11 - Pron.: Formas NEUTRAS. Português, Latim, IndoEuropeu. Ênfase

Antes de concluirmos esta série de capítulos dedicados ao estudo dos PRONOMES, penso que será conveniente repararmos num pormenor importante:

Vimos nos capítulos 22 e 23, que os Pronomes DEMONSTRATIVOS e os Pronomes INDEFINIDOS têm a particularidade de terem algumas formas INVARIÁVEIS.

A: Recordemos:

1:

As formas INVARIÁVEIS dos Pronomes DEMONSTRATIVOS

São formas que não mudam nem de género (masculino / feminino)

nem de número (singular / plural):

ISTO - ISSO - AQUILO

Até exemplificámos, através deste diálogo:

Roch e a mulher andam a passear e saem da cidade. Chegam a uma

praia, e metem conversa com um Pescador:

Roch: – ISTO aqui parece calmo, não é?

Pescador: – Com efeito! ISTO aqui é uma área onde vem pouca gente,

muito pouca gente... ISTO ainda é pouco conhecido...

A mulher: – Ainda bem! Quando o turismo descobre um paraíso como

ESTE... é um desastre ambiental!

Roch: – Pena hoje estar um pouco nublado... AQUILO além mal se vê...

mas é o farol, não é?

Pescador: – Sim, senhor! ISSO tem sido a nossa sorte, a nossa, dos

pescadores, e também dos desportistas, claro! Já é muito antigo, mas

foi restaurado, e os mecanismos são recentes!

2:

Do mesmo modo,

indicámos quais as formas INVARIÁVEIS dos PRONOMES INDEFINIDOS

ALGUÉM - NINGUÉM - OUTREM

ALGO - TUDO - NADA - CADA

Damos agora um exemplo:

Ao entrar na sala de aula, a Professora vê, desenhado no quadro, um

belo ramo de coloridas flores. Pergunta:

– O que é ISTO?

Como NINGUÉM responde, a Professora insiste, com o seu sorriso

simpático:

– ALGUÉM quererá dizer o que ISTO significa?

A aluna mais novinha da classe, levanta-SE, e diz na sua voz infantil:

– Professora, é uma oferta da Turma, é para SI!

A Professora fica muito surpreendida...Comovida, fica sem palavras...

Então, o menino mais novo da turma explica:

– Professora, soubemos que hoje são os seus anos!... Então, ESSA é a

nossa prenda de anos!

Os Alunos vêm que a Professora fica muito emocionada. Levantam-SE

sossegadamente, e ficam ao lado das suas cadeiras. A voz mais afinada

da turma começa a cantar:

“Parabéns a VOCÊ”... e seguidamente, toda a turma A acompanha.

Por fim, a Professora diz:

– Meus Queridos, VOCÊS não imaginam como é bom para MIM,

trabalhar aqui CONVOSCO! Sou muito feliz aqui, nas aulas com a vossa

turma! VOCÊS são amorosos! É por haver alunos tão atenciosos e

simpáticos que EU adoro a minha profissão! NINGUÉM imagina! Muito

obrigada por VOCÊS entenderem ISSO!

Como vemos, há neste pequeno texto, uma boa variedade de PRONOMES.

Vamos identificá-los:

ISTO: pron. DEMONSTRATIVO INVARIÁVEL

NINGUÉM: pron. INDEFNIDO INVARIÁVEL

ALGUÉM: pron. INDEFINIDO INVARIÁVEL

-SE: pron. Pessoal Reflexo

SI: pron. Pessoal

ESSA: pron. DEMMONSTRATIVO

-SE: pron. Pessoal Reflexo

VOCÊ: pron. Pessoal (forma coloquial)

A: pron. Pessoal de complemento

VOCÊS: Pron. Pessoal (forma coloquial)

EU.: pron. Pessoal da 1ª pessoa do singular

NINGUÉM: Pron. INDEFINIDO INVARIÁVEL

VOCÊS: pronome pessoal (forma coloquial)

ISSO: pron. DEMONSTRATIVO INVARIÁVEL

B: Perguntaremos, agora, POR QUE RAZÃO é que há formas INVARIÁVEIS em algumas categorias de pronomes...

Em primeiro lugar, todos sabemos que, na Língua Portuguesa, há

palavras que variam em GÉNERO e NÚMERO:

Estão neste caso as “palavras plenas” que...

a)- ...se referem a PESSOAS, ANIMAIS, COISAS... “

b)- ...indicam QUALIDADES das “pessoas”, ou das “coisas”, ou dos

“animais”...

A variação em Género é a que indica quando as palavras são do FEMININO ou do MASCULINO

A variação em NÚMERO é a que indica quando as palavras estão no SINGULAR ou no PLURAL.

Mas ao estudarmos os PRONOMES, vemos que há palavras que NÂO variam nem em GÉNERO, nem em NÚMERO...

...Porque será?

EIS A RAZÃO:

Todos sabemos que a Língua Portuguesa tem as suas bases

históricas numa língua muito antiga: o Latim.

1- O que era o LATIM:

O LATIM era uma Língua falada na Itália, na região do Lácio, em tempos muito remotos. Era a Língua dos Romanos.

Tanto o Latim, como o GREGO Antigo, falado na Grécia Antiga, eram ramos de uma outra língua muito mais remota, o INDO-EUROPEU.

1.1- Ora bem: Essa língua remota, o INDO-EUROPEU expandiu-se pela Europa e pela Ásia Menor, com as MIGRAÇÕES dos povos, na Alta Antiguidade.

1.2- Mutíssimos séculos mais tarde, o LATIM também se expandiu pela Europa, pois os Romanos foram temíveis conquistadores...

Os povos antigos que existiam na Europa e que sofreram a

colonização romana tiveram que aprender a exprimir-se em Latim,

a par das suas próprias Línguas. Isso provocou grandes alterações

no Latim, e ao longo dos séculos, o Latim dos conquistadores foi

ficando muito alterado... Essas alterações traduziram-se numa

mistura que foi gerando as actuais Línguas da Europa.

1.3- Só no século XIX é que o linguista alemão Franz Bopp (1791-1867) compreendeu que havia parecenças entre as gramáticas do Latim, do Grego antigo, do Persa e do Germânico!

A partir do seu estudo, publicou, em 1816, uma obra intitulada:

“Sobre o sistema de conjugação do Sânscrito comparado aos das línguas grega, latina, persa e germânico”.

Prosseguindo os seus estudos, entre 1833-1852 pôde publicar a sua obra monumental:

“Gramática comparada das línguas indo-europeias”

1.4- O Galego e o Português, o Castelhano, o Catalão, o Francês, o Italiano, o Romeno, em relação ao Latim, como resultaram da aprendizagem forçada do Latim, por diferentes povos, foram “línguas crioulas”!

Hoje já ninguém diz isto, mas é um facto!

1.5- Vemos que o INDO-EUROPEU deu origem às Línguas actuais da Europa,

E vemos que as Línguas da Europa se espalharam pelo Mundo como consequência do Colonialismo...

Ou seja, uma grande maioria das Línguas faladas no mundo, deriva do Indo-Europeu!

2- Porque é que este assunto referente a Línguas tão antigas nos interessa?

– Porque essas Línguas, apesar de tão remotas, eram MAIS COMPLEXAS do que as nossas Línguas actuais!

Quem havia de dizer, não é?

Vamos ver como era:

2.1- Em INDO-EUROPEU havia três GÉNEROS:

Masculino

Feminino

Neutro - o género NEUTRO, como percebemos, indicava as

“coisas” sem... “alma”, sem “vida”

2.2- Em INDO-EUROPEU havia três formas de indicar o NÚMERO:

Singular - Indicando 1 só pessoa ou animal ou “coisa”

Plural - Indicando várias pessoas ou animais ou “coisas”

Dual - quando se tratava apenas de 2 pessoas, 2 “coisas” ou

2 animais

2.3- Em INDO-EUROPEU, também a CONJUGAÇÃO VERBAL era mais complexa!

2.4- A própria construção das FRASES, em INDO-EUROPEU, era diferente! Não sei se poderemos dizer que era mais complexa... Penso que isso não será exacto. Muito pelo contrário, talvez pudéssemos dizer que a formulação das FRASES seria mais... inteligente...

...Porque de acordo com as RELAÇÕES das palavras, dentro das frases, assim as palavras mudavam as suas TERMINAÇÕES! Veremos este detalhe na devida altura.

3- De momento, o que nos interessa, é percebermos por que razão temos formas INVARIÁVEIS nas categorias pronominais que estamos a estudar.

Essas formas Invariáveis são reminiscências do antiquíssimo GÉNERO... NEUTRO!

3.1- À medida que essa antiquíssima Língua, o INDO-EUROPEU, se foi expandindo e dando lugar a outras Línguas, a sua GRAMÁTICA foi-se SIMPLIFICANDO!

Nas nossas Línguas actuais, ainda permanecem alguns resquícios da complexidade do Indo-Europeu.

Por exemplo:

Em Inglês:

Permanece o GÉNERO NEUTRO nos Pronomes Pessoais da 3ª Pessoa do Singular: He / She / It

Em Português:

Permanece uma reminiscência do “número” DUAL, quando dizemos: AMBOS os alunos.....

AMBOS significa: Os dois ....

3.2- Quando usamos as formas NEUTRAS dos Pronomes, referimo-nos a COISAS ou PESSOAS de forma indeterminada, de forma vaga:

Vemos ISSO, no diálogo acima:

ISTO: pron. DEMONSTRATIVO INVARIÁVEL

NINGUÉM: pron. INDEFNIDO INVARIÁVEL

ALGUÉM: pron. INDEFINIDO INVARIÁVEL

NINGUÉM: Pron. INDEFINIDO INVARIÁVEL

ISSO: pron. DEMONSTRATIVO INVARIÁVEL

4- A ÊNFASE

Estas formas INVARIÁVEIS também podem ser utilizadas com EFEITOS de ESTILO:

Ou para REALÇAR, ou seja, SUBLINHAR um certo detalhe;

Ou para DENIGRIR, SUBESTIMAR, REBAIXAR um certo detalhe, ou mesmo alguma pessoa, ou personagem:

EFEITO positivo: efeito de REALÇAR, SUBLINHAR

A Professora diz:

- ISTO foi maravilhoso!

EFEITO negativo: efeito de subestimar, de denegrir:

A Joana vê as flores dos vasos muito estragadas, e a terra pelo

chão. Zanga-se com o gatinho. Exclama:

– Quem fez ISTO?

O gatinho encolhe-se todo, muito envergonhado. Ela continua:

– ISTO é coisa que se faça? Seu feio!

Outro exemplo:

O Joãozinho é um menino magrinho. A sua aparência é frágil...

Na escola, o Joãozinho é atacado por um colega fortalhaço, o

Carlão, que quer gozar à custa do colega aparentemente tão

fraquinho.

Carlão (para os colegas do seu grupo) – Vamos pôr AQUILO na

ordem! Venham todos!

– Vamos ter espectáculo – diz todo satisfeito um apoiante do

Carlão.

O Carlão chega-se ao pé do Joãozinho, dá-lhe um encontrão, e diz:

– Vê lá se te aguentas!

Qual não é o seu espanto, quando o Joãozinho lhe responde com

um golpe de Judo! Carlão não esperava por aquela resposta...

Carlão vai ao chão...

Os colegas aplaudem o Joãozinho, embora com alguma

má-vontade:

– Viva o Janito! Viva o “trinca-espinhas”!

O Gaspar vem ter com o Joãozinho, dizendo:

– Muito bem, Johnny, NINGUÉM esperava uma coisa destas de ti!

Onde é que aprendeste? ISTO é que foi! Uma grande lição! Também

quero aprender! Uma pessoa defende-se sem fazer mal a NINGUÉM!

Neste breve diálogo, logo na primeira “fala”, temos o pronome Demonstrativo INVARIÁVEL:

AQUILO -

Está utilizado em sentido negativo, ou seja, em sentido PEJORATIVO. É uma ênfase negativa.

Mas quando o Gaspar diz:

– ISTO é que foi!

O pronome invariável ISTO:

Está utilizado em sentido positivo, em sentido ENFÁTICO.

Myriam,

Junho de 2021

Myriam Jubilot de Carvalho
Enviado por Myriam Jubilot de Carvalho em 06/06/2021
Reeditado em 22/05/2022
Código do texto: T7272605
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