culto realizado no Colégio Bennet, no bairro do Flamengo, onde ela iniciou seus estudos.

Cerca de dois meses após o acidente, quando aos poucos a vida começa a voltar ao normal e o tempo vai transformando a dor em saudade, os parentes das vítimas e a própria sociedade ainda aguardam por explicações técnicas que possam, eventualmente, trazer à tona as verdadeiras causas sobre a queda do avião – até agora baseadas em meras suposições.

Conversei com o gerente de hotelaria Maarten van Sluys, 47 anos, um dos muitos acometidos com a dor da perda de um ente querido. Natural de Belo Horizonte (MG), casado e pais de três filhos, o presbiteriano fala sobre a vida cristã da irmã, as perspectivas que envolvem as investigações e elucidação do fato, e como uma tragédia dessa natureza pode transformar a vida de uma família.

JDM – Como você define a vida cristã de sua irmã?

MAARTEN VAN SLUYS – Apesar de não ser uma pregadora voraz, minha irmã era uma pessoa que sempre vivia no exemplo bíblico. Ela compreendeu as mensagens de Jesus quanto às práticas virtuosas, amor ao próximo, caráter ilibado; e atribuía valor às coisas mais simples e belas da vida. Ela era também uma grande admiradora do canto sacro; por isso mesmo, cantava assiduamente nos corais da empresa e participava ativamente das cantatas nas igrejas.

Após a tragédia, foram muitas as manifestações e homenagens por parte dos amigos, como um culto realizado num colégio do Rio onde ela iniciou seus estudos. Qual é a importância de tudo isso?

As homenagens e manifestações de carinho superaram tudo aquilo que eu sempre imaginei que fosse possível. Sempre soube da alegria e da amizade que minha irmã emanava a seus próximos, mas nunca poderia supor essa dimensão. Estive presente no Colégio Bennet e falei em nome de minha família. Foi um evento com a cara dela: leve, alegre, com músicas interpretadas, fotos em slides e inúmeras homenagens de pessoas que fizeram parte de todas as etapas de sua vida. Foi uma ocasião muito marcante, um momento lindo e significativo que teve ao longo de todo tempo seu real valor medido em lembranças felizes.

O que mais lhe chamou a atenção nessas homenagens?

Não somente a minha, mas acredito que o que mais chamou a atenção de todos foi a semelhança dos depoimentos de inúmeros dos presentes. Ou seja, minha irmã sempre foi a mesma pessoa ao longo de sua vida, onde quer que ela estivesse.

Como você e sua família têm acompanhado a mobilização da sociedade, sobretudo da comunidade evangélica, em relação à tragédia?

São inúmeros os emails e mensagens que tenho recebido de vários âmbitos da sociedade civil e também da comunidade evangélica. Para nós, que somos cristãos genuínos, a morte terrena faz parte do plano divino da salvação, num contexto bem diferente do que é vivenciado no mundo em geral. Essa visão contribui para pacificar nossos corações e mentes, sempre na certeza que Deus está no comando regendo todas as coisas, pois nada acontece sem seu beneplácito. De uma maneira geral, tem sido muito grande a mobilização de nossos amigos e irmãos na fé quanto ao carinho e solidariedade à nossa família.

Depois de todo esse tempo desde a tragédia, vocês estão satisfeitos com os rumos da investigação?

Esperamos ainda que as investigações possam esclarecer os motivos que provocaram esse acidente terrível que tanta dor e comoção trouxe às famílias das vítimas. Meu legado será o de buscar as respostas e tornar a aviação algo mais seguro para nossos filhos e netos. Entendo a complexidade das investigações e a cautela necessária para não chegarmos a diagnósticos precipitados, porém exigimos mais transparência e agilidade nos trabalhos. Por se tratar de um assunto multinacional, vamos continuar acompanhando os desdobramentos aqui e na França, onde foram direcionadas as investigações.

E quanto a eventuais indenizações por parte da Air France, qual tem sido a postura da família?

As forças econômicas não podem prevalecer sobre vidas humanas. O mais importante agora é que, com o apoio dos órgãos técnicos e em especial da mídia, termos a certeza que esse acidente não deixará de nos trazer muitas reflexões e atitudes.

Na sua opinião, no que a religião e, sobretudo a fé, pode contribuir num momento tão difícil que muitas famílias atravessam?

A espiritualidade cristã e base de conhecimento da Palavra tem sido nosso elo com Deus para que possamos ter entendimento dessa tragédia, no plano humano. Cremos e sabemos que o plano divino é perfeito, incontestável, e o Senhor sabe a hora e a missão de cada um de nós; portanto, não nos cabe ficarmos inconformados ou revoltados. Avaliamos a situação como uma perda humana muito grande e carregaremos a saudade em nossos corações, mas ostentando a certeza de que o ocorrido é parte de um plano maior e maravilhoso. A fé tem sido o alicerce e a força motriz para seguirmos em frente, e para mim, especificamente, para levar adiante o lindo legado deixado por minha querida irmã.

Fonte: Revista Eclésia - Edição 136

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JDM

José Donizetti Morbidelli
Enviado por José Donizetti Morbidelli em 03/08/2009
Reeditado em 30/10/2009
Código do texto: T1734713
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