Independentemente... ou não.

Vamos ao Português através da lógica, desta feita. Creio ser a abordagem filosófica mais adequada a juntos decidirmos por cortar o que é inútil, como diriam os parnasianos.

Há uma peste em nossa língua. Uma peste dentre muitas pestes, a expressão "ou não". Essa ressalva negativa, quiçá oriunda de alguma entrevista de músico entorpecido, nada acrescenta à língua culta ou mesmo ao conteúdo do que se pretende comunicar, ainda que vulgo ou coloquial.

É a fundamentação anacrônica de uma linha de pensamento tão aberta, mas tão aberta, que o pensamento jamais consegue se fechar, restando inconcluso. Assim, quem brada essa ressalva se abre para o inverso do já dito, não pela democracia em si, mas possivelmente pela expressão do desejo de a ela filiar-se. É puro fetiche libertário. Ou não? Sim... Ah, sim.

E mais, os que fazem uso da tal ressalva viciosa não se contentam com uma ou duas extravagâncias desdizentes. Dela fazem verdadeiro cacoete, permeando o discurso com vários "ou não", tal qual fossem gotas de algum tipo de água-benta democratizante que se jogue numa multidão obtusa.

Isto posto, já podemos concluir que não haverá redenção a não ser pela cultura.

Mas há mais.

Daqui passamos à qualificadora desse crime doloso contra o combalido idioma e também à proposta filosófica inicialmente planejada.

Que são eventos dependentes? São os que guardam entre si relação necessária. Alguma dúvida? Contrario sensu, eventos independentes não se relacionam, ou, de outra forma, se qualquer relação guardarem, será casual, não necessária.

Aos silogismos:

*Se chover, não irei ao jogo de futebol.*

Há uma relação de dependência entre a ida ao jogo e a possibilidade de chuva.

*Sou palmeirense fanático: Irei ao jogo independentemente do clima.*

No segundo silogismo, os eventos chuva (ou não-chuva) e ida ao jogo do Palmeiras são totalmente independentes.

Assim, fica claro que a condição de independência entre os eventos os qualifica como absolutamente isolados, do ponto de vista lógico.

Conclusão: Quando usamos o advérbio *independentemente* para reforçar a ideia de que não há qualquer vinculação entre dois objetos ou eventos, torna-se mais do que desnecessário o uso da ressalva "ou não", torna-se, de fato, uma aberração filosófica.

Por fim, ao exemplo do que está errado: "Vou ao jogo independentemente de chover ou não" (sic)

Esse logo acima é um dentre muitos exemplos possíveis das punhaladas de ignorância que nossa rica língua portuguesa vem sofrendo diariamente. Assim falam na TV, no rádio, na internet. Assim citam, assim repetem, assim perpetuam a peste.

Cabe a nós estarmos vacinados, e vacinarmos os que nos cercam, para que criemos zonas de resistência à degradação da língua.

Meu sentimento: Mais do que manter o "ou não" fora da mesma frase em que esteja o "independentemente", proponho o corte do mal pela raiz. Ninguém precisa do "ou não", que se extirpe essa locução do discurso.

Inutilia truncat !

Mas, vá lá, uma vez na vida, outra na morte, não é proibido fazer essa ressalva, dependendo do contexto. Contudo, nesse caso, jamais em conjunto com a condição de independência, que, por si só, já qualifica integralmente o isolamento entre as variáveis.

Cordial abraço a todos os lusófonos do Brasil, Portugal, Moçambique, Angola, Guiné-Bissau, Guiné Equatorial, Timor Leste, Macau, São Tomé e Príncipe e também a todos os que estão espalhados pelo mundo, em terras em que se falam outras línguas, que bem representem e defendam o nosso Português!

Weber

PS - Quanto aos meus possíveis erros, sou humano, erro bastante. E não tenho qualquer problema em que me mostrem como se faz caso eu esteja equivocado. Podem corrigir à vontade.