O amor de uma palmeira de babaçu e um mandacaru



Dia Internacional do Meio Ambiente e da Ecologia - 05/06/2012



Sem medida, e com o avanço econômico campeando no sopro, as traves do fomento crucial desse desvairado progresso na agropecuária vem incrementando uma nuvem ilusionista de dinheiro aos patamares poupados dos agentes financeiros. Eles correm em disparada e sem freios, os pequenos e grandes latifundiários na competição maluca de vender as terras aos aventureiros do sul ao preço de banana. Aliando como perspectivas, a invalidade do solo para o cultivo da agricultura familiar e mercantil que não obtiveram certificação dos órgãos governamentais ao longo de severos anos de inadimplência.

Atribuem como causa, a imensa procura de propriedades sem função social de uso, erguendo um lastro de transformação capitalista que nem sequer interessa ser produtiva ou não para as reformas sociais ao sistema capitalista financeiro bancário. Mas, essa tormenta esbarra no latifúndio quase improdutivo, e ainda, cercado de dívidas tanto na aquisição da propriedade ou pela mudança efetiva como meio produtivo e consumo. Novos investimentos e custos são ornamentações que figuram neste tablado como desvio de finalidade, corrupção e o mau uso na aplicação do dinheiro público têm sido marca neste rol dos grandes investidores do agronegócio como uma viagem à Netuno.

Terras baratas sem uso e com dívidas galopantes, torna-se o mercado imobiliário mais lucrativo para quem obteve insucesso nos projetos agropecuários, perlustrando para quem anda afogado na bola de neve dos juros sobre juros bancários como uma bênção. Naturalmente, surge a lei da procura da aquisição dos imóveis rurais, onde as condições climáticas realçam o marco amazônico nas estações, e determinam consecutivamente sem mudanças geográficas o período do inverno marcante nesta região. Nem mesmo o aquecimento global não jorrou ameaças alimentares no Maranhão, onde um gigantesco tabuleiro verde se propaga em plena destruição desse bioma fascinante. Como se sabe, os estudos sobre o aquecimento global e geográficos da produção alimentar não são capazes de mastigarem às duras penas que o bioma maranhense detém o celeiro para a plantação da soja. Aproveitam-se do clima tropical, terra dos cocais e da caatinga, esta, unicamente brasileira e jamais vista em qualquer parte do mundo.

Contudo, é nesta floresta de mata branca que nasceu a fábula graciosa entre a Palmeira de babaçu e um Mandacuru muito aflito que passemos a descrever.

Naquele dia o sol rompia a escalada faiscante da Princesa do Sertão Maranhense entre o porão das montanhas esverdeadas e o lume imenso do mostruário florestal dos cocais. Abanando as vivacidades com a brisa galante, trazia na sequência o cântico do bem-te-vi no alto das palmáceas, perpetrando o primor doado por Deus. Eram nos galhos finos e rasteiros do mofumbo que pulava o miúdo sibite na ampla melodia sorridente. E se o silêncio falasse, mais uma oportunidade reservaria o canteiro da existência taciturna, transmitida na vivência da bandeira da paz naquele capoeirão, onde a exploração de fazendas de gado, cultura de soja, amargam na fauna e florestas sem qualquer defesa com o lema de novas mudanças e um futuro mais alimentar ao mundo.

Não houve aviso e nem os tambores das tribos dos Guanarés soaram entre as palhoças ilusionarias dos meus fragmentos na manhã invernal daquele dia. Dois tratores de esteiras de grande porte, desceram das carretas. Alongando-se a luz que vinha do escritório improvisado no meio das matas dos cocais, cujos engenheiros mapeavam sete mil hectares de terras para desmatamento através do GPS. Com os maquinários a postos, o sossego se quebrava com o barulho dos motores ligados, o correntão com mais de sessenta metros se arrastava pelo chão levando tudo à frente sem comiseração.

Milhões de palmeiras de babaçu não resistiram à força contrária em seus caules árduos, caindo na brutalidade dos homens a fome brusca da ingratidão. Nem mesmo o Jatobá, a faveira de bolota, o cajueiro, a mangueira, o buritizeiro, a carnaubeira, a oiticica, pau terra, amargoso, violeta, pau dói, e tantas outras árvores, desapareceram na empobrecida e escassa floresta. Desse modo, o barulho da queda das árvores pelos correntões podia ser ouvido a quilômetros de distâncias, além da fuga desesperada das aves e animais da mata amazônica ora traduzida num inferno entre os seres vivos que não participavam daquela orquestrada matança. Dentre eles, destacavam a preguiça, as cobras, o gato maracajá, abelhas, formigas, besouros e tantos outros.

Diante dos avanços dos trabalhos, o único pé de mandacaru de aproximadamente quatro metros de altura, agonizava-se hirto no meio da mata com uma flor e um fruto da cor e tamanho dum tomate. E já pressentindo algo estranho, observou a escapada dos animais e pássaros. Naquela ocasião, passava por ali um mamífero roedor da família Dasyproctíde, que se alimenta dos frutos e sementes das árvores.

Sem demora, retorcido e sem conhecer os fatos, indaga:

-Comadre cutia! Para onde vais com tanta pressa? O que tá acontecendo que toda essa gente está fugindo loucamente?

O pequeno roedor batendo com a cauda fortemente no chão, e com as patas segurando o coco babaçu, respondeu:

-Compadre mandacaru, você não tá sabendo que eles estão destruindo o nosso território?

-Não. Ninguém me avisou de nada.

-Pois é. Os homens estão derrubando tudo, e neste lugar não vai sobrar nada. Nem mesmo uma palmeira pra mim roer os meus cocos.

-Que desgraceira é esta comadre? Só faltava essa notícia pro meu dia ficar mais triste. Eu não tenho ninguém que me ajude ou me defenda. Apesar de que ajudo e mato a sede e alimento muita gente. Com o meu corpo, flores e frutos, eu alimento o gado e o homem com sede. Com as minhas flores sustento alguns passarinhos, abelhas, besouros e formigas e o fruto com as sementes, eu dou ao xexéu, pega, corrupião e tantos outros. Além dos morcegos que me visitam à noite quando se abre a minha flor. É lamentável tudo isso, "agir sem nenhuma provocação, é levar para si o exame de uma ofensa crucial".

Condoída, a cutia afirma:

-É uma pena comadre. Pois, o correntão vai lhe arrastar pela raiz daqui a pouco. Eu nada posso fazer para lhe salvar. Apesar de que " são poucos os que comungam a paz, a maioria caminha em direção ao egoísmo, ódio e ambição".

Melancólico, o pé de mandacaru implorou:

-Isso tudo é real. "Quem faz bem ao próximo sempre encontrará alguém dizendo que nada o fez". Faça-me alguma coisa! Eu não posso me acabar sem a minha geração. O sertanejo necessita de mim e quase tudo por aqui faz parte da minha vida.

A cutia sorrindo, disse:

-Ainda tá nessa compadre. Os homens só querem matar a sede com a água que tens no teu corpo. Eu também sou perseguida todos os dias pelos homens, e todos só querem saborear a minha carne. Não tenho sossego nem de dia e nem de noite.

Com pingos caindo no solo, o mandacaru articulou:

-"Quem tem para dar, não precisa esperar para receber". Se não podes fazer nada por mim, levas pelo menos a minha flor e a minha semente para o alto de uma palmeira de babaçu. Estou falando sério. No entanto, "quando se fala a verdade, ainda é vista com desconfiança".

Surpreso o mamífero, exclamou:

-Compadre, você tá louco! Não tá vendo que vou carregando um coco babaçu pra enterrar como minha provisão noutro território. E saiba que é impossível eu subir numa palmeira pra enfiar a sua flor ou alguma semente lá encima. Sei que é duro ouvir tudo isso. Contudo, o coco que carrego vai nascer num futuro próximo e o meu grupo na procriação não passará fome. Vou indo compadre que o ronco das máquinas vem aí. Até logo...

Partiu o pequeno roedor. E logo, uma pequena lagoa se edificava no tronco verde daquela planta, eram lágrimas prateadas que deslizavam dos espinhos numa combinação melancólica. Oportunidade em que um corrupião brincou no braço entre os espinhos, e indagou:

-E aí mandacaru? O dia não tá pra cachorro. Hoje, eu não encontrei nada para comer e todos os ninhos foram derrubados pelos tratores do diabo. Assim, não dá pra mim viver. Nem sequer um ninho com ovos nas árvores, eu encontrei. Até parece que vai  acabar tudo nessa maldição. você não sabe "que o pior inimigo é aquele que semeia infortúnios onde há paz"?

Disse o pássaro cantando de cabeça para baixo e esticando o pescoço.

Ainda lagrimando, o mandacaru investigou:

-Não discordo da sua posição. E então? Não podes fazer nada por mim?

-Não posso. Por que você não pede aos morcegos que visitam à noite toda comendo os teus frutos, semente e flores?

-Nada posso pedir agora. Os meus amigos morcegos só chegam à noite quando a minha bela flor se abre e se fecha ao amanhecer. Por isso, eu te suplico. Tenhas compaixão de mim. Não observas que eu sou enraizada neste solo e não posso andar e nem voar. Levas em teu bico a minha flor ou a minha semente e me deixe na mais alta copa da palmeira de babaçu.

-É um pedido caro e impossível. Eu não posso realizar esta viagem com a tua flor no meu bico. Na verdade, eu sou perseguida pelos caçadores e a minha sucessão está no fim, meu amigo. Dê-me de beber que farei o teu pedido. Afinal de contas, estou sempre aqui brincando pra alegrar o teu coração. Você está chorando?

Dos braços erguidos aos céus, o mandacaru derramava pelos espinhos os prantos da amargura prateado. E disse:

-Meu amigo corrupião! Acolhe-me em teu suntuoso bico. Não deixes que a minha única geração do sertão maranhense se acabe destroçada nas correntes daquelas máquinas. Leva a minha única flor e semente ao cume da palmeira e atravessas o riacho dos Cocos. Não te preocupas que a comadre palmeira saberá qual destino fará com a minha semente. Pois saiba que o "êxito é a chama que surge numa única oportunidade do tempo".

O corrupião cantando e pulando, disse:

-As tuas palavras dobram o meu coração nesta oração fraseada. E tudo isso me comove. E se o amor existe, provarei em todo o universo que realizarei o teu pedido. Eu nunca imaginei que eras tão frágil assim. Com tantos espinhos espalhados por teu corpo, não haveria um ser vivo de carne e osso que te abraçasse. Sempre achei tão forte perante as secas, dando água a quem tem sede, alimentando os pássaros da noite com as mais belas flores na escuridão.

-Amigo! Estes são os últimos momentos da minha existência. Aproveite e mate a sua longa sede de amor por mim que derrama sem preconceitos. Não tenhais orgulho da beleza que carregas em teu corpo. Sejas como a brisa que ventila os bons e os maus homens da terra sem medir esforços. Peço-te uma única coisa. Não destrua os ninhos dos passarinhos a procura de ovos. E faças desta lição o mais belo caderno de aprendizagem na vida entre tudo que é mais augusto. Que tu sejas o caminho do canto carinhoso com toda a riqueza que vem da alma. Somente assim, reinarás com brilho.

-Obrigado mandacaru! Sempre aprendo um pouco nesta vida, mesmo errante que eu sou. Eu te peço perdão. Não vou mais destruir os ninhos dos passarinhos. Mesmo estando com fome, eu vou procurar outros meios para sobreviver sem os ovos deles. Eu sei que ali, está mais uma vida que irá nascer. Por isso, eu te peço humildemente perdão.

-Não te perdoo corrupião. "O perdão é uma chave misteriosa da alma". Cumpras as afirmações que os teus pecados serão perdoados por Deus, o nosso criador e dono de todas as coisas. Agora, mergulhe o bico no meu fruto e retire uma semente, após isso, puxe a única flor e me faça feliz.

Prontamente, disse o pássaro:

-É pesado tudo isso e me dói por dentro, amigo.

-Faça-o. As máquinas já estão próximas de mim com o correntão. Faço-o rapidamente, e me deixe no alto da palmeira na margem do riacho dos Cocos. Esta será a prova da minha geração que se estenderá do chão aos céus. Estando as minhas pétalas na copa da palmeira, tudo se concretizará no consumo desse momento. E saibas amigo, que um dia surgirá um singelo escritor para dizer nas suas letras o meu martírio e amor. Talvez, neste abençoado dia, ele me verá agarrada no alto da copa de uma palmeira entre a dinastia dos cocais. E será a maior prova de amor que eu tenho para viver.

-Sim. Eu compreendo. Como alguém irá às matas e lhe encontrar trepado feito uma samambaia? É inacreditável. Diga-me como será esse grande feito?

-É verdade. Um dia alguém escreverá para as crianças e os jovens sobre esse ingrato acontecimento. Pois, a vida não é escrita só de boas coisas. Há tristezas que necessitam de amparo e compreensão quando sentimos fraquezas.

Derramando prantos, o Corrupião disse:

-Não se vá meu amigo mandacaru! Não encontrarei mais por estas bandas a paz e o carinho que recebo de ti quando canto em teus galhos entre espinhos.

-Ó corrupião! Apressa-te! Não vês que as máquinas já estão próximas?

-Sim. Mais que maldição, amigo. Ficarei triste por tudo isso que fazem contigo.

Naquele momento, a corrente grossa de ferro arrancava com atrocidades tudo, e o pássaro numa acrobacia subiu aos céus, e desceu na cabine do tratorista num voo mágico e arrasador, batendo com o bico na lente dos óculos escuros do profissional do trator. Assustado com o pássaro em seu rosto, o mesmo desliga a máquina e observa as acrobacias do belo corrupião em volta do mandacaru lançado em pedaços ao solo. Revoando na área traçada pelas correntes, num único impulso, o pássaro sentou num pedaço do galho esmagado, passou a asa direita nos olhos e cantou a mais deprimida melodia ao homem que não resistiu em lágrimas. Batendo as asas, abaixou-se, erguendo o pescoço e tremendo as penas, riscou um pequeno voo em volta dos pedaços da planta. Sacudindo os seus vinte e três centímetros, elevou-se na profundidade do céu e desceu em cambalhotas. Ao se aproximar do tratorista que assistia as cenas, o lindo pássaro atravessou o local devastado e pegou com o bico no alto de uma palha de tucum, a maravilhosa flor do mandacaru. Seguindo em direção dos fragmentos da planta, dançou com as pétalas e num voo rasante próximo ao homem, mostrou-lhe a flor que o homem havia exterminado. Em seguida, bateu asas, partindo sem destino ao olhar humano.

O outro tratorista, percebendo algo de errado, inquiriu ao colega os motivos do desligamento da máquina. Sem respostas, o homem que arruinou a existência da planta, abandonou o local de trabalho, levando consigo o lado da existência da flora e fauna através do pequeno pássaro.

Alguns anos depois, surgiu a biografia nova do mandacaru no alto da palmeira de babaçu na localidade Sambaíba, no segundo Distrito da cidade de Caxias, Estado do Maranhão. E no pulso do espelho da lente fotográfica, eu vi com os meus olhos o amor em verduras na mais intensa união de uma palmeira e um pequeno mandacaru. Provando que o seu paraíso está na terra e nos céus, erigindo na floresta dos cocais toda a supremacia das inclinações que o homem pouco detém. E, desta forma, enraizou no caule grosso e duro a força da afeição. Delineando aos vossos olhos que a natureza não tem destino, mas, a fatalidade se busca em qualquer pessoa ou ser vivo que aspira a plantação do verdadeiro amor.

Não destrua a mata dos cocais, é o único bioma do norte amazônico. Todavia, os encargos e empréstimos financeiros das casas creditícias não são florestas vivas, eles se acabam com os insucessos comerciais dos agronegócios. As ambições mercantis de levar vantagem sobre a pobre caatinga do nordeste brasileiro, danificando o convívio do homem nas cidades em todo o Brasil gera uma futura desgraça. Por isso, não reclame que o seu lar esteja repleto de pernilongos e o mosquito da dengue se espalha como castigo.



Vídeo indicado e música de fundo

http://www.youtube.com/watch?v=dHyR4ZzA2R0














ERASMO SHALLKYTTON
Enviado por ERASMO SHALLKYTTON em 05/06/2012
Reeditado em 29/11/2012
Código do texto: T3706919
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