A Coruja e os Olhos

A coruja e o corvo estavam lá, próximos, empoleirados em uma árvore, observando a lua.

- Por que desvia o olhar de mim, coruja?

- Não creio que estejamos nesse nível de intimidade ainda, corvo.

- Intimidade? Olhar os olhos?

- Exatamente.

- Poderia me explicar?

- Claro... Concorda comigo que o que temos de mais precioso é nossa alma? Nela há nossos segredos e desejos mais profundos. Nossos medos e nossas inseguranças. Nela há nossa história. Nosso verdadeiro eu, é nossa alma.

O negro concorda com a cabeça. Ela continua.

- Pois acredito que os olhos são a porta de entrada para nossa alma.

- ...

- Se você olha nos olhos de alguém, têm de estar preparado para o que vai ver e para o que a outra pessoa verá. Você não acha algo muito delicado, conseguir ver tão fundo em alguém?

- Então você consegue enxergar quem eu sou, olhando pelos meus olhos?

- Isso.

- Interessante, consigo ver você, sem olhar pros seus olhos.

- Como?

- Acontece que sua alma transborda, corujinha. Ela sai por cada poro, por sua boca, e inegavelmente pelos seus olhos também.

- Sério? Pois o que vê?

- Mistério.

- Isso não faz sentido. Se consegue me ver tão bem, como pode ver mistério? É incongruente.

- É que é isso que seus olhos mostram. A escuridão deles me diz que você é sempre uma surpresa. O que sai da sua boca é nada menos que pura poesia. O que transborda de seus poros é o aroma de sua própria alma, tão doce quanto você. Você é imprevisível. É o que tudo isso me diz.

Talvez seja só por que ainda não nos conhecemos tão bem. Posso estar enganado. Mas sinto que você ainda vai me surpreender muito. Se chegarmos a nos olhar nos olhos, enxergar lá no fundo e conhecer cada detalhe um do outro, sinto que ainda sim, haverá muito o que aprender. Estaremos em constante mudança, seremos sempre uma surpresa, se olharmos para o outro com os olhos do amor.

Esses olhos que levam além de uma alma. Levam à duas almas que se tornaram uma só, sem jamais perder o que as fazem únicas.

- Sinceramente não sei o que falar, corvo.

- Pois tenho uma pergunta.

- Faça.

- O que você vê nos meus olhos?