O PLURAL DA PALAVRA "CAMPUS"

CHEGA DESSE GENERALIZADO, ALEATÓRIO, INACEITÁVEL E INSUPORTÁVEL PLURAL “OS CAMPI”

Este é um artigo de rebeldia e proposta! Rebeldia contra a passiva aceitação de absurdos, de erros “consagrados” pela autoridade de intelectuais e, por isso, julgados imutáveis, “imexíveis” pelos pares. É o caso desse abominável plural “campi”. E proposta de aportuguesamento puro e simples desse vocábulo.

Em primeiro lugar, a palavra campus, embora latina, veio para nós pelo inglês, que não tinha em seu idioma, como não há em português, uma palavra que designasse o conjunto de prédios e espaço físico de uma universidade. Portanto, ingleses e americanos incorporaram essa palavra latina e exportaram para nós, quando da criação de nossas universidades, a primeira delas a USP, em 1934. Mas é palavra latina; mantém, portanto, sua forma e sua gramática.

Em segundo lugar, pela aceitação de que não se ensina mais latim no ensino fundamental e médio, e, portanto, por ser a maioria absoluta da população brasileira completamente ignorante nessa língua.

Aliás, o VOLP - Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa – em sua 5.ª edição, já com as regras ortográficas do recente Acordo implantado em janeiro de 2009, contrariando edições anteriores, registra essa palavra apenas no singular, sem indicação de seu plural, e somente entre as palavras estrangeiras, isto é, não é léxico português, insistindo em negar a ela o básico quando importamos palavras, conforme já ensinava há 70 anos Silveira Bueno (Português pelo Rádio, SP: Saraiva & Cia, 1938, p.49, in José Maria da Costa, Manual de Redação Profissional, 2002, SP: Ed. Millenium, p. 225/6): ou fazemos o aportuguesamento puro e simples do vocábulo importado e o adotamos nas flexões de nossa língua, ou o mantemos com todas as características da sua língua de origem, obedecendo às regras dessa língua.

Por outro lado, o Dicionário Escolar da Língua Portuguesa, 2008, da Academia Brasileira de Letras, órgão responsável pela elaboração do VOLP, dicionário também já enquadrado no Acordo e até se antecipando à implantação dele, registra campus e indica seu plural: campi.

Lembremos também e rapidamente que o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, relação oficial em relação à composição e ao conjunto de palavras de nossa língua, trazia algumas barbaridades há muitos e muitos anos. Citemos palavras como FEIÚRA e BAIÚCA, acentuadas, mas que não se enquadravam em nenhuma das regras de acentuação gráfica e que agora, com a Reforma, corrigiram. Mesmo nesta 5.ª edição, encontramos, por exemplo, BEM-ME-QUER, assim com hifens, e MALMEQUER, sem qualquer separação, desobedecendo explicitamente a uma regra do novo Acordo, a qual determina que palavras que indicam espécies botânicas sejam grafadas com hífen.

Voltemos ao nosso propósito. Para os esquecidos, relembremos: o latim era uma língua sintética. O que significa ser uma língua sintética? Significa que suas funções sintáticas eram dadas pelas declinações, pelas terminações das palavras. E, também aproveitando o lembrete do pesquisador da língua portuguesa José Maria da Costa, no longo verbete sobre a palavra campus no seu denso e extremamente útil Manual de Redação Profissional, p. 224/226, Ed. Millennium, Campinas, 2002, exatamente pelo fato de o Latim ser uma língua sintética, campus, como outros substantivos similares, apresenta diferentes plurais naquela língua, de acordo com as funções sintáticas que exerce.

Assim, existe sim, no latim, um plural CAMPI, que se empregava única e exclusivamente quando a palavra era sintaticamente o sujeito da oração. Vejamos um exemplo usando a palavra CAMPI como plural latino, como sujeito da oração, e, para entendimento de todos, inserida numa frase portuguesa:

“Nossos CAMPI serão rigorosamente supervisionados.”

Mantendo-se a palavra CAMPUS latinizada, só no caso acima se justifica o plural CAMPI, isto é, quando essa palavra funciona como sujeito da oração. Vamos usá-la agora como objeto direto e seguir a declinação latina:

“Eles supervisionarão rigorosamente nossos CAMPOS.”

Sim, em latim, quando a palavra CAMPUS exerce a função de objeto direto no plural, ela se transforma em CAMPOS. Repito: CAMPI é só quando é sujeito. Vamos a mais um exemplo, agora a palavra latina CAMPUS exercendo a função sintática de objeto indireto no plural:

“Eles se referiram aos nossos arborizados CAMPIS.”

Ou seja, o substantivo CAMPUS, em sua declinação latina, transforma-se em CAMPIS quando, no plural, exerce a função de objeto indireto. Repito novamente: CAMPI é só quando é sujeito da oração.

Só para deixar mais enfatizada ainda nossa proposta de aportuguesamento desse vocábulo, vejamos um exemplo em que a palavra CAMPUS exerce a função sintática de adjunto adnominal e sua declinação no plural nessa função:

“Os prédios dos nossos três CAMPORUM são do século passado.”

Pois é, o substantivo latino CAMPUS, quando exerce a função sintática de adjunto adnominal no plural, apresenta essa declinação: CAMPORUM. Insisto na repetição: CAMPI é só quando é sujeito da oração.

Diante do exposto, já se percebe que o plural CAMPI existe sim, mas apenas quando a palavra CAMPUS exerce uma única função sintática: a de SUJEITO. Não se pode generalizar e usá-lo aleatoriamente quando exerce outras funções sintáticas, como se vem fazendo, negando a esse vocábulo (já que não se ousa incorporá-lo ao português) as características de sua própria língua: o LATIM. Se insistirmos em mantê-lo como vocábulo latino, somos obrigados a decliná-lo em Latim. Mas isso seria um absurdo, visto que pouquíssimas pessoas dominam essa língua atualmente.

Então, por que não aportuguesá-lo, como se fez recentemente com a palavra álibi, agora assim, com acento? E para isso não é preciso nenhum esforço descomunal. Basta colocar o acento circunflexo, como fizemos com tantas palavras latinas de final semelhante: ÔNIBUS, BÔNUS, ÔNUS, VÍRUS, HÚMUS, todas latinas até 50, 60 anos atrás e devidamente incorporadas ao português. E qual o plural dessas palavras? O plural delas está nos determinantes e não nelas: dois ônibus, nossos bônus, os ônus, etc. Aportuguesar é nossa proposta. Aliás, de fato, nem é proposta nossa! Estamos apenas seguindo orientações de mestres indiscutíveis da nossa língua e latinistas consagrados:

“Aceita a palavra – difundida já está – basta acrescentar-lhe um enfeite ortográfico obrigatório, o circunflexo sobre a primeira vogal – câmpus – e empregá-lo com igual terminação para o plural [...] exatamente como acontece com ônibus, ônus, cúmulus, nímbus: Sem câmpus não pode haver educação universitária.” (Napoleão Mendes de Almeida, Dicionário de Questões Vernáculas, Ed. “Caminho Suave” Ltda., São Paulo, 1981, p. 47)

“Evita-nos a forma vernaculizada o estranho plural “memoranda”, normal e corrente em inglês, língua que adota em casos semelhantes o plural latino, ou, quando o caso, o grego, oferecendo-nos esses plurais, inaceitáveis em nosso idioma: O Brasil negociará com o Japão um empréstimo para a construção de campi universitários” (idem, ibidem, p. 236)

“câmpus. [Do lat. campus, campo, terreno plano.] O conjunto de terrenos e prédios de uma universidade: Junto ao câmpus universitário havia um hospital. Plural: os câmpus (cp. os bônus, os ônibus, os ônus). Prefira-se a forma aportuguesada câmpus, com acento.” (Domingos Paschoal Cegalla, Dicionário de Dificuldades da Língua Portuguesa, Ed. Nova Fronteira, São Paulo, 2002, p. 63)

Como vimos, essas propostas partiram de dois consagrados estudiosos de gramática da língua portuguesa e renomados latinistas: Napoleão Mendes de Almeida e Domingos Paschoal Cegalla.

Com isso, esperamos que o bom senso predomine e incorporemos definitivamente a palavra CÂMPUS ao vocabulário da nossa língua, a língua Portuguesa, evitando-se esse generalizado, desagradável, inadequado, aleatório e inaceitável plural CAMPI.

Prof. Leo Ricino

Mestre em Comunicação e Letras pela Universidade Presbiteriana Mackenzie

Fevereiro/março de 2008 – última adaptação: 12/6/09

Leo Ricino
Enviado por Leo Ricino em 17/12/2010
Reeditado em 19/06/2011
Código do texto: T2676728