O PLEONASMO VICIOSO

Prólogo

De forma natural, isto é, normalmente, espera-se que advogados, promotores, juízes e assemelhados falem e escrevam corretamente. Professores, escritores, políticos, conferencistas, estudantes, autodidatas (não sou exceção) e outros também necessitam fazer uso do bom e cabal idioma pátrio.

Todavia, no calor da emoção ou entusiasmo do momento cometem-se deslizes gramaticais e como exemplo cito o PLEONASMO VICIOSO.

POR QUE RESOLVI ESCREVER SOBRE PLEONASMO VICIOSO?

Preliminarmente entendo que este texto é importante porque não há concursos sem questões de prévio conhecimento das figuras de linguagem. Por isso é cogente que os concurseiros e eternos aprendizes (iguais a mim) deem especial atenção ao supracitado assunto.

Essa é a principal razão deste escrito e, ademais, eu me encontrava no TRE-PB Fórum Eleitoral de Campina Grande, PB, cito no bairro do Catolé, exercendo meu mister de advogado, quando fui incitado a escrever o presente texto.

Eu representava meu cliente, por procuração firmada, para agilizar a burocracia (documentação) necessária à renovação de dois passaportes. Fui àquele local para saber o valor das multas que o cliente precisaria pagar para regularizar sua situação junto à Justiça Eleitoral. Sem essa quitação ele não conseguiria renovar os passaportes dele e da esposa já às vésperas dos vencimentos dos documentos tão essenciais.

Sem desejar e tampouco querendo ouvir a conversa entre dois cidadãos muito elegantes... Ouvi e vi! Em seus trajes identifiquei a pirâmide do estilo “advogado, promotor, juiz ou de quem prima pela elegância formal: As indumentárias que usavam continham caimento, qualidade e “design” formando uma harmonia impecável.

Seus ternos, sendo um de cor cinza e o outro bege, combinavam com os indispensáveis acessórios (pastas de couro) para a condução de seus documentos, laptops e outros essenciais ao labor. Seus sapatos lustrosos chamaram a minha atenção tanto quanto o diálogo entre ambos. Provavelmente eram advogados. Um deles dizia para o outro:

– Claro que sim. Você sabe o tanto quanto eu que a ideia da audiência de conciliação é promover um acordo amigável entre as partes.

– Você acha que esse acordo amigável irá nos beneficiar no que diz respeito aos honorários? – Indagou o outro homem não menos elegante.

– Ah! Você não leu o contrato que firmamos com nossos clientes? Eu previ a possibilidade do acordo amigável e fiz constar uma cláusula estipulando o pagamento de trinta por cento do valor acordado entre as partes. Não sou bobo. – (risos).

O CHOQUE GRAMATICAL

Existem vários tipos de choques: Choque elétrico, choque séptico, choque anafilático, choque hipovolêmico, choque cardiogênico, choque neurogênico, choque térmico e outros. Esse "acordo amigável" que eu ouvi foi um choque gramatical sem precedentes.

Estou chamando de “CHOQUE GRAMATICAL” não à totalidade do diálogo entre os supostos advogados, mas sim ao pleonasmo vicioso “acordo amigável” verbalizado, de forma cristalina, três vezes, durante o curto diálogo. Esse pleonasmo soou aos meus ouvidos como um trovão devastador do melhor uso da linguagem formal.

Ora, ora, ora... Não existe acordo inamistoso, isto é, não amistoso; hostil. Portanto, a palavra "amigável" estava sobrando no contexto do diálogo. A frase correta é: "A ideia de conciliação é promover um acordo entre as partes.". Ah! Alguns falantes mais simples gostam de usar a expressão "divórcio com acordo amigável" quando é suficiente falar "divórcio consensual" ou "divórcio amigável".

Esse erro grosseiro é também cometido quando alguém fala ou escreve: “Hemorragia de sangue” – Ora, não há hemorragia de água ou quaisquer outros líquidos senão de sangue. “Saiu para fora” – Claro que ninguém sai para dentro e “desceu para baixo” – Alguém é capaz de descer para cima?

EXPLICANDO MELHOR O PLEONASMO VICIOSO

Também chamado de redundância, o pleonasmo vicioso é utilizado como vício de linguagem. Nesse caso, ele é um erro sintático não intencional que a pessoa comete por desconhecimento das normas gramaticais. Trata-se de um desvio gramatical que passa despercebido (atenção! Não confundir com desapercebido) pelos falantes da língua.

DETALHE OPORTUNO: Despercebido significa algo ou alguém que não chamou atenção, que não foi visto, que não foi sentido nem notado. Também pode significar uma pessoa desatenta e distraída. Já desapercebido significa algo ou alguém que não está preparado, que está desprovido, desprevenido, desacautelado.

Vejamos outros exemplos clássicos de pleonasmo vicioso:

“Você deve comparecer pessoalmente ao médico.” – Ora, não há como comparecer sem ser pessoalmente. Ao retirarmos o “pessoalmente” da frase observamos que a frase ficou “enxuta”, leve e elegante sem alterar o sentido da comunicação. Você deve comparecer ao médico.

ETIMOLOGIA DA PALAVRA PLEONASMO

O termo pleonasmo tem origem no grego. A partir de “polys” (muito) formou-se “pleon”, que por sua vez originou “pleonasein”, que significa “ser mais que o suficiente”. De “pleonasein” nasceu a palavra pleonasmos; no latim “pleonasmus”, em português perdeu o “s” e significa redundância.

Ora, é claro que estou, com este ensinamento, provavelmente, “enxugando gelo”. Escrevo “enxugando gelo” porque nas boas gramáticas da língua portuguesa e na “web” encontramos excelentes textos sobre PLEONASMO e outras não tão conhecidas figuras de linguagem.

ATENÇÃO! A expressão "voltar atrás" ou "voltou atrás" não é pleonasmo! Os verbos subir, descer, entrar e sair são suficientes pra dar o recado. Não é o caso de voltar. ... Para dar o sentido de retroceder (recuar), o verbo precisa da preposição atrás. Exemplo: Pensou fazer vestibular para medicina. Na hora da inscrição, voltou atrás.

CONCLUSÃO

A grande maioria é pleonasmo? Não! A expressão “a grande maioria” não é um pleonasmo, sendo diferente indicarmos se foi a maioria ou a grande maioria (ou esmagadora maioria, expressiva maioria, …), dado que a maioria indica apenas que é o maior número e a grande maioria indica que são quase todos.

O pleonasmo é uma figura de linguagem que se caracteriza, basicamente, pelo emprego de palavras que produzem redundância. Ele pode ser de dois tipos: literário ou vicioso.

Pleonasmo literário – O pleonasmo literário consiste no uso de palavras redundantes com o objetivo de enfatizar o que está sendo dito. É chamado de literário porque é frequentemente empregado por escritores, poetas e compositores como recurso estilístico. Exemplos de pleonasmo literário

“Chovia uma triste chuva de resignação” (Manuel Bandeira).

"Ó mar salgado, quanto do teu sal/ São lágrimas de Portugal!” (Fernando Pessoa).

O pleonasmo vicioso – Também chamado de perissologia acontece quando palavras redundantes são utilizadas sem nenhuma função, já que o sentido completo da mensagem já foi expresso por outras palavras que vieram antes. Como o próprio nome indica, o pleonasmo vicioso é um vício de linguagem muito utilizado pelos menos cultos ou mais desleixados.

PLEONASMOS VICIOSOS QUE CONVÉM EVITAR

Acordo amigável, infarto do coração, hemorragia de sangue, entrar para dentro; sair para fora; subir para cima; descer para baixo; adiar para depois; surpresa inesperada; outra alternativa; ver com os olhos; protagonista principal; elo de ligação; encarar de frente; há muito tempo atrás; planejar antecipadamente; repetir de novo; consenso geral; fatos reais.

Claro que há muitos outros PLEONASMOS VICIOSOS mormente falados por pessoas mais simples, às vezes, não tão incultas, na linguagem coloquial.

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NOTAS REFERENCIADAS

– Textos livres para consulta na “Web”;

– Assertivas do autor que devem ser consideradas circunstanciais e imparciais.