Livro de Jhon Harley destaca Chico Xavier em Pedro Leopoldo

Jhon Harley se apropriou de uma linda história do poeta e escritor pedroleopoldense José Issa Filho, que transita entre a realidade e a ficção, em “Coisas do reino de Pedro Leopoldo 3”, para dar nome ao seu livro: “O voo da Garça”. Na obra de José Issa Filho três personagens da cidade narram a história, entre os quais se destaca a habilidade poética de Sá Tomásia, uma antiga benzedeira da região. Segundo ela, na manhã de 2 de abril de 1910, data do nascimento de Chico Xavier, teria acontecido na cidade de Pedro Leopoldo, na região da Fazenda Modelo, um curioso fenômeno com as garças.

Foi a manhã mais linda que ela já viu. Estou me apropriando dessa história para dizer que uma dessas garças pousou na cidade de Pedro Leopoldo, exatamente no dia 2 de abril de 1910, na Rua de São Sebastião, “trazendo amor e compaixão, e por isso mesmo, transformando as noites de muitos angustiados e aflitos em dias ensolarados de esperanças e alegrias”, como bem disse José Issa Filho - explica Harley.

Jhon Harley Madureira Marques, 55, casado com Renata Lúcia de Andrade Pinto Marques há 31 anos, pai de três filhos (Gabriel, Guilherme e Gustavo) é formado em educação física e psicologia. Trabalhador do Grupo Espírita Scheilla há exatamente 37 anos. Atualmente participa das atividades na Casa de Chico Xavier em Pedro Leopoldo, da Fundação Cultural Chico Xavier, do Conselho Regional Espírita de Pedro Leopoldo e da Aliança Municipal Espírita de Pedro Leopoldo e Matozinhos.

Chico foi um ser humano profundamente generoso, vivendo de sua modesta aposentadoria”

Conte um pouco sobre o seu convívio com Chico. Foram 21 anos de relacionamento?

Tive o prazer de conhecer Francisco Cândido Xavier em 1981, na casa de sua irmã Cidália Xavier de Carvalho. Confesso que nesse dia fiquei, sob certa hipnose, olhando fixamente para o tão falado Chico Xavier. Encontro, reencontro, não sei... Mas a partir daí mantivemos um relacionamento de respeito e amizade que só foi interrompido mediante sua desencarnação, no dia 30 de junho de 2002. Em todos esses anos de convivência, pude confirmar o que muitas pessoas já diziam ser ele um ser humano profundamente generoso, de hábitos simples, vivendo de sua modesta aposentadoria. Um típico mineiro que adorava uma boa prosa e ficava profundamente constrangido com elogios.

Foi essa amizade que o levou a enveredar pelo espiritismo?

Nasci na cidade de Pedro Leopoldo e minha formação religiosa, como muitos da minha geração, foi estruturada nos princípios do cristianismo, sob a interpretação do movimento católico. Na adolescência, por alguns anos, cheguei também a participar do movimento umbandista. Desde cedo, me sentia atraído em procurar entender um pouco mais sobre a religiosidade do nosso país, pois sempre considerei uma forma de expressão cultural importante e significativa, mas que, historicamente, somente há bem pouco tempo, vem despertando o interesse de pesquisadores e estudiosos. Por volta dos 17 anos de idade, em diversas ocasiões, tive sonhos curiosos onde Chico Xavier era o protagonista. Ouvindo falar muito em Chico Xavier, comecei alimentar um insistente desejo de conhecê-lo. Passei a sonhar que ele, sorridente, me olhava atentamente. Corria para encontrá-lo, mas quando chegava próximo ele já se encontrava em outro lugar. Esses sonhos persistiram por um bom tempo e deixaram significativas impressões. Evidentemente, que essa amizade interferiu na minha forma de pensar e de agir sobre mim mesmo e sobre o mundo, mas me tornei espírita em 1980 e passei a estudar os princípios codificados por Allan Kardec, além das muitas obras psicografadas por Chico Xavier e outros companheiros de Ideal.

Quem foi Chico, na sua visão?

Em tempos de tanta intransigência e intolerância e dentro de um contexto social individualista espero, sem nenhuma intenção de divinizá-lo, ter conseguido dizer que a humanidade em Chico Xavier ultrapassou os limites dos movimentos religiosos por mim conhecidos, se materializando, no transcorrer dos seus 92 anos de idade, em forma de generosidade, compaixão e amor. Parafraseando o biógrafo uberabense Carlos Baccelli, diria que Chico Xavier não foi um “anjo” exercendo o papel de um homem, mas um homem, do mundo e no mundo, exercendo o papel de um “anjo”.

Poderia contar algum caso curioso envolvendo o Chico e que você presenciou?

Ainda me lembro quando, em uma das minhas visitas ao Chico Xavier, me deparei com uma situação inusitada. Ao seu lado, observei que uma senhora, chorando copiosamente começa a descrever um quadro doloroso. Havia perdido toda a sua família em um acidente automobilístico. Fiquei me perguntando como seria possível consolar uma dor tão intensa? O que ele poderia dizer que pudesse reconfortar aquela mulher? Para minha surpresa e de todos os demais que acompanhavam aquela comovente cena, Chico se levanta e a abraça. Choram os dois. Depois do abraço busquei curioso o olhar daquela mãe e observei que a dor ainda permanecia na face, mas ela esboçou um sorriso que eu nunca consegui compreender até hoje. Diria que Chico Xavier sem dizer nada, disse tudo. Essa cena se passou em meados dos anos 80 e até hoje procuro entender e vivenciar o que vi. Para mim, Chico Xavier foi uma das poucas pessoas que melhor conseguiu exemplificar o ensinamento evangélico “Amai-vos uns aos outros como eu vos amei”.

Por que as pessoas tentam endeusar, criar mitos e santos? Chico foi um homem que viveu a caridade.

Em 2000, Chico Xavier foi eleito pela população do Estado de Minas Gerais, em uma promoção da Telemar e da Rede Globo Minas, o “Mineiro do Século”. Uma de minhas alunas, indignada com o resultado dessa pesquisa me perguntou o que Chico Xavier teria feito para ser considerado o “Mineiro do Século” (foram 704.030 votos), já que ele não teria “inventado” ou feito nada de especial. Confesso que olhei para ela com certa indignação. Ameacei responder, mas a partir desse questionamento, comecei a pensar mais profundamente qual teria sido a sua "grande invenção”. Qual foi o seu grande legado? Talvez a demonstração concreta de ser humanamente possível colaborar na construção de uma sociedade mais justa, mais fraterna e mais feliz. Na perspectiva histórica que a pesquisa se desenvolve compreendo que não é um simples gesto de uma pessoa qualquer que pode magicamente transformar a forma de organização social em que vivemos, mas não posso deixar de afirmar que a coerência entre o falar e o agir, associado ao seu poder de mobilização, pode gerar uma ação coletiva de proporções inimagináveis. Para mim, Francisco Cândido Xavier ou simplesmente Chico Xavier, foi uma dessas pessoas.

E para terminar...

Em 30 de junho de 2002 a garça alçou novos voos, deixando um rastro de exemplificação em generosidade, compaixão e alegria de viver. Mas também deixou muitas saudades, pois já não é possível a conversa ao “pé do ouvido”, se encantar com suas risadas gostosas e passar pelas noites e madrugadas ouvindo os casos recheados de amor e ensinamentos. Como poderei esquecer os bate-papos na casa de Cidália Xavier e Maria Luiza Xavier em Pedro Leopoldo? Os livros, os pacotes de mensagens e os cartões ornamentados com amores-perfeitos enviados pelos Correios? Os almoços deliciosos aos sábados preparados pela incansável e fiel Dinorá? As memoráveis reuniões na Casa da Prece? As atividades sociais no Abacateiro e na Vila do Pássaro Preto, em Uberaba? E o sorriso todo característico de quem estava de bem com a vida “fazendo contrariedades do tamanho de elefantes, que ocupavam a cabeça dos desesperados, ficarem menores que peixinhos de aquários”.

Onde essa garça vai pousar novamente?

Só Deus sabe.

Dhiogo J Caetano
Enviado por Dhiogo J Caetano em 06/08/2017
Código do texto: T6075739
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