ADEUS A ROBERTO OLIVEIRA

Caros Leitores e Amigos,

Escrevi este texto a 7 de Janeiro, dia de nascimento do Roberto Oliveira. Amanhã, dia 23, completar-se-á um mês desde a sua partida. Partilho com todos vós, esta homenagem, que para todos os seus amigos e admiradores, adquire um significado especial, apenas pedindo que rezem uma oração por ele e sua família. Arlete Piedade

"Hoje é o dia dos teus anos Roberto! Se estivesses ainda connosco, estaria a enviar-te os parabéns por mais um ano de vida! Mas partiste! Regressaste ao local de onde vieste para junto dos anjos e dos teus amigos de todos os tempos, desde o longínquo passado, até ao desconhecido futuro!

Hoje é o dia 7 de Janeiro e estou a escrever com muita dificuldade e emoção, esta despedida, em jeito de homenagem e história de vida, acerca do Roberto Oliveira, também conhecido como Cavaleiro Mago e ainda Cavaleiro do Asfalto, e também Lorde Sauvage e ainda Mundo Poeta, ou World Poet. Poderia continuar a lista, pois o Roberto por onde passou, deixou a sua marca na vida das pessoas e todos lhe davam o nome que melhor o defenia a seus olhos.

Estou a escrever, porque também a minha vida foi diferente a partir do momento dos nossos primeiros contactos e quero deixar uma homenagem pública em jeito de agradecimento e profunda gratidão a esse homem fantástico e amigo incondicional, que faleceu inesperadamente a 23 de Dezembro, deixando uma família inconsolável, a quem se dedicou tão profundamente, que na sua cidade há anos que era dado como morto, pois saía tão poucas vezes á rua, que as pessoas já pensavam que tinha falecido há muito.

Não irei dizer a sua idade, porque esse era um segredo que ele fazia questão de preservar, não por vaidade, mas porque ele era na verdade intemporal! Tinha o seu personagem de Cavaleiro Mago, que vinha do passado, e portanto não tinha idade! Ou melhor seria dizer que tinha parado no tempo, por volta dos 30 e tal anos, pois tal como Jesus Cristo, ele também tinha uma missão a cumprir e uma família a salvar.

Bem mas vou tentar contar um pouco da sua história que tive conhecimento através das nossas longas conversas na Internet, desde 2003, portanto há cerca de 7 anos, pois que jamais tive o prazer de o conhecer pessoalmente.

Roberto era o mais novo de cinco irmãos, nascidos no Rio de Janeiro . A sua mãe era muito jovem , branca e orfã que vivia num convento. O seu pai era mulato, e enamorou-se da menina, que saiu do convento para viver com ele, ainda com a idade de 13 anos. Logo os filhos começaram a nascer, mas o casamento não durou muito. O pai tinha problemas de saúde e refugiou-se na bebida, maltratanto a jovem esposa e os filhos. Separados, a mãe encontrou novo companheiro e foi com ele viver para uma cidade do interior do estado do Rio de Janeiro, onde até á data da sua morte, o Roberto viveu.

Mas naquela época, e naquela sociedade, uma jovem separada, branca, com cinco filhos mestiços, não era bem aceite e a família do novo marido não a queria no seu seio, em especial não queria os seus filhos, principalmente o mais pequeno que dava mais despesa e tinha uma personalidade rebelde.

A solução encontrada, foi internar o menino, num internato. Mas não era um internato vulgar, ou talvez fosse naquela época, pois era numa fazenda do interior, com regras tão rígidas que mais parecia uma prisão. De manhã os internos iam trabalhar para o campo e as estradas, sempre de calções apenas e descalços, fosse inverno, ou verão. Ao almoço comiam uma sopa fétida, no grande refeitório e de tarde estudavam as primeiras letras. A fome e o frio bem como os mau tratos e humilhações, eram uma constante na vida destes meninos. Roberto era muito inteligente e sabia da situação da sua mãe e que tinha que estar ali, para ela poder estar com a sua nova família. Mas mesmo assim, fugiu duas vezes, com companheiros, de noite pelos campos, até á cidade, num percurso de 20 a 30 quilómetros, para ir ao encontro da sua mãezinha. Mas sempre teve que voltar. Da terceira vez, Roberto não fugiu. Estava muito doente com febre e imensas dores, mas levado para a enfermaria ficou encolhido á espera da morte. Até que alguém o encontrou assim e resolveram levá-lo para o hospital. Operado de urgência, tinha uma peritonite já perfurada. Mas salvou-se e foi levado pela irmã mais velha que já era casada com um português, e vivia no Rio de Janeiro, para viver com ela e receber tratamentos.

No Rio de Janeiro, Roberto passou a fazer uma vida de menino de rua, pois a irmã e o cunhado trabalhavam e não tinham como tomar conta dele. Até que resolveu fugir para junto da sua mãe de novo e foi para a rodoviária. Mas a irmã alertou a polícia que o prendeu e levou para um reformatório. Aí já na adolescência, vivendo entre jovens deliquentes já adolescentes, Roberto enfrentou mais algumas lutas pela vida e aprendeu mais lições de sobrevivência. Saiu de lá para servir na Marinha de Guerra, com a idade de 14 anos.

Colocado num quartel da marinha, que era uma fortaleza, apesar da sua pequena estatura e idade, fazia todo o serviço normal, incluindo guardas á porta de armas, empunhando uma metralhadora. Um dia teve uma discussão com um superior e de novo fugiu, tão desesperado e revoltado, que arremessou toda a sua documentação ao mar.

De novo junto da sua mãe, tiveram que lhe arranjar novos documentos e como não havia registos, ficou apenas com um apelido, Oliveira.

Foi enfermeiro num hospital e quando teve idade, ingressou no exército para ser soldado. Mas houve uma tentativa de revolta e o exército foi chamado a intervir. Houve confrontos e o Roberto foi atingido por sete balas em vários orgãos vitais. Mais uma luta de sobrevivência teve lugar e novamente Roberto foi dado como morto pelos seus amigos que sabedores que ele tinha sido atingido e deixando de o ver, pensavam que ele tinha falecido.

Mas não foi ainda desta vez, pois Roberto recuperou, embora com várias cicatrizes no corpo que aproveitava para exibir e impressionar as novas amigas encontradas no virtual.

Bem é que Roberto foi um pioneiro do virtual. Não havia ainda computadores e internet, é claro, mas havia telefones. Então no quartel ou no hospital, Roberto pegava no telefone nos seus tempos livres e discava um número ao acaso. Se atendia uma voz feminina, usando os seus dotes de comunicador logo ia fazendo novas amizades até ao conhecimento pessoal.

Mas havia muito preconceito e Roberto era frequentemente discriminado pela cor da pele em especial e os seus relacionamentos terminavam mal. Até que começou a frequentar a Igreja Espírita e conheceu uma jovem que também era vítima de exclusão, mas devido a problemas de saúde. Esse facto aproximou-os, ficaram amigos e companheiros inseparáveis e acabaram por casar. Aconselhados a não terem filhos, devido aos problemas de saude da esposa, no entanto a natureza foi mais forte e acabaram por ter um único filho, embora com dificuldades em levar a gavidez avante.

Mas agora voltando um pouco atrás, á vida e personalidade do Roberto, que certamente interessm mais, vou falar um pouco das suas várias actividades profissionais. Roberto apenas teve cerca de três anos de escolaridade, no internato mas quando saiu do exército e começou a pensar em formar família, tomou consciência das graves lacunas da sua formação para a vida.

Mas com a sua inteligência invulgar, resolveu formar-se a si próprio, pois a idade e os problemas que se lhe deparavam não lhe permitiam voltar á escola oficial, mas conseguia frequentar algumas aulas particulares. Aí Roberto estudava todos os manuais de todas as disciplinas, até saber tudo e compreender toda a matéria ao ponto de as próprias professoras, lhe pedirem para dar as aulas quando tinham que se ausentar.

Assim Roberto começou a ser tratado por professor e a dar as suas próprias aulas. Como adorava música e tocar com os amigos, foram contratados para formarem uma banda para atuarem em bailes a que se seguiram outras bandas, depois do fim da primeira.

Mas antes de continuar vou falar de outro aspecto muito importante da personalidade do Roberto: - A sua espiritualidade. Quando era pequenino, antes de ir para o internato e a sua mãe começou a viver com a família do novo companheiro, Roberto era hostilizado por todos, excepto a mãe e os irmãos. Então fenómenos estranhos começaram a acontecer na casa da sogra de sua mãe, onde estavam a viver.

Recordam-se do filme Polstergeit? Pedras que voavam de algures e atingiam o telhado da casa, panelas e tachos que se desprendiam com estrondo durante a noite, dos seus locais e caíam para o chão, coisas que voavam pelos ares, enfim esse tipo de fenómenos. Depois de muitas investigações sem resultado, os fenómenos cessaram quando o garoto foi para o internato.

Na sua adolescência e juventude, várias vezes Roberto tinha a sensação de reviver o passado em flashs que lhe assomavam á consciência e recordações de vidas passadas. Então uma das coisas que fez no início da vida adulta foi procurar também entender esse tipo de problemas que o perturbavam e foi assim que começou a frequentar a Igreja Espírita e conheceu a futura esposa. Mas também aí, não conseguiram entender a profundidade dos seus poderes e depois dele fazer assistência espiritual a pessoas com problemas, quando ele próprio era o problema, resolveu desistir e viver como era.

Roberto entendia profundamente, não só todos os animais que recolhia, como aves e insectos que se lhe afeiçoavam e o respeitavam, como outros animais, em especial os seus cavalos. Nessa altura já casado, recolheu um cavalo que queriam abater por ser muito arisco. Mas não tinha onde o recolher e ficou com ele num estaleiro de uma obra em construção. Todos os dias o tratava e fazia amizade com ele falando-lhe e acalmando os seus ímpetos até o cavalo o seguir como se fosse um cão fiel. Mas os empregados da obra divertiam-se a acitar o animal e um dia Roberto teve um enorme desgosto, que o acompanhou até ao fim da vida. Chegou de manhã á obra e o nobre cavalo estava morto empalado numas estacas que havia numa vala, vítima da crueldade e das brincadeiras dos humanos. Os trabalhadores fugiram da cidade, perseguidos por Roberto que lhe jurou vingança pelo resto da vida.

Roberto tinha com frequência lampejos de recordações de vidas passadas em que ele era um cavaleiro ao serviço de um rei cruel que reprimia os seus subditos e fazia guerras injustas onde morriam crianças, mulheres e velhos. Roberto era zeloso ao serviço do Rei e achava-se responsável por essas mortes injustas. Por isso achava que tinha uma divida a pagar nesta vida e que só a pagaria, servindo aos outros.

Também na questão de máquinas, Roberto era profundamente intuitivo. Ele teve a sua primeira moto, comprada numa fazenda, a qual era usada para o serviço do campo, ou seja como aqui os campinos usam o cavalo para ir atrás do gado, lá os vaqueiros usam as motocicletas para juntar o rebanho nos campos.

Então era uma velha moto dessas a primeira que ele comprou. Calcula-se que não estivesse em muito bom estado. Roberto desmontou todas as peças, lavou, esfregou, raspou, secou, poliu, pintou e montou de novo. Com essa primeira moto, participou em competições de “enduro” e fez-se motard. Quando resolveu ter o primeiro computador, fez o mesmo. Ele tinha uma ligação profunda com as coisas e as pessoas e os bichos. Escutava, compreendia, ia á procura do problema e ajudava a resolver.

Um dia ele não tinha trabalho e resolveu ser fotógrafo. Montou uma agencia de modelos, na sua cidade, escolhia as candidatas, maquilhava-as, penteava-as, ensinava-as a desfilar, vestia-asm e fazia as passagens de modelos. Algumas receberam convites para outras cidades e fizeram carreira.

Foi sempre assim, quando queria alguma coisa, Roberto estudava e aprendia tudo acerca da questão que ele queria dominar e depois avançava. Não precisava de universidades nem diplomas, apenas da sua vontade, humanidade e inteligência.

Então em 2003 comecei a entrar na Internet, nas salas de chat, instalei o messenger, abri um perfil e recebi um convite para um grupo do msn vindo de um futuro amigo de Tomar. Aceitei, não sabia nada de nada, mas aceitei. Estava no estádio inicial das minhas actividades na Internet.

Fui a segunda a entrar no grupo a seguir ao fundador, e fui nomeada gerente. Depois de algum tempo, entrou no grupo um amigo brasileiro do fundador que o recebeu com uma mensagem de boas vindas efusiva ao seu grande amigo. Impressionada, dei também as boas vindas. Era o Roberto que chegava á minha vida.

Como ele também tinha um grupo do msn, convidou-me para esse grupo e eu aceitei. Nessa altura eu tinha escrito algumas poesias iniciais, e o Roberto ao ver que eu as tinha no grupo, bem, como outras amigas, convidou-nos a enviá-las para ele publicar no seu site de poemas, o Mundo Poeta.

Enviei alguns poemas de minha autoria, bem como de outros poetas que eu gostava, como Camões e Pessoa, bem como outras amigas o fizeram. Roberto formatava e publicava ilustrado a seu gosto.

Depois enviava-nos os links para vermos. Eu escrevi um poema para ele intitulado “Cavaleiro do Asfalto” inspirada na foto que ele tinha sentado na sua moto. Ele gostou e resolveu escrever o seu primeiro poema em resposta. Nasceu “Cavaleiro do Asfalto” em que ele dizia: - Sim, sou o cavaleiro do asfalto e tenho um mitológico dragão...” e continuava a descrever a sua vida e personalidade.

Outros poemas se seguiram de parte a parte, não só meus como de outras amigas e amigos, que ele resolveu agrupar num quadro chamado “Encontro de Almas” que publicou no seu site de poesia. Quando alguém enviava algum novo poema dirigido a ele, era incluido no quadro.

Era um encontro de almas poéticas e virtuais, amigos distantes, que comunicavam espiritualmente, que eram os companheiros e amigos que lhe mitigavam a sua solidão, pois que ele já só vivia em casa, trabalhando no seu computador, dedicado á família e ao filho único.

O seu site era colocado em hospedeiros gratuitos e a sua net era de ligação telefónica, pelo que era muito lenta e ele apenas a ligava de noite, para não ocupar o telefone de casa. Então passava noites inteiras na internet, buscando hospedeiros melhores, subindo as páginas e fazendo tudo isso, até que eu também abri um grupo do msn e o convidei para ele. Um dia entrou nesse grupo Fernando Oliveira, o Ferool, poeta português radicado em Paris, que também tinha um grande site de poesia, com centenas de poetas.

Começaram a comunicar entre si, apresentados e mediados por mim, e Fernando manifestou a intenção de transferir o site para outro administrador, encargo que Roberto aceitou.

Então teve que colocar a banda larga mas como era perfeccionista ao extremo, quis reformular todo o site, o que envolvia um trabalho exaustivo. Perante muita pressão e solicitações, e sendo o trabalho gratuito e as contas por pagar, sendo só de sua responsabilidade, Roberto teve que optar por trabalhar mais em trabalhos pagos para sustentar a sua famíla.

Mas antes adquiriu um domínio próprio para onde transferiu o seu site de poemas Mundo Poeta, bem como o site de Fernando Oliveira, O Dono da Loja.

Sempre que eu podia ajudava-o online, na publicação e formatação, dando sugestões, escolhendo músicas e imagens que enviava por mail e continuava a escrever poesia dedicada a ele e também sobre outros temas, que ele publicava nos dois sites.

Mas quando teve espaço próprio, resolveu fazer um site só para mim, e os meus poemas. Durante três dias sem parar, ele construiu o meu site e publicou os meus poemas. Tudo era perfeito, conjugado e coordenado, e foi o maior presente e o mais valioso que até hoje me ofereceram. Uma obra de arte, uma obra prima, mas sobretudo uma obra de amor incondicional.

Roberto Oliveira, o Cavaleiro Mago de séculos passados, o amigo querido do presente, que infelizmente já é passado também, partiu de regresso ao local e ao tempo perfeito onde agora vive feliz, eu espero!

Os sites foram suspensos penso que pela sua família, o que lamento, mas compreendo embora o desejo dele seria deixar esse legado a todas as gerações de poetas. Mas o poeta não morre! Jamais morrerá enquanto viver a memória dos que ele marcou e ajudou na sua passagem por esta vida!

Adeus Roberto Oliveira, querido Cavaleiro Mago! Beijos desta Fadinha,

Arlete Piedade