ELIZETE MALAFAIA - CRISTÃS NO DIVÃ

Sem viver à sombra de um dos principais líderes evangélicos do país, a psicóloga Elizete Malafaia defende o bom relacionamento familiar como premissa básica para uma vida saudável e aponta soluções para os problemas que afligem muitas mulheres cristãs

Formada em Teologia pelo Instituto Bíblico Pentecostal (IBP), no Rio de Janeiro, Elizete Malafaia sabe dosar como ninguém seu conhecimento teológico com as aptidões médicas – ela também é psicóloga e terapeuta familiar. Quem garante são as leitoras de seus livros de auto-ajuda e as mulheres que acompanham – in loco ou em vídeo – as palestras motivacionais por ela ministradas. Parece pouco? Não para a carioca de 53 anos, que ainda carrega no sobrenome o peso da responsabilidade de ser casada com um dos mais conhecidos e controversos líderes protestantes do país, o pastor Silas Malafaia. Apesar de participar ativamente das atividades ministeriais da igreja, engana-se quem pensa que ela vive à sombra da fama do marido – em fevereiro, eles completaram 31 anos de casamento. Muito pelo contrário; seu comprometimento com a Palavra vem desde os tempos de menina e, profissionalmente falando, ela caminha pelas próprias pernas. “Minha maior responsabilidade não ser casada com o pastor Silas, mas como uma filha de Deus”, argumenta.

Mãe de três filhos – duas mulheres e um homem – e avó de duas meninas e mais um netinho a caminho, Elizete afirma levar uma vida de pessoa simples, que cuida dos afazeres domésticos como toda mulher, que gosta de estar reunida em família e que pratica exercícios físicos. Filha do pastor José Santos, que por quase meio século presidiu a Assembleia de Deus na Penha, Rio de Janeiro – hoje, Assembleia de Deus Vitória em Cristo –, e de Maria Leal dos Santos, seu batismo, aos nove anos, aconteceu de maneira bem menos inusitada do que a de seu pai, que antes de ser apresentando ao protestantismo pela futura esposa animava festas católicas e gostava de tomar umas cachacinhas. Segundo a própria psicóloga, aprender e aceitar as pessoas do jeito que elas são foi a mais valiosa herança que ele lhe deixou – o pastor José Santos faleceu no ano passado, aos 83 anos –; legado que a filha pretende cultivar e repassar aos descendentes. “Meu pai sempre nos sinalizava o lado bom das pessoas”, complementa.

Desenvoltura, dinamismo e domínio da oratória não lhe faltam, qualidades que, aliadas às convicções religiosas, fazem dela um exemplo da mulher cristã pós-moderna e referência para uma legião de evangélicas. Toda a sua produção literária e audiovisual traz a mulher como protagonista, ou público-alvo se o propósito fosse corporativo e não bíblico – o que não é o caso. Então, é ensinando e apontando caminhos para os mais diversos conflitos que afligem a natureza feminina, que ela procura se identificar com cada uma de suas aconselhadas, como se passasse pelos mesmos problemas e tivesse na ponta da língua a resposta para solucioná-los. Não é a toa que faz parte do Corpo de Psicólogos e Psiquiatras Cristãos (CPPC), entidade que visa desenvolver estudos sobre as relações coexistentes entre a área psicológica e a teológica. Essa analogia se torna ainda mais clara diante de títulos como Bons Hábitos, Vida Feliz; Vivendo com Ousadia – que ela pretende lançar em breve –; ou Mulheres Vitoriosas, recentemente publicado. Nele, como num consultório, ela foca as atenções no resgate da auto-estima, incentivando as leitoras a superarem a mediocridade e as crises existenciais. Aliás, se ainda há quem julgue, erroneamente, essas “crises” como achaques da meia-idade ou um mero capricho, a doutora os diagnostica como desvios comportamentais dos graves, oferecendo explicações bem mais recorrentes e, porque não dizer, convincentes, sob o ponto de vista médico-cristão. E apesar de todo o avanço da medicina, ainda não inventaram remédio melhor do que palavras de estímulo e incentivo para o caso, principalmente quando reforçadas por exemplos de vitórias e superações com o aval das Escrituras Sagradas.

JDM – Primeiramente, como é o seu dia-a-dia, tanto no ambiente familiar como na vida ministerial?

ELIZETE MALAFIA – Minha vida é simples, e eu cuido dos afazeres da minha casa como toda mulher. Gosto de ficar com meu marido, filhos, genro, nora e netos. Meu relógio biológico é vespertino, pois durmo muito tarde e por isso não acordo tão cedo. Gosto de ler, estudar, escrever e fazer meu devocional à noite. Também procuro fazer exercícios físicos, como correr. No ministério, trabalho na área social com mulheres da minha igreja, visitando lugares onde haja carência nas áreas espiritual, emocional, física e material. Também realizamos palestras, brincadeiras, chás e pregamos a Palavra de Deus.

Há um ano, a senhora perdeu seu pai – o pastor José Santos. Quais as recordações que tem dele, e que influências positivas ele trouxe à sua vida ministerial?

Tenho ótimas recordações do meu pai, e é isso que me conforta quando sinto saudades. Ele não foi perfeito, como nós também não somos, mas tinha um caráter íntegro, sempre fiel a Deus e à minha mãe. Eu o admirava muito como pai, como homem, pastor e amigo. Ele não falava muito e nunca foi um grande comunicador, mas era um excelente administrador de conflitos e se relacionava muito bem. Isso fez com que ele soubesse aproveitar todos os membros que atuavam no seu ministério. Com ele, eu aprendi a aceitar as pessoas do jeito que elas são.

E hoje, como é seu relacionamento com a sua mãe, Maria Leal dos Santos, e com os demais membros da família?

Sempre me relacionei muito bem com a minha mãe, que é minha mentora e eu a amo. Muito do que sou aprendi com ela, que é uma mulher extremamente especial. Não há quem não a ame. Quanto ao resto da família, somos muito unidos e sempre que possível estamos juntos.

Qual é o tamanho da responsabilidade de ser casada com um dos mais conhecidos líderes evangélicos do país, o pastor Silas Malafaia?

Como esposa, minha responsabilidade é amá-lo, respeitá-lo, honrá-lo, estar ao lado dele nos momentos de adversidades, e entender o chamado de Deus em sua vida. Procuro também ser compreensiva, motivando-o sempre; pois, como todos, ele também é um homem sujeito a falhas.

A senhora participa ativamente das atividades ministeriais do marido?

Sim. Estou sempre ao lado dele, seja na igreja, em congressos, em cruzadas, enfim... Meu maior ministério é ser sua intercessora, cuidando para que ele seja um canal de benção para muitas vidas.

O pastor [Silas] ouve suas opiniões, conselhos, ou segue eventuais orientações?

Ele ouve sim, e nos momentos em que vê que as opiniões são certas, necessárias e importantes, aceita e as coloca em prática. Graças a Deus, meu marido é bem consciente de que não é o dono da verdade. Ele sempre foi, e está aberto a novas ideias.

Que sentimento lhe causa o fato dele ser considerado um homem polêmico e controverso por boa parte da sociedade evangélica?

Isso já me causou muita ansiedade e tristeza. Muitos, que não o conhecem, fazem um julgamento precipitado pelo que veem na TV. Mas hoje eu aprendi a lidar com esses julgamentos e já não me preocupo tanto, nem me entristeço. Meu marido é um homem corajoso, ousado, sincero e vive exatamente o que fala e prega. Meu segredo é não ler, ver ou ouvir o que falam dele e da minha família, e me preocupar somente com o juízo que Deus faz a nosso respeito.

Além de teóloga, a senhora é também escritora, palestrante e terapeuta familiar. Com tantas atribuições, sobra tempo para se dedicar à própria família?

Minha família sempre foi e será prioridade, pois antes de desempenhar qualquer um desses papéis, eu sou esposa, mãe e avó. Por me dedicar a eles e à igreja, hoje eu não atendo mais no consultório. Eu e meu marido temos um compromisso, de não ficarmos separados mais de três dias um do outro. Enfim, eu amo tudo o que faço.

No que sua participação como membro do Corpo de Psicólogos e Psiquiatras Cristãos (CPPC) agrega ao seu trabalho e à vida espiritual?

Tenho colegas que fazem parte do CPPC, e aconselho a todos os psicólogos e psicólogas que também façam, pois é um órgão que procura trazer esclarecimentos e congraçamento aos que exercem o papel de orientadores. Além disso, eles realizam congressos abençoados, têm uma revista excelente e com ótimas reportagens. Por, infelizmente, não poder estar junto com eles nos eventos, meu papel na entidade é mais o de divulgadora.

Em suas palestras voltadas paras as mulheres, a senhora costuma enfatizar a importância do relacionamento num contexto familiar. Quais as ferramentas, ou diretrizes, usadas para ter êxito em seus propósitos?

A primeira e principal ferramenta é a Palavra de Deus; que é o nosso maior e melhor manual de comportamento. Uso também livros de autores abalizados que escrevem sobre família. E sempre que estou falando, procuro me empenhar para melhorar também naquilo que estou ensinando.

A senhora concorda que o meio evangélico está um pouco carente de líderes femininas de grande destaque, principalmente no que tange à liderança nas igrejas ou ministérios? Por quê?

O meio evangélico não precisa de líderes femininas ou masculinas de grande destaque. O que precisamos é de homens e mulheres que desenvolvam seus chamados da melhor maneira possível. Para ser uma grande líder não precisamos de títulos, mas entender que líder é aquele que veio para servir e influenciar as pessoas a serem melhores a cada dia. Infelizmente, o que vejo é que há pessoas que querem primeiro ser grandes para depois servirem, quando deveria ser justamente o contrário. Deus precisa e quer levantar homens e mulheres que façam a diferença para uma pessoa, para que assim ela faça o mesmo a outras. Esse é o segredo da igreja!

Qual é a sua opinião sobre o pastorado feminino?

Reconheço que existem mulheres que são chamadas para exercerem o pastorado, mas também sei que é Deus quem as chama e as capacita. Há pastoras, esposas de pastores, que também têm um ministério; nesse caso é bem melhor, pois é difícil administrar uma igreja sem o marido ao lado. É uma bênção quando o casal compartilha o mesmo chamado, porque a visão e o projeto de ambos estarão voltados para o mesmo objetivo.

A senhora já pensou em se tornar pastora?

Nunca pensei em me consagrar pastora, e nem posso. Afinal, não sou eu quem me consagro, mas o pastor orientado por Deus. Repito que o mais importante não é o título que recebemos, e sim se estamos realmente fazendo aquilo que o Senhor tem colocado em nossos corações para realizarmos. Não seremos julgados de acordo com o título, mas pela maneira como desenvolvemos nosso chamado.

Porque somente de uns tempos para cá é que as igrejas evangélicas – salvo algumas exceções – começaram a aceitar o pastorado feminino? Esse “conservadorismo” ainda é reflexo das palavras do apóstolo Paulo em sua carta aos coríntios (1Co 14.34-45)?

Não penso que o motivo seja por esse texto, mas por nossa cultura que era muito machista. Graças a Deus isso está mudando para melhor. Agora, há de se ter muito cuidado para não virar bagunça, pois ser pastor ou pastora requer muita responsabilidade. A própria Bíblia diz que “a qualquer que muito for dado, muito se lhe pedirá” (Lc 12.48).

Enquanto algumas igrejas defendem uma participação mais ativa das mulheres nas questões ministeriais, outras denominações mais conservadoras parecem levar ao pé da letra as palavras do apóstolo. Para a senhora, esse foi um dos motivos que impediram que o ministério feminino se desenvolvesse ao longo dos anos?

Não. Só existe uma coisa que pode impedir nosso ministério: nós mesmas. Sabemos que as mulheres constituem a maioria dos membros nas igrejas. Então, se a igreja é o que é, é porque existem muitas mulheres anônimas exercendo um grande ministério. É com elas que Deus está contando, pessoas que ajam como servas, que sejam vocacionadas e tenham amor pela obra do Senhor, sem preocupação de serem ou não reconhecidas por meio de títulos. Louvo pela vida de todas as mulheres que têm compreendido a grandeza desse chamado.

Palestrar, usando exemplos e passagens bíblicas para motivas as pessoas, não é uma maneira – digamos, sutil – de também pregar a Palavra?

Sim, e esse é o melhor meio para alcançarmos qualquer grupo social e religioso. A Palavra de Deus traz mensagens para todas as áreas do comportamento humano: família, finanças, sexualidade, relacionamento, saúde etc.

Qual é o posicionamento do ministério ao qual a senhora faz parte em relação à ordenação pastoral feminina?

Tanto o homem como a mulher foram feitos à imagem e semelhança de Deus, com as mesmas capacidades e talentos. Em nossa igreja temos, por exemplo, uma mulher consagrada há mais ou menos um ano – a pastora Antonieta Rosa, que antes dirigiu uma igreja por mais de três décadas.

Diante disso, qual é o verdadeiro papel da mulher cristã na igreja?

Não só quanto à mulher, mas o papel de todos – homens, mulheres, jovens, adolescentes e crianças – é estar aqui para servir e não ser servido. Nosso maior e melhor exemplo é o deixado pelo Senhor e Salvador Jesus Cristo.

Além de seguir os princípios bíblicos, que outras atribuições deve ter a mulher para exercer o papel de uma “verdadeira” cristã, seja como membro ou líder de um ministério?

Ela deve ser idônea, equilibrada, disciplinada espiritualmente, emocionalmente, fisicamente e materialmente. Deve ter caráter íntegro, ou seja, ser aquilo que é quando ninguém a está vendo. E mais: ser amorosa, bondosa, humilde, paciente; uma mulher de fé, unção, graça, autoridade, prudência e sabedoria.

O que a senhora pode dizer sobre sua carreira como escritora? Qual é o foco principal desse trabalho?

Desde a minha adolescência já li livros de diversos assuntos e autores, tanto evangélicos quanto seculares. Passei a escrever para o público feminino depois de observar, durante as consultas, como muitas mulheres, mesmo tendo Deus como Senhor das suas vidas, sentiam uma carência muito grande na área emocional. Por isso, sempre enfatizo que elas são amadas, aceitas, valorizadas, escolhidas e chamadas por Deus para fazer a diferença; e vitoriosas, independente das circunstâncias. Aprendi que viver é lutar, é não se entregar à própria sorte.

Há elementos autobiográficos em Mulheres Vitoriosas, ou seja, o livro reflete um pouco de sua própria trajetória?

Sim. Durante anos eu lutei contra alguns medos e comparações, perguntando se era realmente isso que Deus queria que eu fizesse. Passei por um período turbulento de saúde, incluindo três surtos psicóticos devido à pressão no ministério do meu marido, mas o Senhor me deu a vitória. Contudo, cresci como mulher na área espiritual e nos relacionamentos. Amadureci também na fé e firmei mais ainda o meu caráter. Sou vitoriosa!

Além da causa evangelística, em sua opinião as igrejas e ministérios devem também desempenhar trabalhos de ordem social? Que tipo de trabalho sua igreja realiza?

A igreja está aqui para influenciar em todas as áreas. Além de realizarmos obras sociais em nossa igreja como atendimento a famílias pobres, trabalhos com gestantes, hospitais, comunidades carentes, também auxiliamos outras instituições em seus trabalhos com dependentes químicos, crianças órfãs, presidiários... Desde cedo eu aprendi com meus pais a contribuir, independente de quem seja ou a que religião pertença.

Independente de confissão religiosa, em sua opinião o trabalho solidário da pediatra católica Zilda Arns é um exemplo a ser seguido?

Ela foi uma mulher extraordinária, uma médica pediatra apaixonada pelo ser humano. Desenvolveu um lindo trabalho visando salvar crianças pobres da mortalidade infantil, e nos deixou um legado de amor e doação.

Que mensagem a senhora pode deixar para as cristãs brasileiras, por ocasião das comemorações do Dia Internacional da Mulher?

Ame-se, valorize-se, respeite-se. Tenha prazer e alegria de ser mulher, única e insubstituível no seu papel. Desenvolva os talentos, as habilidades que o Senhor lhe confiou. A mulher é a coroa da criação de Deus, que nasceu para brilhar e fazer a diferença. E, afinal, ele precisa de você aí na sua casa, no seu trabalho, na sua igreja, no seu bairro, na sua cidade, no seu país.

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JDM

José Donizetti Morbidelli
Enviado por José Donizetti Morbidelli em 13/04/2011
Reeditado em 04/10/2022
Código do texto: T2905579
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